Trapaceiro chefia Executivo, Centrão controla Congresso e STF mente em votos, dispara José Nêumanne:
Primeiro
presidente eleito pelo voto direto sob a Constituição de 1988, dita
“cidadã” por Ulysses Guimarães, Fernando Collor prometeu combater
privilégios e foi derrubado em impeachment por corrupção. Fernando
Henrique nomeou o grupo responsável pelo Plano Real, que pôs fim à
inflação, mas traiu o espírito da Lei de Responsabilidade Fiscal, que
patrocinou, ao impor a própria reeleição, e nutriu o embrião do Centrão
ao adotar o presidencialismo de coalizão (ou de colisão?). Lula entregou
dois governos a empreiteiros corrupteiros, que, como relatou o figurão
do Partido dos Trabalhadores (PT) Antônio Palocci, redigiram 900 de mil
medidas provisórias, impostas ao Congresso. E levou seu poste Dilma
Rousseff a ganhar duas disputas atribuindo a adversários o crime de
surrupiar refeições do trabalhador, em campanhas de marqueteiros pagos
por propinas de beneficiários, segundo vasto relato de magotes de
delatores. Ela caiu do alto da torre em impeachment por contabilidade
fajuta.
Em
meio mandato, Itamar Franco foi o único da lista a honrar o cargo de
1988 para cá. Pilhado numa conversa marota com Joesley Batista, nos
porões do Jaburu, Michel Temer chegou até a ser preso, quando seu meio
mandato finou. E Jair Bolsonaro ganhou a disputa em 2018 aplicando
golpes que aprendeu na prática da velha política, da qual se dizia
exterminador. Em meio mandato, o atual chefe do Executivo superou os
antecessores em trapaças: eleitos a bico de pena da Primeira República,
apaniguados do ditador do Estado Novo fascistoide, o mar de lama de
Getúlio, acusações contra JK, truques de Jânio e a corrupção censurada
dos generais que deram o golpe em 1964. Vitorioso sem debates e eleito
num palanque de leito hospitalar, ele traiu os votos que recebeu de
antipetistas, de quem queria ver gatunos na cadeia e do soi-disant
mercado, que confiou em suas lorotas de reformas e privatização. Sob a
bandeira de “mais Brasil e menos Brasília”, ele acorrentou 100 milhões
de brasileiros que produzem a 11 milhões e meio de marajás que desmandam
na “Pátria amada”, que não ama os filhos deserdados.
Tudo
sob vigilância e controle do Centrão de antanho, de Arthur Lira,
sub-Cunha importado das Alagoas de Renan e Collor. E Rodrigo Pacheco,
que imita Tancredo Neves por também ter nascido em Minas, sem, contudo,
passar de um “Pacheco” do folclore publicitário: o torcedor abestalhado
da melhor seleção dos tempos em que o Brasil era bom pelo menos no
futebol. Com mais de 70 projetos de impeachment óbvio na gaveta, a dupla
distribuiu R$ 3 bilhões de emendas parlamentares para tomar o poder no
Congresso, mais desmoralizado hoje do que antes. E em vez de atender à
necessidade premente do cidadão que morre sem ar em filas de UTIs
lotadas, mercê do gosto pela morte do capetão sem noção, ora ensaia um
golpe ao antigo modelo, convocando capitães da indústria e da banca para
repetir 1889, 1937 e 1964. A medida saneadora urgente é adiada pelo
desvio da trapaça, que eles conhecem bem.
Trata-se
de mais um capítulo do “acordão” para salvar compadritos comprometidos
nos autos das operações, principalmente a Lava Jato, do futuro em celas,
como as que foram reservadas para Lula e Marcelo Odebrecht. E para cuja
consecução só falta o acréscimo do acento agudo na segunda sílaba.
Ninguém perde por esperar: o acórdão “vem aí”, como Jânio em 1960. Já
começou a ser engendrado nas altas instâncias do Judiciário. O
ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça João Noronha e o
procurador-geral da República, Augusto Aras, deram a gazua para o
primogênito presidencial, Flávio Bolsonaro, escapar das evidências da
extorsão de funcionários fantasmas da Assembleia Legislativa do Rio de
Janeiro (Alerj) e dormir no luxo da mansão de quase R$ 6 milhões. E a
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) abriu o expediente para,
depois de higienizar a ficha suja do ex Lula, incriminar o juiz Sergio
Moro, que o condenara.
Edson
Fachin omitiu cinco anos de confirmações da competência da vara
federal, abrindo a temporada de caça a Moro, ao exercer a memória tardia
da militância petista, que o guindou ao nada excelso pretório. Gilmar
Mendes, que humilhou o colega Nunes Marques por sua origem nordestina e
citou os inimigos Modesto Carvalhosa e Rodrigo Janot, que nada tinham
que ver com a pauta, mentiu. Foi seguido por Ricardo Lewandowski, que se
referiu exaustivamente ao produto de invasão de sigilo telefônico de
autoridades, mas a ignorou no voto. E a procuradora Cármen Lúcia, que
dispensa sobrenomes, imitou o relator vencido na amnésia, mudando para
dar o voto vencedor. Não se sabe se por gratidão ao ex-sindicalista, que
a indicara comovido com os vestidos costurados pela mãe, assim como as
próprias roupas por dona Lindu, ou pelo charme do colega ao lado. Votou
entre uma bem remunerada palestra e outra do Instituto do Direito
Público, do vizinho.
Nada
combina mais com esta república da trapaça do que uma “justiça” de
mentira, que, ao cobrar parcialidade do paciente, nunca lhe deu sequer
um mísero segundo de defesa.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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