TRECHOS
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Assim, Goro criticava a maneira como você, Kogi, lia poesia. Era também
uma crítica premonitória sobre sua vida. Não era o que Goro dizia? Por
não ter ido à guerra e não ter participado das lutas revolucionárias,
ele afirmava que você desistira de si mesmo quando era estudante
colegial. Não seria um problema se daquele momento em diante você se
deixasse levar pela vergonha de uma vida questionável. No entanto, você
ficou fascinado apenas pelas ideias filosóficas maravilhosamente
expressas, como acontece agora em relação à sua afeição por Eliot. Com o
sentimento de viver das lembranças do passado. [p. 90]
—
Mishima levava a sério a ideia de um golpe de Estado das Forças de
Autodefesa? Ou seja, ele o idealizou como um programa com possibilidades
positivas de se concretizar? O que Mishima pretendia ao iniciar o
movimento da Tate no kai, a Sociedade do Escudo? Tendo-a como base, ele
incitou, em última análise, as Forças de Autodefesa a darem o golpe de
Estado. No entanto, como a ideia não foi aceita, ele acabou se
suicidando por esventramento. Se ele tinha de cor uma última sentença
imaginando essa possibilidade, pode-se imaginar o quanto seria mórbido. [p. 105]
A
narração detalhada das etapas preparatórias de sua derradeira grande
empreitada constitui a terceira parte a ser redigida pelo escritor. Na
etapa atual, eu ainda nada poderia afirmar sobre a dimensão da grande
empreitada. Bem, a fronteira entre o romance e a realidade é tênue, mas
admita que reside nela justamente a sua técnica, Kogi. Isso porque, caso
nos lancemos de fato à luta, todo tipo de erro tolo pode acontecer.
Algo com a escala de uma provável destruição do centro de Tóquio talvez
acabe apenas como fogos de artifício soltos por crianças em um bairro
residencial. [p. 139]
—
Não comentarei o que ou como faremos, Kogi, apenas espere pela surpresa
e pela excitação quando o momento enfim chegar. Temos ainda bastante
tempo pela frente! Restringindo-nos ao momento atual, gostaria que você
guardasse no peito a estrofe de Eliot: Que não me falem da sabedoria dos velhos, mas antes de seu delírio. [p. 147]
No
torso do jovem, nu e liso como uma prancha, viam-se tatuagens tênues e
simétricas. O que causava forte impressão eram os olhos muito negros que
devolviam para a câmera um olhar repleto de melancolia e desconfiança e
os lábios repletos de uma ingenuidade provocante. A foto ao lado era a
de um japonês quase chegando aos quarenta anos, vestindo uma camiseta
com um logo dos que se costuma encontrar à venda nos centros acadêmicos
das universidades. A força encantadora de seus olhos e lábios era
semelhante à do outro retrato. [p. 273]
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