Pedido de indenização de R$ 10 milhões feito por ONGs à XP Investimentos indica ofensiva cada vez mais crescente contra empresas. Cristyan Costa para a Oeste:
Justiça
do Trabalho notifica Globo por falta de negros em novela e recomenda
mudanças depois de pressão de ONGs.” “Movimentos processam empresa que
preferia ‘hétero e magro’ para vaga de garçom.” “Coletivo LGBT+ vai à
Justiça contra a CBF por explicações para a falta da camisa 24 e
sinaliza pedido de indenização.” Essas manchetes circularam recentemente
pelo noticiário brasileiro. Em alguns casos, chamam atenção os pedidos
de reparação financeira em detrimento de programas corporativos que
possam minimizar o problema que os militantes enxergam nas empresas.
Nesta
semana, foi a vez de um gigante do mercado financeiro se tornar alvo de
ataques. A juíza Julieta Pinheiro Neta, titular da 25ª Vara do Trabalho
de Porto Alegre (RS), acatou uma ação civil pública movida pelas ONGs
Educafro, Frente Nacional Antirracista, Visibilidade Feminina e Centro
Santos Dias de Direitos Humanos contra a XP Investimentos e o Ávila
Associados, escritório credenciado da corretora na capital gaúcha. O
motivo: “falta de diversidade” no quadro de funcionários do grupo
econômico.
Tudo
começou após o Ávila publicar no LinkedIn uma imagem mostrando cerca de
100 de seus colaboradores. A publicação foi prontamente “cancelada” com
críticas de racismo, misoginia, homofobia e preconceito contra idosos e
deficientes, porque a maioria dos funcionários é de homens, brancos e
“héteros” — fora os ataques pelo “não uso de máscaras e aglomeração”. Os
movimentos pediram indenização de R$ 10 milhões por danos social e
moral.
Caso
vença, o advogado das ONGs, Marlon Reis, disse que o montante
milionário será destinado ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos,
vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública e à Secretaria
Nacional do Consumidor. A gestão desse fundo é feita por um conselho
composto de “representantes da sociedade”, responsáveis por selecionar
projetos que serão financiados com os recursos. “Mas existe a
possibilidade de se discutir também na Justiça a destinação para
finalidades específicas”, informou Reis, em nota, sem dar detalhes.
Em segundo plano, as ONGs pediram “medidas energéticas” para o enfrentamento do que classificaram de “preconceito estrutural”.
Os
coletivos de esquerda exigiram, entre outras reivindicações: 1) que a
composição do quadro de contratados, permanentes ou temporários, tenha a
mesma proporção de negros, mulheres e indígenas presentes na sociedade
brasileira; 2) cotas para idosos e pessoas com deficiência; 3) prazo de
90 dias para apresentação de um plano de diversificação do quadro de
colaboradores; 4) as empresas terão de incorporar ao conselho de
administração quatro novos membros, integrantes das “comunidades
sub-representadas”; 5) a disponibilização de cursos gratuitos e estágios
remunerados para promover a formação e a experiência profissional
desses colaboradores.
Por
fim, as ONGs vão além e pedem que o Poder Judiciário estipule medidas
para evitar que a política de contratação das empresas seja “excludente e
discriminatória”, com um “plano de não discriminação” para evitar
ocorrências similares no futuro. Em nota, a XP informou que tem ações de
inclusão de pessoas negras na empresa. Ressaltou ainda que, no passado,
estipulou metas internas para aumentar a contratação, em todos os
cargos, de “pessoas negras, mulheres, LGBTQIA+ e deficientes”. Desde
2020, a corretora lidera um programa de inclusão de gays e mulheres na
empresa.
Argumentação fraca e excesso de reparação
No
processo, as ONGs sustentam que a postagem do Ávila viola tratados
internacionais e vira as costas para um passado escravagista, além de
remeter ao livro Admirável Mundo Novo. Escrito por Aldous Huxley, a obra
antevê a formação de uma sociedade baseada em “clones, todos físico e
psiquicamente idênticos, preparados para seguir um pensamento monolítico
e para reproduzir mecanicamente atribuições definidas por superiores
desconhecidos”.
Adiante,
as ONGs citam a “eugenia” que ocorreu na Alemanha e argumentam que “a
equipe de colaboradores da referida empresa reproduz um padrão nada
natural”.
Vera
Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito público
administrativo pela FGV, afirma que é direito das ONGs apresentarem
motivos para insatisfações de seus representados, mas vê fragilidade nos
elementos expostos. “São argumentos precários”, disse a jurista, ao
mencionar que apenas um processo de investigação maior pode constatar se
a empresa realmente tem políticas deliberadas de preconceito, o que
daria mais força para o processo.
“É
preciso atestar se houve vontade de excluir negros, mulheres, gays ou
deficientes”, explicou. “A Justiça do Trabalho pode enviar pessoas que
tomarão depoimentos de funcionários e diretores da empresa. Dessa forma,
será capaz de dar um diagnóstico mais completo.” A especialista
salientou que, antes de o processo ser movido, as ONGs poderiam ter
procurado a XP e tentado um acordo.
O
advogado Felipe Camargo de Araújo, do escritório Montgomery &
Associados, vai na mesma linha e avalia que a ação carece de substância.
“As ONGs se basearam em apenas uma foto”, disse. “Não sabemos se todos
os profissionais estavam ali para dizer se há discriminação.” Para ele,
as empresas têm o direito de contratar quem quiserem. “Se a companhia
adota uma prática discriminatória evidentemente comprovada, aí é outro
problema. Não podemos dizer quem a empresa deve ou não admitir, salvo as
exceções legais para pessoas com deficiência e mulheres em cargos
políticos.”
O
valor pedido pelas ONGs é questionado por Eli Alves da Silva, advogado
especialista em Direito empresarial. “Considero algo exagerado”,
afirmou. “A rigor, não existe um tabelamento que fixe um dano moral
coletivo. Por que não R$ 10 mil, por exemplo? Ou, quem sabe, R$ 500
milhões? Me parece uma tentativa de dar mais repercussão para o
assunto.”
Citado
na ação, Aldous Huxley afirma em O Admirável Mundo Novo que não basta
que palavras sejam boas, é preciso que o que delas se faz também seja
bom. Qualquer semelhança com o processo movido contra a XP não é mera
coincidência.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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