Merval Pereira comenta, no jornal O Globo,
os obstáculos no caminho do julgamento, pelo TSE, da chapa Dilma-Temer.
Se há evidências contra Dilma, as as delações não implicam que Temer
tenha participado dos esquemas criminosos do PT:
Um caso
citado constantemente pelo ministro Gilmar Mendes, presidente do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pode ser o argumento para separar a
chapa Dilma/Temer e permitir que o presidente continue no governo mesmo
com a condenação da ex-presidente Dilma por abuso do poder econômico.
Mendes
tem repetido que a jurisprudência do TSE é a indivisibilidade da chapa,
mas que existe um caso antecedente que pode servir de base para a
revisão dessa jurisprudência. Eleito em 2006 governador de Roraima,
Ottomar Pinto foi acusado de abuso do poder econômico, mas morreu em
meio ao processo, que continuou contra seu vice, José de Anchieta
Junior.
O
relator do processo, ministro Fernando Gonçalves, em voto proferido em
2009, justificou a continuidade com a jurisprudência do TSE, que
impossibilitava a separação da chapa no julgamento. “Cumpre recordar, de
início, ter o governador eleito, Ottomar de Souza Pinto, falecido no
curso do processo, razão pela qual os efeitos do presente julgamento vão
refletir na manutenção do mandato do então vice e atual governador,
José de Anchieta Júnior”.
A
aplicação do princípio da indivisibilidade da chapa única majoritária
determina que, por ser o registro do governador e vice-governador
realizado em chapa única e indivisível segundo o artigo 91 do Código
Eleitoral, a apuração de eventual censura em relação a um dos candidatos
contamina a ambos, afirmou o ministro Fernando Gonçalves.
Ele, no
entanto, admitiu que “a morte do titular da chapa impõe a interpretação
de referido princípio com temperamentos”. No caso, a advertência tinha
motivação na morte do titular, e é vista pelos advogados de Temer como
uma admissão de que o governador falecido era o principal responsável
pela chapa, e já não poderia se defender.
Da mesma
maneira, o impedimento da ex-presidente Dilma Rousseff traz para esse
julgamento um elemento novo que deverá ser levado em conta pelos juízes.
Além do mais, a jurisprudência do TSE sobre indivisibilidade da chapa
permite que seja levantada uma questão crucial no julgamento de agora: o
presidente Temer foi beneficiário do abuso de poder econômico já
detectado na campanha de 2014?
Como foi
eleito na chapa vencedora, é evidente que Temer se beneficiou. Mas as
investigações e as delações premiadas de executivos de diversas
empreiteiras não levam à conclusão de que Temer participou dos esquemas
montados pelo PT.
A chapa
única e indivisível, como determina o Código Eleitoral, pode ser
interpretada, segundo os advogados do presidente, como a obrigatoriedade
de o eleitor votar nos dois candidatos da mesma chapa, mas não que ela
não possa ser separada no momento da avaliação de contas da campanha.
De
qualquer maneira, tudo indica que o processo que se iniciará
provavelmente na próxima semana terá diversos obstáculos pela frente até
uma decisão final. Se logo de início um dos ministros não pedir vista
para analisar o processo – são mil páginas do relatório que foi entregue
aos ministros há dois dias, além das 7 mil que compõem o todo -, o
julgamento será interrompido até depois da Semana Santa.
O
presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, tem compromissos no exterior e
só voltará no fim de abril. Na primeira semana daquele mês o ministro
Henrique Neves já terá sido substituído, e o novo ministro,
provavelmente Admar Machado terá direito a um pedido de vista para se
inteirar do caso.
No mês
seguinte, será a vez de Luciana Lóssio encerrar seu mandato. Com pedidos
de vista, os ministros que encerram seus mandatos não teriam nem mesmo
tempo para dar seus votos antecipadamente.
Dois
novos ministros estarão no plenário do TSE, e o julgamento poderá
atrasar para que se inteirem do processo. Mesmo que não prevaleça a tese
da divisão da chapa, e o presidente Temer seja atingido pela cassação,
ele poderá recorrer no cargo ao próprio TSE e depois ao Supremo Tribunal
Federal.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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