O controle de preços dos combustíveis levou a Argentina para o buraco. |
Ou o Brasil aprende a
respeitar a Lei e seguir as regras do capitalismo ou nosso futuro será
sombrio. Será uma espécie de suicídio gradual. Em matéria de desordem
econômica, a Venezuela é logo ali. Artigo co economista Fábio Giambiagi,
publicado pelo Globo:
Os mais velhos devem
ter percebido que o título do artigo é o do livro de Barbara Tuchman —
recentemente lembrado por Marcos Lisboa — que aponta como uma sucessão
de eventos baseados em certa lógica acabou gerando efeitos opostos aos
pretendidos pelos propulsores desses eventos. É impossível não lembrar
da expressão quando se assiste ao manicômio nacional.
Quando os
historiadores estudarem a atual década com distanciamento, talvez as
manifestações de 2013 apareçam como epicentro da análise. Ali se iniciou
uma etapa que demorará para ser fechada. Naqueles dias, tivemos todo
tipo de passeatas, acompanhadas de ataques a postos de pedágio, bancos
etc. No Rio, bandos fecharam avenidas e, num dos dias, o BarraShopping —
que deixa de abrir apenas três ou quatro dias no ano — fechou, por
falta de condições de funcionamento. A catarse começou pelos protestos
contra o aumento da tarifa de ônibus, que grosso modo acompanhava a
inflação e foi recebida pela mídia com a exaltação da “reivindicação de
direitos justos”, sem reparar no que representava: a quebra de contratos
a granel, colocando por terra a segurança jurídica. Desde então, o
flerte com a anarquia aumentou. Se continuarmos assim, podemos
vislumbrar dois desfechos em perspectiva: continuaremos nossa caminhada
em câmera lenta rumo a um Estado desfuncional; ou o pedido de
restabelecimento da ordem aumentará. Nesse caso, não vamos dourar a
pílula: haverá uma demanda maior por uma intervenção militar. É esse o
futuro ao qual aspiramos?
A impopularidade das
instituições é tal que qualquer um se sente no direito de bloquear uma
estrada fazendo discurso contra os “políticos ladrões” e a carga
tributária e pode ser recebido com júbilo por motoristas com a bandeira
do Brasil. Uma coisa é fazer greve. Outra muito diferente é impedir o
abastecimento do país. Quando a interrupção de estradas ocorre em
centenas de pontos, com festa e congratulação, sejamos francos: um país
que age assim sabe o que não quer, mas não sabe o que quer.
O que o país
presenciou na paralisação dos caminhoneiros e nas críticas à Petrobras
foi o que chamo de “kirchnerismo em seu mais alto grau”. Todos os grupos
políticos, sem exceção, se deixaram levar por um populismo avassalador.
Por que essa denominação? Pelo paralelo com o que aconteceu no Governo
Cristina Kirchner. Diante de reclamações acerca dos custos da energia, o
governo lá determinou a fixação de limites para preços como energia
elétrica, gás e combustíveis — em nome da justiça social. Como a
gasolina barata beneficia tanto o morador de uma villa miseria de
Avellaneda quanto o dono de uma 4x4 morador de Palermo, em pouco tempo o
Orçamento se converteu numa fábrica de gasto público para compensar o
que as empresas deixavam de receber. O crescimento do fenômeno levou a
uma exacerbação da inflação, cujo desfecho foi a intervenção no IBGE
argentino para “desenhar” um índice fake. Isso deixou sequelas tão
profundas na Argentina que o atual governo está tendo grandes
dificuldades para reverter o processo, dado o apego do cidadão médio a
esse status quo que revelou-se insustentável. Que fique claro: o estágio
final do processo que começa com o controle de preços dos derivados de
petróleo é a Argentina de 2015 e sua máquina monstruosa de gasto público
sem sentido. O Orçamento deve servir para financiar a saúde e a
segurança — e não para compensar tarifas subsidiadas.
No episódio recente, o
que mais se ouviu foram falsas soluções. Houve críticas ao Fundo
Partidário, esquecendo que R$ 3 bilhões não são nada frente ao R$ 1,6
trilhão da despesa primária federal. Ou a defesa da privatização da
Petrobras, esquecendo que na Argentina de Cristina as empresas de
energia afetadas pelo controle de preços eram todas privadas. E críticas
aos impostos, sem uma única palavra contra as aposentadorias precoces.
Não nos enganemos: um país onde ninguém pensa no bem comum tem um
encontro marcado com o caos. O Brasil precisa de diálogo e soluções
racionais — e o que temos visto é cacofonia e a defesa do pensamento
mágico na economia. Ou o Brasil aprende a respeitar a Lei e seguir as
regras do capitalismo ou nosso futuro será sombrio. Será uma espécie de
suicídio gradual. Em matéria de desordem econômica, a Venezuela é logo
ali.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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