Prática ocorreu por 12 anos e rendia quantia irrisória a índios, diz MPF.
Historiador diz que prática contribui para redução de áreas indígenas.
Em Dourados, fazendeiros arrendam área para plantio de soja, segundo MPF. (Foto: Divulgação/MPF)
O Ministério Público Federal de Mato Grosso do Sul
(MPF/MS) investiga cerca de 30 pessoas, entre produtores rurais e
índios, em dois processos relativos ao arrendamento de terras da União.
As áreas ficam nos municípios de Dourados e Maracaju,
segundo o procurador da república Marco Antônio Delfino. Para
estudiosos, a prática tem relação histórica com a redução de áreas
indígenas.“Infelizmente é um processo que não é único, mas tem que ser combatido de forma permanente”, disse ao G1. Conforme ele, a área em Dourados tem cerca de 700 hectares, enquanto em Maracaju aproximadamente 150 hectares.
Ficou comprovado que os produtores detinham todo o processo de produção e pagavam valores irrisórios como R$ 100 por alqueire em alguns casos ou R$ 2 mil por safra. Em outro caso, ainda conforme informações do MPF, foram pagos R$ 3 mil ao ano por sete hectares de terra. As investigações apontaram que as práticas ocorreram com frequência em Dourados.
Terras indígenas pertencem à União e aos índios cabe uso exclusivo das áreas, conforme disposto no artigo 20 da Constituição Federal. O arrendamento é proibido em lei e configura crime, cabendo pena de detenção, que vai de um a cinco anos e multa.
Procurador diz que prática é problema histórico no
estado. (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)
Prática antigaestado. (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)
Delfino afirma ao G1 que a prática de arrendamento de terras da União é um problema histórico. “A prática começa em 1960 pela antiga Fundação Nacional do Índio (Funai) e não havia proveito nenhum para os índios. Os chefes de postos [antigo Serviço de Proteção ao Índio – SPI] arrendavam terras kadiwéu para produtores rurais”, explica em referência à área no município de Bodoquena, que fica a 260 quilômetros de Campo Grande.
Conforme o procurador, foram registrados também casos na região Sul do estado em que a prática chegou até a fase da colheita da produção. Mesmo com o aspecto histórico, segundo informações do MPF, não há processos relativos a arrendamento de terras da União em outras cidades, além dos investigados em Dourados e Maracaju.
Delfino afirma que indígenas flagrados pelo MPF nas práticas ilegais foram responsabilizados. “O arrendamento só existe porque há uma pessoa que arrenda: a pessoa que sabe que aquela terra é da União e, mesmo assim, vai lá e tenta cooptar [índios]”.
Para o historiador e professor da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Neimar Machado, ao longo dos anos, o arrendamento praticado pelo antigo SPI foi uma forma de redução das áreas indígenas. Segundo ele, o processo faz com que índios não usufruam das terras e, posteriormente, fazendeiros acabavam conseguindo a titularidade das terras.
Para historiador, arrendamento acirra pobreza
entre indígenas. (Foto: Reprodução/TV Morena)
“Essa prática de arrendar, inicialmente, não era dos índios, mas do
próprio órgão indigenista oficial [SPI]. Com o tempo os índios adotaram a
prática, mas o arrendamento acirra a pobreza, porque os indígenas não
tem área de plantio e vivem em situação de miséria”, explica.entre indígenas. (Foto: Reprodução/TV Morena)
Os lados
O presidente do Sindicato Rural de Dourados, Marisvaldo Zeule, disse ao G1 desconhecer a prática de arrendamento de terras na região. “Agora, se existir alguém que arrenda, não comungamos com isso. Nós vamos pela legalidade, o que não for, que os responsáveis respondam”, declara.
O G1 também entrou em contato com a Funai de Dourados para comentar o caso, mas até o fechamento desta reportagem não teve retorno.
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