Aí inventaram o tal do financiamento público de campanha, pelo qual um
eleitor tem obrigatoriamente de contribuir para a eleição de candidatos
de que não gosta, de partidos que despreza. Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais de domingo:
Octavio Frias de Oliveira, o empresário que transformou a Folha no
maior jornal do país, costumava dizer que a vantagem de ter idade era
ter visto tudo acontecer – e o contrário também. Hoje entendo o que
Frias nos ensinava.
Quando eu era garoto, os políticos não eram muito diferentes dos de
hoje. Jogavam pesado durante o mandato, faziam o que não deviam na
campanha. Mas tudo com dinheiro recolhido por eles: havia quem tomasse
algum dos bicheiros, das prostitutas, dos motoristas de táxi, dos
pequenos empresários (muitos) e dos grandes empresários (poucos). Havia
chantagem, havia toma lá dá cá, havia promessa de favores a quem doasse
mais – mas cada partido, cada candidato, cuidava de sua arrecadação, sem
botar a mão no bolso dos eleitores. E nunca faltou dinheiro para uma
eleição.
Aí inventaram o tal do financiamento público de campanha, pelo qual
um eleitor tem obrigatoriamente de contribuir para a eleição de
candidatos de que não gosta, de partidos que despreza. E é um monte de
dinheiro: no nosso apertado Orçamento, a verba eleitoral atinge R$ 3,7
bilhões. Falta dinheiro para vacinas, falta dinheiro para saneamento,
mas não falta dinheiro para dar boa vida a candidatos que,
definitivamente, não chegam a nos fascinar.
Fora sustentar os pançudos, há outro problema: abrir partidos virou
bom negócio, porque participam da divisão da megaverba. Políticos podem
olhar-nos com desprezo. Somos os babacas que pagam quem vai nos
desapontar.
Extremos unidos
Os grupos mais felizes com Augusto Aras, escolhido por Bolsonaro para
a Procuradoria Geral da República, são os bolsonaristas e os petistas.
Os extremos se tocam. Aras não chega a ser fã da Lava Jato e disse que
usará o cargo para fazer justiça e não para perseguir políticos e a
política. A leitura bolsonarista: Aras não irá perseguir Flávio
Bolsonaro. Disse também que não será só acusador, mas buscará absolver
os injustiçados. Leitura do PT: “injustiçado” é Lula. Jaques Wagner
pediu aos petistas um voto de confiança a Aras. Nada como ter problemas
parecidos para apoiar soluções idênticas.
A chance de Lula
No final deste mês, ou no início de outubro, no máximo, o Supremo
deve reexaminar o caso de Lula (que acusa Sérgio Moro de ter sido
parcial) e a prisão após condenação em segunda instância (a Constituição
determina a prisão após trânsito em julgado, ou seja, quando não houver
mais nenhuma possibilidade de recurso). Segundo a Folha de S.Paulo, o
ministro Celso de Mello não gostou do conteúdo das mensagens que,
segundo The Intercept, Moro trocou com os procuradores da Lava Jato.
Se Celso de Mello, que votava pela prisão após condenação em segunda
instância, mudar de posição, o Supremo retornará à posição anterior, de
só admitir prisões após o trânsito em julgado. Dizem os lavajatistas que
com isso estará liquidada a Operação Lava Jato: sem ameaça de ir logo
para a prisão, para cumprir longas penas, por que alguém iria aderir à
delação premiada?
Boa pergunta
Será impossível fazer investigações sem o uso da delação premiada?
A guerra dos impostos
A demissão de Marcos Cintra, secretário da Receita Federal e defensor
do Imposto Único, deve gerar crises no bolsonarismo. Empresários que
lutam há anos pelo imposto único, liderados por Flávio Rocha, que foi
candidato à Presidência tendo essa tese como programa, estão
insatisfeitos e já chamaram Cintra para trabalhar com eles. Rocha é um
dos apoiadores de primeira hora de Bolsonaro. E, exatamente por causa
dos impostos do país, levou boa parte da produção de sua Confecções
Guararapes para o Paraguai.
O alegre retorno
Aproveitando o clima político contrário à Lava Jato, deputados
federais se preparam para proibir que juízes de primeira instância
possam mandar quebrar seus sigilos ou prendê-los. Processar, tudo bem,
mas sem atingir as autoridades. Além disso, já foi aprovado na Câmara (e
será votado depois de amanhã no Senado) um projeto que muda as regras
eleitorais e partidárias. A mudança envolve apenas dinheiro: abre
brechas mais amplas para Caixa 2 e dificulta a apuração de
irregularidades na prestação de contas.
Garantindo o conforto
E, para evitar novos incômodos, um grupo de deputados (do PT e
partidos anexos, com a única exceção do pedetista cearense André
Figueiredo) propôs uma CPI da Lava Jato. A informação que divulgam é de
que já reuniram as 171 assinaturas necessárias. Tudo agora depende de
Rodrigo Maia tocar ou não em frente a instauração da CPI. Sem
investigações a vida é bem melhor.
Consequências
Em boa parte por causa desta confusão, a confiança na economia piorou
para 38,1% dos profissionais de vendas e marketing. A pesquisa foi
feita pela ADVB, Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do
Brasil.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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