Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais desta quarta-feira:
Em
Nova York, aonde foi para fazer um desimportante discurso numa ocasião
importante, a abertura da Assembleia Geral da ONU, Bolsonaro foi vaiado.
Faz parte do jogo: sempre há alguém que vaie. Mas seu ministro da Saúde
reagiu com gesto obsceno. Bolsonaro foi mais comedido: chamou os
adversários de “acéfalos” (sem cérebro) e garantiu que ali havia mais
repórteres do que manifestantes. Os que o vaiavam poderiam ter reagido
chamando os bolsonaristas de bucéfalos.
Bucéfalo
é um mito greco-macedônio. Indomável, agressivo, gostava de combates; e
só aceitava ordens de uma pessoa, Alexandre Magno, formador de um dos
maiores impérios da época e rei da Macedônia. Bucéfalo é um mito que
atravessou os séculos: para o grande Alexandre, era o cavalo ideal.
Só
Alexandre (o rei, não o ministro) conseguiu domá-lo. Só Alexandre o
cavalgava, e só na hora dos combates: Bucéfalo era um cavalo de batalha.
Mas seria um pouco demais esperar que houvesse lembranças mitológicas
no calor da hora. Ali valia apenas a vaia, talvez a frase que era usada
contra Dilma. Quem iria lembrar o grande garanhão negro, que morreu de
idade e de ferimentos durante a invasão da Índia? Quem iria explicar a
Bolsonaro do que é que estavam falando? O fato é que, a pedido da
segurança americana, o presidente brasileiro teve de entrar no hotel
pela porta dos fundos.
A
julgar pelo discurso que iria fazer na Assembleia Geral, a porta que
usou foi a correta. Não merecia mais do que a porta dos fundos.
Começou em pizza
Não
se impressione com a foto da grande comitiva comendo pizza na rua, como
se fossem politicamente perseguidos por não ter tomado vacina. Todos
poderiam ter comido lautamente, como estão habituados, se não fosse a
tal demagogia. Poderiam ser servidos no restaurante do hotel em que
estavam, em qualquer restaurante com varanda (como fizeram mais tarde),
poderiam ter pedido que algum dos vacinados da equipe buscasse comida em
outro local, poderiam se alimentar, e bem, na missão diplomática do
Brasil em Nova York.
Preferiram a foto de boias-frias. E (gosto é gosto) tiveram de comer pizza com ketchup.
Terminou em pizza
O
prefeito de Nova York, Bill de Biasio, também mergulhou na demagogia.
Disse, num discurso dirigido à delegação brasileira, que quem não
estivesse vacinado nem precisaria ir a Nova York, porque a cidade estava
fechada a eles. Não estava: a ONU desfruta de extraterritorialidade, e
com ou sem a aprovação de Biasio a delegação brasileira seria recebida. E
teria, como teve, acesso a um bom hotel, a bons restaurantes, tudo
direitinho. A demagogia de Bill de Biasio simplesmente não funcionou.
Terrivelmente difícil
André
Mendonça, o candidato “terrivelmente evangélico” que Bolsonaro quer
emplacar no Supremo, tem tudo para ser rejeitado pelo Senado – o que não
é comum, mas também não é comum um ministro do STF ser nomeado por suas
convicções religiosas. O Senado nem está marcando a sabatina de André
Mendonça: segundo o senador David Alcolumbre (que, aliás, trabalha
contra ele), é porque não há votos suficientes para aprová-lo.
Aparentemente Bolsonaro sabe disso, mas não tem como recuar, diante da
pressão aberta dos pastores evangélicos. De qualquer maneira, tem um
plano B: Augusto Aras, procurador-geral da República. O problema é que
os pastores acham que Bolsonaro não está jogando pesado em favor de seu
indicado. E, ao dizer que é submisso aos bispos de sua igreja, Mendonça
não ajuda em nada.
Tal e qual
Leia
o que o ex-presidente Lula disse a respeito do papel da imprensa, há
alguns dias: seu pensamento é parecidíssimo com o do presidente
Bolsonaro. Lula fala em “controle social da mídia” – em outras palavras,
mais cruas, quer censura. Lula, como Bolsonaro, odeia a Globo. Lula
abriu a TV Lula (o nome oficial é TV Brasil), Bolsonaro prometeu
fechá-la. Mas já está perto do fim do mandato e manteve a TV Brasil
exatamente como era, uma tevê de chapa branca, sempre de acordo com os
mandatários de plantão. Ambos, Lula e Bolsonaro, acham essencial
controlar a informação.
De volta
O
ministro Alexandre de Moraes, considerando que a prisão preventiva do
blogueiro Oswaldo Eustáquio, militante bolsonarista, tinha sido
decretada “para evitar agressões e ameaças à democracia no dia 7 de
setembro, decidiu liberá-lo, já que o 7 de setembro já passou. Decretei a
prisão preventiva de Oswaldo Eustáquio por entender, na ocasião, haver a
presença dos requisitos legais para a garantia da ordem pública, com
base na situação fática de então, em especial o fato de o investigado
incitar a realização de atos violentos e antidemocráticos no feriado de 7
de setembro (...) Verifico, porém, em razão da passagem do feriado de 7
de setembro, não estarem mais presentes os requisitos fáticos
necessários à manutenção da prisão preventiva”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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