A
crise começa a mostrar seus efeitos no mercado imobiliário. Os leilões
para retomada de casas e apartamentos financiados triplicaram de janeiro
a setembro deste ano em relação ao mesmo período de 2014. O aumento do
volume de certames, apesar da estabilidade da taxa de inadimplência
abaixo de 2%, confirma a percepção dos operadores do mercado de que os
bancos aceleraram o processo de retomada em 2015, que pode ser iniciado a
partir de 90 dias de atraso.
Segundo cálculos da Associação dos Moradores e Mutuários de Minas
Gerais (AMMMG), com base em editais de pregão publicados em jornais e
sites, a quantidade de imóveis que os bancos colocaram em leilão saltou
de 269, nos primeiros nove meses do ano passado, para 827 em 2015.
Três meses em atraso, por lei, já são suficientes para que a casa ou
apartamento seja alienado pela instituição financeira. A pessoa pode
perder tudo o que pagou e ainda ficar sem a moradia.
“Há uma necessidade maior de captar recursos, principalmente pela
Caixa, que vem sofrendo com a fuga de dinheiro da poupança, fonte para
os empréstimos”, afirma o presidente da AMMMG, Sílvio Saldanha.
Dona de quase 70% da carteira de crédito habitacional do país, a Caixa
Econômica Federal levou a leilão 9.614 imóveis de janeiro a setembro, em
todo o país.
O montante é 65% superior na comparação com igual período do ano
passado, quando 5.823 casas e apartamentos foram ofertados em pregões.
Em contrapartida, o banco reduziu a concessão de financiamento no
primeiro semestre deste ano. Foram 380 mil imóveis, ante 734 mil
financiados entre janeiro e junho de 2014.
Cenário
Outro fator que ajuda a explicar a escalada dos leilões é a expansão do
volume de financiamentos. O crédito farto e mais barato que vigorou nos
últimos anos ajudou os brasileiros a realizar o sonho da casa própria.
Porém, para muita gente a conquista das chaves tem se revelado um
pesadelo. “Muitos consumidores fizeram um empréstimo nos tempos de
bonança econômica, mas agora, com o desemprego ou queda no rendimento, a
parcela já não cabe mais no bolso”, diz.
Desemprego e doença são as principais causas dos atrasos
Não são raras as histórias de pessoas que financiaram a casa, começaram
a pagar as prestações e até mudaram para o novo endereço. Porém, diante
da dificuldade financeira, ficaram inadimplentes, perderam o imóvel e o
dinheiro investido.
“A Lei de Alienação Fiduciária protege o credor, mas é implacável com o
devedor. Foi criada para aumentar a garantia de quem empresta com o
intuito de estimular o crédito. Mas os bancos estão ultrapassando o
limite do razoável”, afirma o presidente da Comissão de Direito
Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas (OAB-MG), Kênio de
Souza Pereira.
“Normalmente, o devedor está emocionalmente abalado, como uma pessoa
doente. O ideal é buscar uma consultoria jurídica assim que receber a
notificação”, completa.
O advogado imobiliário Luís Fernando Teixeira de Andrade diz que dobrou
o atendimento de clientes nessa situação no escritório Karpat Sociedade
de Advogados, onde trabalha. Ele lembra que o banco pode dar início ao
processo de execução extrajudicial após três parcelas não pagas.
“Nessa hipótese, é obrigatória a notificação do devedor, via cartório,
para pagar o débito em 15 dias. Passado esse prazo, o registro de
propriedade do imóvel é transferido para o nome do banco, que, em
seguida – já como novo proprietário – tem que levar o imóvel a dois
leilões públicos. E se não houver interessados, o imóvel fica
definitivamente com o banco, em pagamento das prestações vencidas e
saldo devedor”, esclarece o presidente da Associação Brasileira dos
Mutuários da Habitação (ABMH), Lúcio Delfino.
O vendedor Warlei de Oliveira costuma dizer que foi do céu ao inferno.
Em 2009, ele comprou por R$ 52 mil uma casa em Ibirité. À época,
contratou um financiamento de R$ 40 mil, que deveria ser pago em 240
meses.
No meio do caminho, porém, ele perdeu o emprego de carteira assinada.
Também descobriu que era portador de diabetes e teve que ser submetido a
um longo tratamento médico. No mês passado, a casa onde vive foi
arrematada em leilão.
“Enterrei a cara no trabalho, mas mal consigo dormir. Espero que na Justiça consiga reaver meu bem mais precioso”, contou.
A Caixa informou, em nota, que os leilões de imóveis
retomados, cuja operação foi realizada com Alienação Fiduciária em
garantia, seguem os procedimentos previstos na Lei 9.514/97
Quem arremata imóveis ocupados pode ter que esperar entre
seis meses – em caso de acordo com o morador – a alguns anos para
conseguir tomar posse da casa ou do apartamento adquirido em leilão
Arte HD
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