Este é um dos poucos motivos para celebrar o milésimo dia de Jair Bolsonaro no Planalto, o mais completo e desastroso desgoverno do Brasil independente. Editorial do Estadão:
Completados
mil dias, são mil dias a menos com Jair Bolsonaro no Palácio do
Planalto. Este é um dos poucos motivos para celebrar o milésimo dia do
mais completo e mais desastroso desgoverno do Brasil independente. Haver
sobrevivido também pode ser uma razão para festejar, se for possível
conter, por algum tempo, a indignação e a dor pelos milhares de mortes
atribuíveis ao negacionismo, à irresponsabilidade e a uma incompetência
fora dos padrões conhecidos. Passados quase três quartos do mandato,
restam, no entanto, os perigos associados à ambição de um presidente
empenhado em continuar no poder – se possível, por meio de uma
reeleição.
Não
há por que esperar uma transfiguração de Bolsonaro, em sua luta para
sobreviver politicamente e adiar, ou talvez evitar, as consequências
legais de seus desmandos e omissões. Enquanto estiver na Presidência,
ele tentará preservar o custoso apoio do Centrão. Além disso, continuará
forçando a equipe econômica a encontrar, no Orçamento, recursos para
gastos eleitoreiros. Não há por que esperar, também, um desempenho, em
qualquer setor – educação, crescimento econômico, saúde, emprego e
bem-estar –, melhor do que aquele registrado até agora.
O
primeiro grande feito de Bolsonaro foi interromper a recuperação
econômica iniciada em 2017, depois da recessão de 2015-2016. A economia
cresceu apenas 1,4% em 2019, menos que no ano anterior, e já estava mais
fraca no começo de 2020, antes da pandemia. O recuo de 4,1% naquele ano
foi menor que o de várias economias desenvolvidas e emergentes, mas o
País entrou em 2021 com desemprego de 14,7%, muito acima dos padrões dos
países de renda média. Pior que isso, milhões de pessoas estavam
desassistidas e dependentes de campanhas de solidariedade para comer.
Ameaças
golpistas foram o complemento do cenário econômico de insegurança,
desemprego e miséria crescente. Logo depois da invasão do Congresso
americano por uma turba incitada pelo presidente Trump, Bolsonaro
ameaçou algo semelhante, no Brasil, se a eleição do próximo ano for
feita com voto eletrônico. Meses depois, um projeto de restabelecimento
do voto impresso foi derrubado no Parlamento, mas o presidente continuou
insistindo no assunto.
Conflitos
com os Poderes Legislativo e Judiciário marcaram toda a gestão
bolsonariana, e neste ano ele se concentrou em ataques ao Supremo
Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ataques
às duas Cortes foram temas das manifestações golpistas de 7 de setembro,
lideradas pelo presidente em Brasília e em São Paulo. Essas
manifestações foram por ele descritas como democráticas, em seu
vergonhoso discurso na abertura da assembleia anual das Nações Unidas,
em Nova York.
Rejeição
das instituições e ameaças de golpe, mais ou menos ostensivas segundo
as circunstâncias, foram acompanhadas, em alguns dos momentos mais
feios, de elogios à ditadura militar e a um notório torturador daquele
período, o coronel Brilhante Ustra, chamado de herói por Bolsonaro. O
mesmo qualificativo foi atribuído a um conhecido miliciano morto pela
polícia na Bahia.
Elogios
a um torturador e a um miliciano combinam com a política de facilitação
de acesso às armas. Pessoas sérias podem apoiar essa política, mas seus
principais beneficiários são obviamente os criminosos e os
bolsonaristas dispostos a formar milícias de apoio a um líder
antidemocrático.
Alimentada
pela incompetência e pela irresponsabilidade, a inflação acumulada em
12 meses bateu em 10%, atormentando famílias já acuadas pelo desemprego e
pela perda de renda. As projeções de crescimento econômico em 2022
estão abaixo de 2% e algumas instituições do mercado já anunciaram
estimativas próximas de 0,5%. O desastre na saúde e o fracasso econômico
foram complementados, nesses mil dias, com devastação ambiental,
desmonte do Ministério da Educação e comprometimento da imagem do País,
manchada por um extremista percebido em todo o mundo como caricatura
patética do já patético Donald Trump. Cada um desses mil dias é para ser
lamentado.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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