Ação de sustentabilidade da Comissão Pastoral da Terra (CPT) alerta para o aumento alarmante de casos de trabalho escravo em setores-chave da economia brasileira
De acordo com o relatório anual Conflitos no Campo Brasil 2023 – recentemente lançado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) – que traz recortes sobre o trabalho escravo em diferentes tipos de negócios, com os números de denúncias e pessoas envolvidas e resgatadas a cada ano – somente no campo, cerca de 2,7 mil trabalhadores foram resgatados em fiscalizações do governo federal em 2023. Esse é o maior número de resgatados – em condição de trabalho escravo em diferentes tipos de negócios, entre eles, cafeicultura, vinícolas, pecuária, lavouras de cana-de-açúcar, construção e indústria têxtil – dos últimos dez anos.
Segundo dados atualizados da campanha permanente da CPT “De Olho Aberto para não Virar Escravo”, entre 1995 e 2024, mais de 67 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão foram encontrados. Os setores mais envolvidos, no mesmo período, incluem a pecuária (29%), o cultivo de cana-de-açúcar (21%), lavouras permanentes (13%), lavouras temporárias (11%) e a produção de carvão vegetal (8%).
O setor de café, entre 2003 e 2024, registrou 4.128 pessoas em situações de trabalho escravo. Somente no ano passado, 39 casos foram registrados e 302 pessoas foram resgatadas. Já a pecuária e a prática do desmatamento – frequentemente ligada ao uso de trabalho escravo –, em 2023, foram responsáveis por 60 e 13 casos, respectivamente, com um total de 275 pessoas resgatadas.
Os dados da CPT, revelam, ainda, que na construção civil – um dos setores que mais emprega no Brasil – 239 casos foram registrados, desde 2002, com 3.328 resgates. A indústria da confecção registrou 69 casos, desde 2010, com 750 resgates. A colheita da cana-de-açúcar – um dos pilares da economia agrícola brasileira, com o país sendo um dos maiores produtores de açúcar e etanol – registrou 618 resgates, somente no ano passado. Já a produção de carvão vegetal e a pecuária, tiveram 480 ocorrências e 4.748 resgates e 1.947 casos e 15.222 resgates, respectivamente, desde 2002.
Atualmente, as denúncias podem ser realizadas online, com total sigilo, acessando diretamente a Divisão de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho, por meio do Sistema Ipê (ipe.sit.trabalho.gov.br). Ou ainda por meio do Ministério Público do Trabalho mais próximo.
Os métodos de escravização geralmente incluem diferentes elementos, como recrutamento em áreas distantes, transporte em condições deploráveis, uma cadeia de pessoas intermediando o recrutamento, condições de trabalho precárias e perigosas, coerção por meios violentos, ameaças e restrição da liberdade, prática de endividamento reforçado pelo sistema de compras no armazém da fazenda ou do local de trabalho.
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) desenvolve ações pela erradicação do trabalho escravo. Com objetivo de chamar a atenção da sociedade para esse cenário, a organização lançou – este ano – a ação de sustentabilidade denominada #ChegadeEscravidão3, que tem como base os números de exploração de trabalhadores nas principais atividades produtivas – divulgados pelo relatório. “Nossa proposta é sensibilizar e mobilizar a sociedade a olhar para essa dimensão do trabalho pastoral que a CPT desenvolve, tendo foco em um tema que é bastante latente no Brasil, que é o trabalho escravo contemporâneo”, explica Francisco Alan, coordenador da CPT regional Pará.
“O trabalho escravo e outras modalidades de conflitos infelizmente permanecem na realidade brasileira. Queremos também, a partir dessa ação de sustentabilidade, mostrar sinais de esperança. A CPT precisa dar continuidade na sua ação pastoral, atuando junto às comunidades que se organizam na luta por uma terra sem males. Por isso, chamamos todos a contribuir para que possamos seguir nesse trabalho juntos aos povos”, completa Francisco.
Histórico de trabalho da CPT
A primeira denúncia de trabalho escravo foi realizada em outubro de 1971, por meio da carta pastoral "Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social", escrita pelo bispo da prelazia de São Félix do Araguaia (MT), dom Pedro Casaldáliga, um dos fundadores da Pastoral.
É nesse cenário, de grave situação vivida pelos trabalhadores explorados, principalmente na Amazônia, submetidos a condições semelhantes às de escravidão e expulsos das terras que ocupavam, que nasce a Comissão Pastoral da Terra, em junho de 1975.
Mais de quarenta anos após a carta de Pedro Casaldáliga, a exploração de mão de obra escravizada ainda é uma realidade no País. O propósito e missão principal da Comissão Pastoral da Terra envolvem a defesa dos trabalhadores e trabalhadoras e a justiça social. Em 1997, a Pastoral criou a campanha nacional e permanente de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo, “De Olho Aberto para não Virar Escravo”. Por meio dela, realiza o acolhimento e realização de denúncias aos setores responsáveis pela fiscalização, apoio às vítimas, ações de conscientização, prevenção e incidência sobre o tema. Além disso, atua registrando os dados de fiscalização dos estabelecimentos denunciados, atividades que mais utilizam mão de obra escravizada e quantidade de trabalhadores resgatados a cada ano.
*os dados da campanha “De Olho Aberto para Não Virar Escravo” são constantemente atualizados. Para este conteúdo, foram utilizados dados de 14 de novembro de 20
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