Não quero saber se um partido se diz ou não se diz de “direita”. Quero um partido que se oponha à esquerda na matéria que mais conta e que a esquerda mais ameaça: a liberdade. Esse partido não existe. Via Observador, a crônica de Alberto Gonçalves:
Se
houvesse eleições nos próximos tempos, eu não votaria em ninguém. Sim,
sei que teremos as “autárquicas” após o Verão, mas nessas nunca votei
(excepto para me cobrar impostos, não reconheço qualquer utilidade às
autarquias, que ainda não encomendaram rotundas e “arte pública”
suficientes para me convencer do contrário). As eleições em que não
participaria por decisão casuística seriam as “legislativas”, nas quais
nem a teoria do mal menor me arranja uma possibilidade de escolha
decente: o comportamento dos partidos vigentes é mau o bastante para não
justificar o incómodo de sair de casa num domingo de Setembro ou
Outubro. Porquê? Porque nenhum partido tem levantado obstáculos
relevantes ao avassalador poder socialista.
Em
Portugal, há dois espaços políticos, o marxista, que vai do PS para a
esquerda, e o restante, que pode ou não enfiar a carapuça de se afirmar
“direita”. A designação não me interessa, os actos sim. Não quero saber
se um partido se diz ou não se diz de “direita”. Quero um partido que se
oponha à esquerda na matéria que mais conta e que a esquerda mais
ameaça: a liberdade. O último ano mostrou que esse partido não existe.
Existe, de facto, um conjunto de partidos que não são, ou não deveriam
ser, marxistas. Infelizmente, nas questões decisivas não se distinguem
particularmente do governo e respectivos aliados formais.
Para
não ser exaustivo, dois exemplos chegam. E sobram. O primeiro é o
“combate” à Covid, leia-se a histeria que apressou a descida do país à
falência, causou um número indeterminado de mortos por incúria e, talvez
principalmente, tornou a opressão dos cidadãos numa rotina. Gostaria de
ter visto um partido, um deputadozinho que fosse, protestar a sério
contra tamanha vergonha. Salvo uns gemidos pouco convictos do Chega, da
IL e, curiosamente, do PCP, não vi. Gemidos incluídos, todos os
parlamentares legitimaram e continuam a legitimar medidas criminosas e
humilhantes, inconsequentes no que toca ao vírus e arrasadoras de tudo
em seu redor. A liberdade não preocupa o espaço não marxista.
O
segundo exemplo consistiu na aprovação, explícita ou por abstenção, da
lendária “Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital”, que
entra vigor em breve e sem hesitações estabelece um regime de censura
para as notícias desagradáveis aos senhores que mandam. Proposto pelo
PS, o dito regime nem se esforça por disfarçar a inspiração das regras
em vigor durante o salazarismo. À direita do PS, ou lá onde é que querem
estar, nem um partido se esforçou por contrariar este assalto a uma
noção elementar de um estado de direito. A “desinformação”, jargão
moderno para “revelação de factos discordantes da propaganda oficial”, é
considerada por todos um alvo a erradicar. A liberdade não preocupa o
espaço não marxista.
O
que preocupa então o espaço não marxista? Imensos assuntos, que levam
os partidos em causa a cismar imenso e a debater imensas vezes para
tirar imensas conclusões acerca da imensa “identidade” de cada um. Ainda
há dias decorreu uma oportunidade de o fazerem em conjunto, organizada
pelo Movimento Europa e Liberdade (MEL). Dizer que o encontro esclareceu
as massas é um eufemismo. Quem desconhecia, aprendeu que o PSD do dr.
Rio não é de “direita”, que a Iniciativa Liberal não aprecia o Chega,
que o CDS não morreu e que o Chega, além de tirar privilégios aos
ciganos e vigor sexual aos pedófilos, sonha tirar eleitores à direita
envergonhada. Sobre o estado policial criado a expensas da Covid, nem um
palpite. Sobre a lei da censura, nem meio palpite. Coerência não falta
aos partidos à direita do PS. O que falta? Pertinência. Ou razão de ser.
As
forças políticas não se definem especialmente por “princípios”,
“valores” e “linhas”, vermelhas ou amarelas: definem-se por –
escapa-se-me a palavra, esperem aí que está quase – oposição. Por muito
que os partidos à direita do PS remoam aquilo que são, esquecem-se
daquilo que devem ser: oposição, oposição ao PS e às forças totalitárias
cujo pacto com o PS deslocou o centro ideológico indígena para a
esquerda da esquerda que sempre foi. O país não precisa de partidos que
receiam situar-se à “direita”, seja lá a direita o que for. E não
precisa de partidos que se afirmam de “direita” para preencher quotas de
eleitorado. Do que Portugal carece é de resistência activa e inequívoca
à noite escura em que o socialismo, com o seu cortejo de corrupção,
prepotência e miséria, nos enfiou. E isso Portugal não tem. Tem, fraca
compensação, uma colecção de pechisbeques que, aqui e ali, reclamam da
superfície e deixam as profundezas intactas. Os partidos presentes no
MEL limitam-se a compor o ramalhete “democrático”, e nessa medida ajudam
ao simulacro em que vivemos.
Mas
uma coisa é o país precisar de partidos capazes de perceber o perigo
que vem da esquerda. Outra coisa é os portugueses sentirem igual
necessidade. Salvo excepções minoritárias, a vasta maioria das pessoas
parece estar bem como está, e estará bem como vier a estar em breve.
Mesmo que em breve estejam arruinadas e subjugadas e dependentes a um
nível que nos afasta em definitivo das democracias comuns. Se calhar, no
que respeita ao desprezo pela liberdade, os partidos à direita do PS
não imitam só o PS e os aliados do PS: imitam os portugueses. O problema
é que o PS os imita melhor. A nossa “direita” é rica em princípios e
pobre nos fins. Donde o seu fim ser triste.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário