BLOG ORLANDO TAMBOSI
Não faz sentido exigir que o trabalhador receba o "valor integral" de sua produção, escreve Juan Ramón Rallo no Instituto Mises:
Foi
Karl Marx quem popularizou a ideia de que os capitalistas exploram os
trabalhadores. E os capitalistas fazem isso se "apropriando" de uma
parte do trabalho de seus empregados.
O
argumento é relativamente simples: o capitalista remunera o trabalhador
com $100. Este trabalhador gera mercadorias, e essas mercadorias são
vendidas por $120. Segundo Marx, este lucro só é possível de ocorrer
porque uma parte do trabalho não foi remunerada pelo capitalista -- no
caso, os $20.
Esses $20 seriam exatamente a "mais-valia", que é a mensuração da "exploração laboral".
Ou
seja, o trabalhador prestou um serviço para o capitalista e não obteve a
"devida" remuneração. Sua remuneração foi menor do que o valor total
que ele gerou para o capitalista.
Consequentemente,
o capitalista, que não efetua trabalho físico, reteve para si uma parte
do valor dos produtos que os trabalhadores produziram, e ele consegue
fazer isso graças ao seu monopólio dos meios de produção (a fábrica e as
máquinas que o trabalhador utilizou para produzir o bem).
Logo,
estando estes bens de produção em propriedade do capitalista e não do
trabalhador, o trabalhador tem de se sujeitar às demandas do
capitalista, aceitando entregar ao capitalista uma fatia daquilo que sua
mão-de-obra produz -- caso contrário, morrerá de fome no frio.
Desta
maneira, ao pagar ao trabalhador um salário menor que o valor total por
ele produzido, o capitalista está "roubando" uma parte da mão-de-obra
do trabalhador.
Esta
é a origem da noção marxista de "renda imerecida", que seria a renda
que não decorre de ter de trabalhar e produzir, mas simplesmente de se
ser o proprietário de um negócio privado que emprega trabalhadores, que
são aqueles que realmente fazem todo o trabalho.
O
capitalista, nesta concepção, não faz nada. Apenas vive da exploração
do trabalho dos outros, enquanto fica sentado em seu escritório, com
seus pés sobre a escrivaninha, fumando um charuto.
A
solução de Marx? Confiscar os meios de produção da burguesia e
repassá-los aos trabalhadores para que estes possam reter o produto
integral do seu trabalho sem que haja intermediários capitalistas que se
apropriem de parte do suor dos trabalhadores.
Sem o capitalista, não há mão-de-obra bem remunerada
Começando pelo básico.
De onde vêm os empreendimentos nos quais os trabalhadores são empregados?
Como
a fábrica ou a empresa foi construída? De onde vem o capital -- as
máquinas, ferramentas e equipamentos -- das fábricas e empresas, com o
qual os trabalhadores contratados realizam seu trabalho para produzir os
bens que eventualmente estarão disponíveis para os consumidores
comprarem?
De onde vêm os recursos que garantem o pagamento dos salários dos trabalhadores?
Alguém
necessariamente teve de poupar uma parte dos rendimentos obtidos no
passado para, então, utilizar esses recursos poupados na construção da
empresa e no seu aparelhamento com todos os bens de capital necessários
-- sem os quais o trabalho de qualquer trabalhador seria
consideravelmente muito menos produtivo, com muito menos quantidades
produzidas, e muito mais imperfeito em sua qualidade.
O
empreendedor que inicia um empreendimento tem necessariamente de ou ter
economizado os fundos necessários para cobrir suas próprias despesas de
investimento ou ter tomado emprestado de outros que pouparam o
necessário.
Logo,
sem o capitalista para financiar e sem o empreendedor para empreender, o
trabalhador não teria à sua disposição as máquinas, as ferramentas e
todos os bens de capital que possibilitam seu trabalho, que o tornam
mais produtivo, e que aumentam seu valor.
Mas isso ainda é o de menos.
A incontornável questão da preferência temporal
Eis
a questão mais crucial de todas: os trabalhadores que os empreendedores
e capitalistas empregam não precisam esperar até que os bens sejam
produzidos e realmente vendidos para receberem seus salários.
Os
capitalistas adiantam bens presentes (salários) aos trabalhadores em
troca de receber -- somente quando o processo de produção estiver
finalizado -- bens futuros (retorno do investimento). Existe
necessariamente uma diferença de valor entre os bens presentes dos quais
os capitalistas abrem mão (seu capital investido na forma de salários e
maquinário) e os bens futuros que eles receberão (se é que receberão).
São
muitas as pessoas que não entendem corretamente esse conceito de que os
capitalistas adiantam bens presentes para receber, após muito tempo,
bens futuros. No entanto, basta verificar os balancetes de qualquer
empresa para verificar esse fenômeno. Por exemplo, a General Electric
investiu (adiantou) US$685 bilhões para recuperar, na forma de fluxo de
caixa anual, aproximadamente US$35 bilhões. Ou seja, os capitalistas da
GE abriram mão de US$685 bilhões (e seu equivalente em bens de consumo
que eles poderiam ter adquirido no presente) para receber, anualmente,
uma receita de US$35 bilhões.
Nesse ritmo, serão necessários 20 anos apenas para recuperar todo o capital adiantado.
A
pergunta é: os capitalistas que adiantam $685 bilhões -- que se abstêm
de consumi-los e que incorrem em risco para recuperá-los -- não deveriam
receber nenhuma remuneração por isso? Será que durante os próximos 20
ou 30 anos eles deveriam se contentar apenas em recuperar -- isso se
tudo der certo -- tão-somente os $685 bilhões de que abriram mão, sem
receber nenhuma remuneração pelo seu tempo de espera e pelo risco em que
incorreram?
Quem
pensa assim está, na prática, dizendo que ter $1.000 hoje é o mesmo que
ter $1.000 apenas daqui a 500 anos (e assumindo zero de inflação de
preços).
E
este é exatamente o raciocínio por trás de toda a análise marxista da
exploração capitalista. O que há de errado, portanto, com a teoria da
exploração é que ele não compreende o fenômeno da preferência temporal
como uma categoria universal da ação humana.
A
"mais-valia" não é a apropriação de um tempo de trabalho
não-remunerado, mas sim o juro derivado do tempo de espera e do risco
assumido até que o processo produtivo esteja concluído.
Os
capitalistas, ao adiantarem seu capital e sua poupança para todos os
seus fatores de produção (pagando os salários da mão-de-obra e comprando
maquinário), esperam ser remunerados pelo tempo de espera e pelo risco
que assumem. Por outro lado, os trabalhadores, ao receberem seu salário
no presente, estão trocando a incerteza do futuro pelo conforto da
certeza do presente.
O
fato de o trabalhador não receber o "valor total" da produção futura
nada tem a ver com exploração; simplesmente reflete o fato de que é
impossível o homem trocar bens futuros por bens presentes sem que haja
um desconto. O pagamento salarial representa bens presentes, ao passo
que os serviços de sua mão-de-obra representam apenas bens futuros.
A
relação trabalhista, portanto, é apenas uma relação de troca entre bens
presentes (o capital e a poupança do capitalista) por bens futuros
(bens que serão produzidos pelos trabalhadores e pelo maquinário
utilizado, mas que só estarão disponíveis no futuro).
O
economista austríaco Eugen von Böhm-Bawerk expressou tudo isso de
maneira bem mais resumida: "Parece-me justo que os trabalhadores cobrem o
valor integral dos frutos futuros do seu trabalho; mas não é justo eles
cobrarem a totalidade desse valor futuro 'agora'."
Empreendedores e capitalistas arcam com a incerteza de planejar para o futuro
Os
trabalhadores e todos os demais ligados ao processo de produção recebem
seu pagamento enquanto o trabalho está sendo feito. Já o empreendedor
arca com toda a incerteza sobre se irá ganhar ou não o suficiente com a
venda de seus produtos para cobrir todas as despesas nas quais incorreu.
Ele, aliás, nem sequer sabe se conseguirá vender seu produto.
Ao
pagar aos seus empregados os salários que foram acordados por contrato,
o empreendedor os alivia da incerteza a respeito de se, no final do
processo, haverá lucro, prejuízo, ou se a empresa ficará no zero a zero.
É
o empreendedor quem tem de fazer os julgamentos especulativos e
criativos sobre o que produzir e a que preços seus produtos poderão ser
vendidos. A precisão deste juízo empreendedorial em conseguir antecipar
melhor do que seus concorrentes aquilo que seus consumidores podem
querer comprar no futuro, bem como os preços que poderão pagar por esses
bens, é o que determinará o sucesso ou fracasso de seu empreendimento.
Sem
o empreendedor e o capitalista para organizar, financiar e dirigir o
empreendimento, seus empregados não teriam trabalho e nem receberiam
salários antes que um único produto fosse fabricado e vendido.
Portanto,
o empreendedor não é somente o organizador da empresa e o investidor
que faz tudo acontecer; ele também é quem irá arcar com as consequências
caso não obtenha um lucro pelos seus esforços empresariais.
Conclusão
Por
tudo isso, não faz sentido dizer que o capital explora o trabalhador. A
realidade é oposta: o capital não só aumenta o valor da mão-de-obra do
trabalhador -- ao fornecer as máquinas e ferramentas de que ele
necessita para produzir bens e serviços que os consumidores valorizam e
compram voluntariamente -- como ainda o alivia da incerteza do futuro.
Não
fosse o capital disponibilizado pelos capitalistas e empreendedores
(maquinário, ferramentas, matéria prima, insumos, instalações etc.), a
mão-de-obra não teria como produzir estes bens de demandados pelos
consumidores. Consequentemente, os trabalhadores nem sequer teriam renda
-- ao menos, não tão alta quanto a possibilitada pelos capitalistas.
Postado há 23 hours ago por Orlando Tambosi
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