Para que o país se recupere da maldição lulopetista ainda falta muito,
embora já esteja com um pé fora da UTI. Artigo de Rolf Kuntz no
Estadão:
O primeiro e mais urgente desafio para o governo é tirar o País da
UTI, mandá-lo para a recuperação e divulgar boletins animadores e
críveis sobre a melhora de suas condições fiscais. Se tudo andar bem, lá
por 2019 ou 2020 haverá sinais de controle da dívida pública. Será um
trabalho politicamente complicado, mas o roteiro é mais ou menos
conhecido. Será preciso, contudo, ir muito além do tratamento intensivo e
da reabilitação inicial. Governo e setor privado terão de repor o
Brasil em condições de competir no mercado internacional e de crescer em
ritmo parecido com os de outros emergentes – na faixa de 4% a 6% ao
ano, somente para reconquistar algumas posições. Falta saber como cuidar
dessa parte: essa é, neste momento, a área mais obscura da política
econômica. Será como reinventar o País, depois de muitos anos de
equívocos e de ampla deterioração da capacidade de crescimento.
Por enquanto, já será muito bom se o Brasil voltar a se mover. Novas
projeções, mais animadoras, apontam mudança de sinal – para o lado
positivo – no próximo ano. Em 2017 o produto interno bruto (PIB)
crescerá pouco mais de 1%, de acordo com estimativas do mercado
financeiro e de consultorias. Além disso, economistas do Fundo Monetário
Internacional (FMI) elevaram de zero para 0,5% sua previsão de
crescimento para o próximo ano. Apesar dessa melhora, só um país
sul-americano, a Venezuela, terá desempenho pior que o do Brasil. Para a
economia venezuelana as projeções apontam recessão pelo quarto ano
consecutivo. Nada surpreendente, enfim, quando se mudam cardápios de
lanchonetes por falta de farinha de trigo, indústrias param de funcionar
por escassez de peças e milhares formam filas nos supermercados quando
chegam carregamentos de papel higiênico.
Mas como retomar, no Brasil, o potencial de crescimento de outros
tempos? No curto prazo, o governo terá de cuidar principalmente da
arrumação das contas públicas. Precisará controlar despesas, selecionar
os gastos mais severamente e criar mecanismos para controlar o Orçamento
nos anos seguintes. A proposta de um teto para a elevação da despesa já
é um começo promissor. Estão em estudos projetos de reforma da
Previdência e das normas trabalhistas.
Tudo isso pode animar o mercado financeiro, mas será preciso algo
mais para movimentar a produção. Autoridades têm falado em concessões na
área da infraestrutura, com critérios mais atraentes para o capital
privado. Por enquanto, há mais palavras do que iniciativas práticas.
Concessões e outros sinais positivos poderão reativar a economia e
criar condições para aumento da receita fiscal no próximo ano. Isso
facilitará o ajuste das contas federais, mas, ainda assim, talvez seja
necessário algum aumento da tributação. Será um lance politicamente
difícil. Sondagens patrocinadas por entidades da indústria têm mostrado
muita resistência dos cidadãos à ideia de mais impostos e contribuições.
Não há, nisso, grande surpresa. O dado mais interessante é outro.
O governo, segundo a maior parte dos entrevistados, pode fazer muito
mais e prestar serviços melhores com a arrecadação já estabelecida. Esse
comentário pode parecer – e talvez seja – um lugar-comum, mas vale a
pena explorá-lo. Traduzida em termos menos correntes, essa avaliação
corresponde a uma cobrança de produtividade e qualidade, dois atributos
muito raramente considerados na gestão do serviço público. Durante o
período petista, a ideia de produtividade no governo foi rechaçada, com
persistência, como preconceito neoliberal. Progressista era a
contratação preferencial de companheiros e aliados, complementada com
generosa revisão de salários.
Mas a baixa eficiência da administração pública, especialmente da
federal, é apenas uma parte muito visível do problema econômico
brasileiro. Improdutividade e incompetência refletem-se no desperdício
de recursos, na baixa qualidade de planos e de programas e no
acompanhamento inepto de obras e de projetos. Tudo isso é visível tanto
na escassez do investimento quanto na baixa relação entre custo e
rendimento de cada real investido.
Num país administrado com alguma seriedade, um trecho ferroviário de
800 quilômetros mantido sem uso seria uma aberração quase inacreditável.
Completar um parque de energia eólica sem rede de transmissão seria
assunto de piada, talvez história contada por mentiroso incontrolável.
No Brasil, tudo isso é parte da normalidade – mais precisamente, de
uma normalidade consagrada numa longa fase de incompetência e corrupção
maquiadas como progressismo. Quantos países têm verbas vinculadas
constitucionalmente à educação? Também nesse quesito o Brasil é uma
exceção, assim como na classificação de seus estudantes – sempre entre
os últimos – nos testes internacionais de linguagem, matemática e
ciências.
A economia brasileira poderá crescer até com alguma facilidade,
inicialmente, pela ocupação da capacidade ociosa. A partir daí, a
velocidade só aumentará se houver ganho de produtividade tanto no setor
empresarial quanto na área pública. Isso dependerá tanto do volume do
investimento quanto do produto gerado a partir de cada real investido.
Uma economia mais aberta e mais integrada internacionalmente poderá
estimular a eficiência empresarial. Mas a operação do conjunto dependerá
de amplas mudanças na concepção e na execução de políticas públicas.
Isso envolverá uma definição mais cuidadosa de prioridades, assim como
novos padrões de planejamento, de elaboração de programas e de execução
de projetos. Será necessário, em suma, inverter o sinal de todas as
políticas dominantes desde a ocupação, o aparelhamento e o loteamento da
máquina estatal pelo PT. O trabalhoso conserto das contas públicas é só
o começo de uma enorme reconstrução.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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