O governo Temer demonstrou fraqueza ao lidar com o protesto e precisa urgentemente retomar a autoridade que lhe compete, "fazendo
com que a lei seja cumprida por meio dos instrumentos que a
Constituição lhe faculta. Um governo que não se faz respeitar não pode
se queixar do destino". Editorial do Estadão:
O governo do
presidente Michel Temer mostrou-se frágil ao lidar com o protesto dos
caminhoneiros que parou o País. Essa fragilidade ficou particularmente
evidente com a quase total inação das Forças Armadas, malgrado o fato de
que as medidas decretadas por Temer para desobstruir as estradas e
garantir o abastecimento das cidades incluíam a autorização expressa
para que os militares agissem contra os grevistas. Está claro que ao
governo faltou pulso para administrar uma crise dessa dimensão, restando
à sociedade a sensação de que o que está sendo feito é insuficiente e
que os caminhoneiros – e todos os oportunistas que pegaram carona no
movimento – estão a ditar os rumos da crise. O País se aproxima
perigosamente da anomia – quando aqueles que deveriam exercer a
autoridade política e institucional são desmoralizados, prevalecendo a
lei do grito.
Acuado, o governo
cedeu em tudo, entregando aos caminhoneiros até mais do que eles haviam
exigido. O preço do litro do diesel na bomba será reduzido em R$ 0,46 e o
reajuste, depois de 60 dias, será apenas mensal, e não mais diário,
como é hoje. Ou seja, haverá subsídio para baixar o preço e para adiar
os reajustes futuros, a título de dar, mais do que previsibilidade,
certezas quanto ao dispêndio – algo que não é próprio de uma economia de
mercado, mas de um regime de controle estatal, a um custo que recai
sobre o conjunto da sociedade. Neste caso, esse custo será de cerca de
R$ 13 bilhões, valor que terá de ser retirado de previsões orçamentárias
já aprovadas e não deixará de ampliar a dívida pública. Ainda está por
ser calculado o impacto de outros benefícios, como a suspensão do
pedágio para caminhões sem carga.
Além disso, o governo
ofereceu aos caminhoneiros fixar preço mínimo para o frete, o que fere o
princípio constitucional da livre concorrência e não leva em conta a
sazonalidade da produção nem os diferentes tipos de carga. Não bastasse
isso, o aumento de custo derivado do tabelamento do frete certamente
será repassado para os preços, com consequente impacto inflacionário – o
que, mais uma vez, atinge o conjunto da sociedade.
Mesmo diante de
tamanha generosidade, nada garante que os caminhoneiros permitirão que o
País retome seu funcionamento normal. Afinal, já foram três os
compromissos anunciados pelo presidente Temer nos sete dias de
paralisação, sem que os caminhoneiros tenham feito sua parte. E isso
aconteceu porque o governo provavelmente negociou com quem não tinha
nenhuma representatividade – o movimento grevista, como se sabe, não tem
líderes reconhecidos por todos, apenas alguns porta-vozes de certos
grupos. Ao fazer tantas concessões sem nenhuma garantia concreta de que o
movimento seria encerrado, Temer deixou patente a debilidade do governo
– razão pela qual muitos grevistas agora querem mais. E o céu é o
limite, pois nem mesmo os caminhoneiros sabem o que fazer com a imensa
capacidade de chantagem que adquiriram.
Assim, o protesto dos
caminhoneiros deixou de ser uma legítima manifestação contra a alta dos
preços do diesel para se transformar em uma feroz disputa de poder. Na
esteira do sucesso da mobilização, sevandijas de diversos matizes se
articulam para lucrar com a progressiva perda de autoridade do governo.
Enquanto o Planalto designa o tartamudeante ministro-chefe da Secretaria
de Governo, Carlos Marun, para comunicar ao público os resultados de
negociações que dão em nada, opositores da agenda de reformas de Temer
tratam de estimular a impressão de que o governo já não controla mais
coisa alguma. E essa tarefa tem sido fácil.
Esses incendiários
apostam que Temer pode ser transformado no símbolo de tudo o que de ruim
acontece no País e que o colapso de seu governo seria, assim, algo
desejável. Bastariam mais alguns empurrões – como, por exemplo, a
anunciada greve dos petroleiros, marcada para amanhã, para que o governo
rua.
Para evitar que esse
cenário se torne realidade, o governo deve fazer mais do que
simplesmente dar confusas entrevistas coletivas que serão desmentidas
pelos fatos horas depois. É preciso retomar a autoridade que lhe
compete, fazendo com que a lei seja cumprida por meio dos instrumentos
que a Constituição lhe faculta. Um governo que não se faz respeitar não
pode se queixar do destino.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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