Renan Santos, do Movimento Brasil Livre, escreve um artigo para este blog sobre o primeiro aniversário do movimento que está ajudando a mudar o país
Deus, que
dor nas costas! Despertar numa barraca de nylon sobre o declive do
gramado do Congresso Nacional não é, exatamente, a melhor das
experiências ortopédicas. Ainda que a vista guarde algum ineditismo, as
saudades da minha cama e de um teto sem vazamento ganham cada vez mais
peso em meu ânimo diário. São ossos do ofício, diria o amigo resignado.
Mas o fato é que os ossos reclamam cada vez mais do ofício. Normal. Hora
de sair da barraca.
O universo
particular que criamos em frente ao Congresso Nacional é o exemplo mais
recente de um Brasil novo, que vem surgindo a despeito do olhar oblíquo
de setores da imprensa e da classe artística — os contadores de história
por excelência que se negam a contar a grande história do ano. Por
entre as barracas, vejo dezenas de pessoas, em sua maioria jovens, dos
mais diversos estados da federação, que carregam consigo histórias de
vida profundamente diferentes e um sentimento de unidade
surpreendentemente natural.
Não existe
espaço para bairrismos. Os gaúchos pilotam a cozinha com um baiano; a
turma da Paraíba toca violão com o cabeludo do Paraná, e as meninas de
São Paulo planejam os atos da semana com as colegas de Goiânia. Sem
frescura, sem estresse.
Seria
impossível imaginar um ambiente melhor para que nosso grupo, o Movimento
Brasil Livre (MBL), pudesse comemorar seu primeiro ano de existência.
Num momento em que o impeachment de Dilma Rousseff torna-se
politicamente factível; em que o maior partido do país, o PMDB, assume
publicamente uma agenda liberal e desestatizante e em que a sociedade
civil se encontra alerta e engajada, estar ombro a ombro com meus
colegas de movimento nesse cerco moral ao Congresso Nacional possui uma
carga simbólica e emocional das mais intensas.
Estamos numa
etapa muito importante de uma luta que iniciamos no dia 1º de novembro
de 2014. Foi numa tarde de sábado, então ensolarada, que quase 10 mil
brasileiros tomaram a Avenida Paulista para deixar claro a todos que não
aceitariam de braços cruzados o vale-tudo em que haviam se convertido
as eleições presidenciais recém-apuradas. O uso de militância violenta
para amedrontar a imprensa livre, os meandros cada vez mais assustadores
da operação Lava-Jato, o derretimento do real e dos fundamentos
econômicos do país eram sintomas claros de um processo de precarização
das instituições republicanas que nos legaria um futuro, no mínimo,
sombrio. Era hora de reagir.
Manifestação
após manifestação, ajudamos a construir uma cultura de resistência com
iconografia e linguagem particulares. Trouxemos as grandes metrópoles e o
Brasil profundo às ruas do país de maneira pacífica, ordeira e
articulada. Dos pampas ao Rio Negro, todos clamavam pelo fim da
impunidade, pela redução do peso governamental sobre seus ombros e pelo
impeachment de Dilma Rousseff, cujo segundo mandato encerrou-se antes
mesmo de começar.
Quando
nossas reivindicações pareciam perder força diante de discussões
bizantinas sobre base jurídica para o impeachment, iniciamos uma marcha a
pé de São Paulo até Brasília para protocolar o nosso primeiro pedido de
impeachment. Mas isso era detalhe. Queríamos inspirar outros
brasileiros a integrar uma luta que não haveria de ser breve. Chegamos.
Contra socos
e pontapés das brigadas governistas, contra o silêncio de setores da
imprensa, mas embalados pela indignação de milhões de brasileiros,
chegamos até aqui. E aqui não encerraremos nossa jornada. O PT e Dilma
Rousseff são apenas os da hora de uma forma de se fazer política que não
é apenas moralmente condenável. Ela também nos condena à pobreza, à
mentira e à servidão.
Retornaremos
a nossos respectivos lares no momento oportuno para continuar nossa
luta por um Brasil mais livre, justo e próspero para todos. Encerro com
as palavras de Diego Aires, nosso colega de Campina Grande:
“Hélio fervente castiga o campo
A chuva alivia o rosto suado
E o sangue que ferve no homem lutando
Alenta e libera o povo cansado”
A chuva alivia o rosto suado
E o sangue que ferve no homem lutando
Alenta e libera o povo cansado”
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