No meio de tanta confusão, em que o governo Temer se concentra em sua própria defesa, como ficará a reforma da Previdência? Carlos Alberto Sardenberg busca algumas respostas:
Não é
uma questão de achar que a crise política atrasa a economia. Pode-se ver
isso em diversos sinais. Por exemplo, os índices de confiança da
Fundação Getulio Vargas, divulgados nesta semana, mostram consumidores,
empresários e investidores mais pessimistas. E, sobretudo, com menos
esperança na recuperação.
Esses
índices, construídos a partir de entrevistas, pedem que as pessoas
avaliem a situação atual e as expectativas para seis meses. Desde que o
país foi deixando a recessão para trás, notava-se um padrão:
entrevistados diziam que o momento não estava nada bom, mas que as
coisas certamente estariam melhores daqui a pouco. Agora, continuam
achando que a situação atual não é boa, mas desconfiam de que não vai
melhorar nos próximos meses.
Ora, há
muitos dados positivos na economia real: a inflação no chão, juros
desabando, setor agrícola gerando safras recordes, exportações em alta,
superávit comercial subindo e entrando dólares de investidores
estrangeiros. Além disso, as empresas voltaram a criar vagas formais. A
equipe econômica é de primeira, e estatais importantes, como a
Petrobras, voltaram à boa gestão.
Por que,
então, cai a confiança dos agentes econômicos, categoria que inclui
desde presidentes de empresas a consumidores comprando ou não no
shopping?
Porque o
noticiário político-policial é desanimador e piorou desde que se
revelou a delação de Joesley Batista e seu pessoal da JBS. Não houve
pânico no mercado financeiro, mas os principais indicadores pioraram: a
Bolsa, que rodava a 68 mil pontos, com expectativa de alta, está agora
na casa dos 62 mil. O dólar flutuava em torno dos R$ 3,10, agora um
pouco acima dos RT$ 3,30.
Muita
gente estranhou que esses dois indicadores tenham se comportado tão
serenamente nos últimos dois dias, logo após conhecida a denúncia do
procurador Rodrigo Janot contra o presidente Temer. Bolsa caiu na terça,
subiu ontem. Dólar, dando o mesmo sinal, subiu e caiu.
Como se
diz no mercado, a denúncia estava no preço. Tradução: o pessoal já sabia
que Temer fora apanhado no esquema de corrupção. Estava na cara, não é
mesmo?
O enredo
básico é muito simples: o presidente Temer diz a Joesley, num encontro
clandestino, que o contato entre eles deveria ser feito através de
Rodrigo Rocha Loures. Depois, Joesley conversa com Rodrigo e negocia uma
enorme propina em troca de uma mudança no contrato de uma de suas
empresas com a Petrobras. Rodrigo fala com gente do governo
administrando o pedido de Joesley. E recebe uma mala com 500 mil reais.
O que
queriam mais? Um cheque assinado por Joesley e depositado na conta de
Temer? A defesa de Temer dizer que não tem dinheiro entregue para ele é
como a defesa de Lula pedir que apresentem a escritura do tríplex do
Guarujá em nome do ex-presidente. A acusação é de patrimônio oculto e
lavagem de dinheiro. Com escritura?
Do mesmo
modo, por que Joesley entregaria uma montanha de dinheiro ao tal
Rodrigo se este não fosse o representante de Temer no balcão de
negócios?
Tirante
um ou outro, acho que ninguém acredita de fato na defesa de Temer. Na
prática, os que o defendem se dividem em dois grupos: o primeiro é
formado pela turma que quer melar a Lava-Jato, para escapar dela; o
segundo grupo acha ou achava que Temer poderia ser um “culpado útil”.
Ok, está no esquema de corrupção, mas, caramba, se ele conseguisse
aprovar as reformas, especialmente a da Previdência, estaria mais que
suficiente.
Temer
também sabia disso. Ou alguém acreditava mesmo que ele era um reformista
de fé? As reformas eram um meio de ele salvar seu mandato.
E é por
aqui que as coisas estão mudando. A cada dia que passa, Temer é mais
culpado e menos útil, tal é a percepção que se forma nos meios
econômicos.
Flagrado,
o presidente se concentra na sua defesa, num processo que vai ocupar a
Câmara dos Deputados. Como vão tratar da reforma da Previdência nesse
turbilhão?
A trabalhista está quase aprovada e precisa de menos votos, só uma maioria simples.
Vai daí,
forma-se o entendimento dos agentes econômicos e, talvez, da equipe de
Meirelles: passar a reforma trabalhista é o suficiente por ora. Depois,
administrar a coisa até as eleições. A previdenciária só traria ajuste a
médio prazo mesmo, tal é o discurso de consolação.
Duas
consequências. Na economia, não haverá investimentos, o consumidor se
retrai e, logo, não há recuperação do crescimento. O cenário bom será
não voltar à recessão.
Na política, Temer deixa de ser útil e por isso passa a ser descartável. Ou seja, sua eventual queda vai entrando no preço.
Haverá decepção e mais pessimismo econômico se a reforma trabalhista cair. Mas quem se importará com um culpado inútil?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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