O consumo de carne não é criminalizado, mas um sem-número de progressistas vira vegano ou vegetariano por razões alegadamente éticas. Parar de comprar drogas enquanto elas significarem o financiamento do narcotráfico, porém, está fora de cogitação. Há mais piedade para uma galinha do que para um favelado. Bruna Frascolla, via Gazeta do Povo:
Toda
vez que houver quebradeira por causa de uma vítima com pedigree racial,
anotem: acontecerá em área urbana do Sudeste ou no Sul, e o defunto não
foi vitimado por traficante nem ladrão. Quem não olhar dados sobre
violência achará que o Nordeste e o Norte são uma maravilha, uma vez que
concentram muito mais negros e pardos do que o Sudeste e o Sul, mas os
mortos só aparecem aí. Os rincões rurais deve ser tranquilos, e os
soldados do tráfico, que se matam uns aos outros, devem ser todos
alemães de Blumenau. Afinal, olhando os progressistas da TV e do
Twitter, parece até que uma morte violenta de um adulto violento é uma
coisa excepcional, em vez de rotineira.
Dizem
que quebram tudo por se importarem com “vidas negras”. Aspas, porque eu
não estou disposta a dizer que tenho uma “vida branca”, nem uma “vida
baixinha”, nem uma “vida de cabelo liso escorrido”, nem uma “vida com
sangue negro”, muito embora eu seja branca, baixinha, com cabelo liso
escorrido e tenha sangue negro. Se eu não me chamo de vida branca, vou
chamar o negro de vida negra por quê? E se eu me chamar de vida branca,
por que não vou me chamar de vida baixinha?
Algum
filósofo do Iluminismo escocês, não me lembro se David Hume ou se Adam
Smith, fez uma consideração muito astuta sobre a natureza humana e suas
paixões: se soubéssemos que uma catástrofe abateu muitas vidas do outro
lado do mundo, ficaríamos tristes, mas não perderíamos o sono por isso.
Por outro lado, se fôssemos para a cama com a notícia de que no dia
seguinte iriam amputar um dedinho nosso, ficaríamos aflitíssimos, e
dormiríamos muito mal. Mesmo considerando que nosso dedinho vale muito
menos do que as muitas vidas do outro lado do mundo.
É
da constituição humana, afinal de contas, termos nossas emoções muito
afetadas por coisas que nos são próximas, independentemente do quão
humanistas e universalistas sejam os nossos valores. E como ficar
chorando aqui não muda a vida de ninguém do outro lado do mundo, não há
nada de errado nisso. Que bom que conseguimos ler estatísticas e
notícias de homicídios sem ficar pranteando; do contrário, ficaríamos ou
muito mal informados, ou muito deprimidos… Ou as duas coisas!
Assim,
quando o puxadinho brasileiro do Black Lives Matter diz que está em
prantos por causa do “marido errático” falecido, é claro que mente. Está
procurando um pretexto para a quebradeira, e deve ter até ficado feliz
quando encontrou um George Floyd para chamar de seu. Melhor, só se o
marido errático fosse preto retinto, e o segurança fosse um louro.
Paixões e valores
Ainda
que durmamos tranquilamente após um maremoto na Indonésia, temos toda a
certeza de que aquelas vidas todas valem mais do que um dedinho nosso.
Se houvesse um Deus dos mares que suspendesse o maremoto mediante um
dedinho nosso em oferenda, perderíamos o sono e daríamos o dedinho.
Independentemente do nosso estado de espírito, temos valores e
convicções acerca dos quais raciocinamos, e com os quais embasamos os
nossos raciocínios. Assim, embora não fiquemos arrasados com a morte do
“marido errático”, como se fosse um conhecido nosso, temos toda presteza
em admitir que é uma ótima ideia cobrar do Carrefour uma
responsabilidade maior na contratação de seguranças, porque aquilo que
aconteceu é errado. Sai algo de útil da pressão? Não.
Eis
que o representante do Carrefour se defende em idioma progressista,
reconhecendo-se um homem branco opressor e garantindo que vai ampliar a
“diversidade” da empresa (o que, em progressistês, é o mesmo que cota
racial). Então ficamos assim: na próxima vez que morrer alguém espancado
por um segurança despreparado do Carrefour, vamos aferir a quantidade
de melanina. Sendo branco, ok, bota na conta da dívida histórica. Sendo
negro, ao menos ele terá sido morto com “diversidade”. Como
“representatividade” importa, o assassinado ficará muito feliz ao ver
que seu assassino o representa, pois tem uma quantidade satisfatória de
melanina assim como ele. As pessoas serão rotuladas brancas ou negras,
negro mata negro, e branco mata branco. Não é uma beleza? Muito
antirracista e empático!
Enquanto
isso, o Carrefour continua na sua branquitude irremediavelmente
opressora — conformismo é isso — e a ONG do Frei David ganha uma
oportunidade de encher os bolsos. Deixa o Carrefour contratar negros
para matar negros. Se nenhum negro for assassinado, de onde a Educafro
tirará dinheiro? Viva a justiça social!
Efeitos práticos
Não
é necessário ser nenhum Sherlock Holmes, nem doutor em ciências
sociais, para saber que muita morte é causada no Brasil pelas drogas. Há
o drogado que mata por uma ninharia para sustentar o vício, e há um sem
número de guerrilhas urbanas, com facções disputando na bala as bocas
de fumo nas favelas, matando policiais e espalhando balas perdidas.
Tribunal
do tráfico, Estado paralelo, lei do silêncio: tudo isso é conhecido. O
que não é enfatizado é que esse Estado paralelo não é uma democracia. É
uma ditadura. Impõe toque de recolher, controla que entra no território,
oprime o cidadão das favelas. O narcotráfico tem um custo humano
exorbitante.
O
progressista até concorda com isso, mas daí infere que é preciso
descriminalizar todas as drogas, e então, magicamente, o tráfico não
terá mais controle territorial, e escolherá pagar impostos de bom grado.
Isso sem nem mencionarmos que não está ao alcance do Brasil
descriminalizar a cocaína, pois ela é produzida em países onde é ilegal.
Mais em específico, a cocaína e o crack têm sido usados pelo chavismo
para sustentar a sua ditadura.
Podemos
focar na maconha: de fato, é pensável um comércio legal no Brasil,
porque nasce em nosso país e em democracias onde é legalizada. Digamos
que a maconha deva ser legalizada. Ainda assim, o fato incontornável é
que ela é ilegal agora, e que cada centavo gasto com maconha agora
equivale a um centavo dado às ditaduras das favelas. Cadê o amor às
“vidas negras” e à democracia?
O
consumo de carne não é criminalizado, mas um sem-número de
progressistas vira vegano ou vegetariano por razões alegadamente éticas.
Parar de comprar drogas enquanto elas significarem o financiamento do
narcotráfico, porém, está fora de cogitação. Há mais piedade para uma
galinha do que para um favelado.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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