Reportagem de Martha Beck, edição de quarta-feira de O Globo, revela, com base em dados do Tesouro Nacional, que a dívida pública brasileira em setembro ultrapassou a barreira estratosférica de 3 trilhões de reais, resultado na colocação no mercado de títulos novos no montante de 61,7 bilhões. Na véspera, portanto no dia 25, a Câmara dos Deputados aprovava, em segundo turno, o Projeto de Emenda Constitucional 241, que limita o crescimento das empresas governamentais na escala da inflação do IBGE para o ano anterior.
O que tem a ver a PEC 241 com a emissão de novas NTNs que lastreiam o endividamento interno? Nada. Pois os juros aplicados à rolagem do estoque da dívida não entram na comparação entre despesa e receita. Tanto assim que há décadas o Executivo refere-se invariavelmente ao que chama de superávit primário. Ou seja: confronto entre receita e despesa, excluídos os juros anuais que incidem sobre a dívida existente. Estes juros, hoje são de 14%, correspondendo a 3,4% além do índice inflacionário de 2015, projetado em 10,6 pontos percentuais.
A FARSA DO SUPERÁVIT – Se os juros fossem considerados, não haveria a farsa chamada superávit primário. A denominação exata passaria ser déficit secundário. Flávio José Bortolotto e Wagner Pires conhecem bem o tema e podem opinar sobre o fato. Pelo que se pode deduzir, os juros continuaram fora do cálculo final, com o afastamento dos juros dos limites da PEC 241. As emissões de Notas do Tesouro vão prosseguir no processo de capitalização desses mesmos juros. Ao invés de pagá-los em dinheiro, o Ministério da Fazenda continuaria a recorrer ao Banco Central para emissão de novos papeis. Assim, o custo do endividamento deverá prosseguir rompendo o teto 241.
LÂMPADA MILAGROSA – A emenda constitucional aprovada pela Câmara, que terá o mesmo destino no Senado, sem dúvida, não se reveste da qualidade de lâmpada milagrosa. Pelo contrário, impõe um movimento lógico e conservador na sua essência. Deveria apenas incluir os casos relativos à emissão de NTNs e mais salários do funcionalismo. Nos dois, casos reajustes condicionados aos índices inflacionários do exercício anterior, solução lógica, não mágica, que é exatamente o oposto da razão.
Caso contrário, estará revelada uma desigualdade. Para os bancos não existe teto. Para os funcionários e servidores das estatais, ele vale. Não será correto proceder assim. Tampouco essa forma jamais poderá contribuir para incentivar o mercado de consumo. E tanto a produção industrial e o sistema de comercialização dependem diretamente do poder aquisitivo da população.
QUEDA NO CONSUMO – E nada mais contrário ao poder aquisitivo do que a contínua perda dos salários para a inflação. Pois de todo esse panorama, fica bem claro que, se a inflação for, por exemplo, de 10%, qualquer reajuste abaixo de tal índice representará uma perda, uma redução de vencimentos, uma submersão social. É um afogamento para os que trabalham e para a indústria, a agricultura, o comércio e os serviços. Ao mesmo tempo, um paraíso para os que se alimentam das aplicações e também os especuladores de todos os governos. Os aproveitadores de sempre. Que são tão eternos quanto os diamantes de Ian Fleming, criador do agente 007.
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