Dou três exemplos de teorias da conspiração em que as pessoas acreditam. Não acredito nelas, é verdade, mas faço força pra acreditar porque são divertidas, e recomendo como se fossem séries. Alexandre Soares Silva para a Crusoé:
As
teorias da conspiração são formas de dramaturgia, com sua própria
beleza e poder. Mas são desprezadas ainda, como foram desprezadas tantas
formas de dramaturgia no seu início: o romance, a série de tevê e, como
não me ocorre agora uma terceira, digo apenas “etc“.
A
criatividade dramatúrgica da nossa época está voltada agora não para a
poesia épica (dã), nem para o romance (duplo dã); nem para os filmes,
porque esse momento já passou, e nem para as séries de tevê, porque esse
momento já está passando: mas para a criação de teorias da conspiração
as mais bizarras e formidáveis e sinistras.
Algumas
não são falsas, obviamente. Você acha que nunca houve nenhuma
conspiração em nenhum momento da história da humanidade? Ou só acha que
nenhuma foi jamais bem-sucedida? As duas crenças são insustentáveis. Mas
pouco me importa no fundo se as conspirações são falsas ou verdadeiras,
porque gosto delas esteticamente (somos um clube).
Uma
teoria que queria criar é a de que – mas está preparado? É esta: por
mais espantoso que seja, não há registros de ondas no mar antes de 1904.
Nada na literatura, nada em quadros, nada em relatos de navegantes.
Devo
dizer isto de jeito convincente, a ponto de pelo menos causar uma
dúvida: “Meu Deus, será?”. E é só o que peço, porque essa dúvida
momentânea é ao mesmo tempo sinistra e agradável. Ela é o segredo da
apreciação estética das conspirações, e o que as distingue das outras
formas de dramaturgia, porque em todas as outras sabemos logo de cara
que são invenções.
Então
aceite meus tweets com imagens antigas de mares sem onda, e descrições
homéricas de mares planos mesmo durante tempestades; se não encontrar
isso em Homero, devo ser capaz de encontrar algo que pareça sugerir isso
em algum outro poeta épico em alguma língua do mundo.
Mas
qual a explicação? Por que as ondas começaram a aparecer, de repente,
em 1904? Simples, por motivos geopolíticos. O Czar Nicolau II precisava
prejudicar os assim chamados Poderes Atlânticos, digamos, e experimentos
geodésicos em 1901 (não tenho certeza se isso faz algum sentido, mas
basta falar com confiança) já tinham provado que era possível criar
ondas permanentes e enormes no lago Baikal por meio de abalos sísmicos. A
técnica começou a ser usada em segredo numa praia da Finlândia em 1903,
e depois com mais vigor em 1904, até que todos os mares passaram a ser
agitados por ondas. Obviamente o comércio entre os países oceânicos caiu
logo em seguida.
Mas
a parte interessante é a falsificação em massa que precisou ser feita
dos dados históricos, para que todos pensassem que sempre existiram
ondas: o governo russo construiu uma indústria da falsificação numa
fábrica gigantesca no subsolo da floresta boreal de Cheremkhovsky.
Dezenas de falsificadores de arte e historiadores produziram centenas de
quadros renascentistas, manuscritos de poemas, daguerreótipos – todos
registrando mares com ondas antes de 1904. Até mesmo tábuas de surfe
foram plantadas no Havaí, fingindo uma tradição milenar de surfe que é
claro que nunca existiu porque – bom, nem havia ondas. A falsificação
funcionou, parece, e até hoje achamos que o mar sempre foi assim como é
agora.
Acha que é absurdo demais para que alguém acredite? Mas existe algo absurdo demais para que alguém acredite?
A
seguir dou três exemplos de teorias da conspiração em que as pessoas
acreditam. Não acredito nelas, é verdade, mas faço força pra acreditar
porque são divertidas, e recomendo como se fossem séries:
1)
A Teoria do Tempo Fantasma: a Idade Média nunca aconteceu. Ela foi
inventada pelo imperador Otto III e o Papa Silvestre II, que estavam no
ano 700 d.c., mas queriam dizer que estavam no ano 1000 d.c. por motivos
complicadíssimos. Falsificaram ruínas de igrejas, de fortes e de muros,
além de documentos e poemas, e criaram do nada a existência do rei
Carlos Magno e de toda a dinastia carolíngea.
2)
A Nova Cronologia de Fomenko: toda a história chinesa e árabe são
invenções de jesuítas dos séculos XVII e XVIII. Jesus viveu no século
XII d.c., e a Guerra de Troia e as Cruzadas foram o mesmo evento
histórico.
3)
O mundo acabou em 2012. O universo inteiro, na verdade. Isso aconteceu
porque nesse ano cientistas descobriram a partícula Boson de Higgs, e
todo o universo foi sugado por um buraco negro. É impossível perceber a
diferença, mas já não existimos mais. (Stephen Hawkins falou sobre isso,
supostamente.)
Comparadas
com essas, teorias como as da facada falsa no Bolsonaro ou as da final
da Copa de 98 são tão pobres em imaginação, e causam um prazer estético
tão pífio, que se fossem séries não deveriam ter ido além da primeira
temporada. Na verdade nem o piloto devia ter saído do papel. Mas eles
têm sempre que ficar criando coisas novas, industrialmente e sem se
lixar para a qualidade, não?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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