Em artigo publicado no Globo, o editor Carlos Andreazza faz algumas cogitações sobre os possíveis candidatos de esquerda às eleições de 2018. Vade retro, populistas:
Presidente
eleito e reeleito, que depois elegeu e reelegeu (junto com Marcelo
Odebrecht) Dilma Rousseff, Lula jamais arriscaria sua reputação
eleitoral — e sua carreira de palestrante — não fosse a Lava-Jato. Não
houvesse tudo o que se revela contra si (e a rápida multiplicação de sua
condição de réu), estaria mesmo disposto a sacrificar o PT, desprovido
de opções que não ele, e deixar que o partido minguasse sem candidato ou
com um Haddad qualquer. Lula sabe que pode perder em 2018, que é até
provável que perca; mas sabe também que sua peleja, a esta altura, é
mais política, de construção de narrativa política, do que eleitoral.
Murado
pelas revelações de Léo Pinheiro — que equivalem a títulos de
propriedade — e apostando em que a ameaçada delação de Palocci não passe
de chantagem para que não o deixem ser o Dirceu da vez, Lula vai à
luta. O reforço da agenda no Nordeste — onde apareceu vestido de Fidel
Castro — é sintomático. Ele sabe que precisa, para sobreviver
politicamente, apresentar-se à disputa; ser uma peça real no tabuleiro
de 2018 — para acusar os adversários de golpe caso subtraído do jogo.
Não é à toa que — chancelado pelo silêncio do TSE — está em campanha.
Contra as especulações diárias de que será preso a qualquer momento,
corre para encerar a cara de vítima, de cuja boca, se pego, desenrolará a
ladainha de que as forças conservadoras não lhe permitiram se defender
nas urnas.
Paralelamente
à construção da narrativa de perseguido pelas elites, faz imensa fé na
lentidão dos processos judiciais. Desarticulada de vez pela delação do
ex-presidente da OAS, sua defesa trabalha exclusivamente por
procrastinar o andamento das ações que o enredam. Se não é improvável
que Lula seja condenado em primeira instância ainda neste ano, apostam
os seus em que conseguirá chegar ao período eleitoral sem condenação em
segunda instância — aquela que o impediria de se candidatar. É minha
aposta também.
Uma vez
formalmente candidato, chefe de um projeto de poder sem precedentes, que
capturou o Estado para os interesses político-econômicos de um partido,
será, portanto, o maior beneficiário do discurso corrente que iguala
crimes e criminosos — e não terá dificuldade em reunir seus tradicionais
25%, talvez até 30%, capazes de o colocarem no segundo turno. Não é
posição de alguém a ser subestimado. Dificilmente, contudo, irá além. É
fortemente rejeitado — indicativo de pouca força para aglutinar.
Se,
porém, voltar à Presidência, será a primeira vez na história deste país
que o mais alto cargo da República foi conquistado como alternativa ao
cárcere.
Ciro
Gomes não é inteligência a ser desprezada. Ao declarar que não
disputaria a Presidência contra Lula, outra coisa não fez do que se
inscrever como a primeira opção esquerdista caso o ex-presidente não
possa ser candidato. Jogada de mestre. Ele sabe que dificilmente teria
apoio do Partido dos Trabalhadores. Mas sabe também que o partido não
tem plano B. É nesse vácuo que investe. Compreendeu que o PT, sem seu
criador e única estrela, é irrelevante.
Ao
avaliar a terra arrasada em que a verdade transformou o partido e, pois,
a decorrente inexistência de nomes petistas competitivos, e ao calcular
que há chances crescentes de o ex-presidente se encontrar impedido de
concorrer em 2018, Ciro ora se cultiva como postulante a preencher um
espaço que desde 1989, muito mais do que do PT, foi de Lula (para que
fizesse o que queria — inclusive Dilma).
Ciro
Gomes faz, portanto, correta aposta no imponderável — a única que lhe é
possível. A ausência de Lula — como candidato ou eleitor influente — em
uma disputa à Presidência representaria, mais do que novidade, o
desconhecido. Como se comportaria o eleitor de esquerda, aquele há
décadas acostumado a afundar (o dedo) no 13? Ciro joga suas fichas em
que seria o depositário pragmático dos votos viúvos do ex-presidente —
ao menos em volume capaz de alçá-lo a um segundo turno.
A seu
favor — e não importa se por retidão ou falta de oportunidade — há o
fato de que não está entre os políticos citados pelos delatores da
Odebrecht. Isso o deverá blindar até contra a obviedade de ser (ao menos
hoje) filiado à linha auxiliar petista conhecida como PDT, de Carlos
Lupi — que está na lista da empreiteira.
Uma vez
escrevi que não havia ex-petista. A afirmação faz efeito, mas não se
sustenta. O que não há — e assim reformo meu diagnóstico — é ex-lulista.
É
precária a linha moral que aparta o homem público independente do
covarde; o prudente do oportunista. O silêncio que sugere a monja é o
mesmo que ilumina o omisso. Falo de Marina Silva. Seu único trunfo,
manjado, decorre da combinação entre a espantosa capacidade de
desaparecer em momentos críticos, como que para se colocar mesmo acima
da atividade política, e o consequente reinvestimento no discurso da
não-política, ora valorizado por tampouco estar entre os citados nas
delações da Odebrecht. Ninguém se lembrará de suas relações com os
governos petistas no Acre, nem se aprofundará em investigar se é
possível ser tão puro quem se associou a Eduardo Campos em 2014 e lhe
herdou o lugar.
Se é
verdade que possui algum capital eleitoral próprio, verdade também é que
disputará uma eleição presidencial pela primeira vez em um partido
inexistente, a Rede, ainda menor que o inexpressivo PV (onde estava em
2010). Ela torce para não ter Lula — de quem foi ministra e a quem
jamais criticou diretamente — como adversário, ou teria anulada, por
falta de combatividade (e demolidora reverência), a sua campanha.
Marina Silva será candidata em 2018 — mas apenas para que verifiquemos o equivalente eleitoral de seu encolhimento político.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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