À ‘democracia’ à Alexandre, ‘Il Duce’, só está faltando o óleo de rícino, ironiza Fernão Lara Mesquita no Estadão:
Periodicamente a nossa “democracia” de araque sai do blefe e baixa as
cartas na mesa para repor as coisas nos seus devidos lugares.
A semana que passou foi dessas. Flávio Bolsonaro ganhou habeas corpus
e um dos “foros privilegiados” retroativos a que “tem direito”,
daqueles com garantia de jamais “transitar” o que quer que seja “em
julgado”. O rachador e as rachadinhas foram mantidos como reféns até a
entrega de tudo o que foi negociado em troca do resfriamento do ódio ao
“gabinete do ódio”. Veio como adiantamento a nomeação de um festejado
ministro da Educação “técnico” e “propenso ao diálogo”, isto é, a
respeitar as fronteiras dos territórios ideologicamente ocupados, ainda
que sobre seu currículo pairem dúvidas e estejam sob investigação na sua
gestão no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação escândalos do
calibre da compra de dezenas de milhares de notebooks para escolas de
poucas centenas de alunos e o mais do padrão de “serviço público” que
não abala o nosso “estado democrático de direito”.
De tudo, como sempre, sobrou para o favelão nacional, da parte da
privilegiatura nomeada, os tribunais que agem sem provocação, os
inquéritos secretos, a censura, as prisões por crime de opinião e a lei
de segurança nacional; e da parte da privilegiatura eleita,
possivelmente o fim da presunção de inocência e da liberdade na rede.
Passaremos a andar com a “tornozeleira” da “rastreabilidade” de todas as
mensagens que trocarmos até que as “excelências” que nos roubam com a
lei se certifiquem de que “sua honra” não foi conspurcada por nenhuma
delas.
E para que fique bem claro qual o lugar de cada um na terra de
macunaíma a egrégia corte sem nenhum caráter aproveitou a irrefreada
excitação dos jornais e TVs com a caçada aos “inimigos da democracia”
para desdentar de uma vez por todas a Lei de Responsabilidade Fiscal,
que nos protege, ao proibir definitivamente a redução de jornada e de
salário do funcionalismo, mesmo quando se configurar a incapacidade
aritmética dos governos estaduais de continuar a pagá-los, na mesma
semana em que o Senado aprovou por unanimidade a redução de até 70% dos
salários do setor privado. Traduzido em miúdos, quer dizer que sempre
que bater na arrecadação a miséria que custa a privilegiatura com suas
lagostas e vinhos tetracampeões, a providência será duplicar a
velocidade do distanciamento entre o mundo deles e o nosso pois, à
marcha à ré legalizada para uns virá somar-se a continuação da
aceleração para adiante obrigatória dos outros.
Nada disso demoveu a imprensa nacional de seguir passando adiante do
jeitinho que a recebe dos interessados aquela surradíssima lógica sem
ponto de partida definido que a privilegiatura pode dar-se o luxo de
continuar “vendendo” porque não é dado ao “comprador” recusá-la, agora
sob pena de incorrer em “ato antidemocrático” punível pela “lei de
segurança nacional” como nos velhos tempos. Nada a ver com os “anos de
chumbo”, dirão os “especialistas” amestrados da privilegiatura, pois
sendo “democracia" o que a constituição escrita por eles e para eles diz
que é, pagar o salário impagável com o sangue do favelão nacional
justifica-se pela proteção à “autonomia” das “instituições do estado
democrático de direito”, assim como pôr o País inteiro sob censura é bom
para poupá-lo de enganar-se a si mesmo com fake news. E prenda-se e
arrebente-se quem disser o contrário…
A consequência inevitável é que no jogo que assim se estabelece as
“vitórias” não são fruto do suor investido no trabalho, mas da conquista
do privilégio de estar dispensado de suar. Não há como escapar ao
inferno de penar no favelão nacional “sujeito à lei” de que a
privilegiatura está isenta senão aderindo de corpo e alma ao “Sistema”, o
que instala, desde a base mais chã do tecido social, uma irresistível
força corruptora.
É tudo a mesma mentira. Há democracia quando há representação e
quando os representados mandam nos representantes. O Brasil não é uma
democracia e muito menos representativa. O País Oficial flutua solto no
ar. Não emana do País Real. Não tem com ele senão a relação predatória
que os parasitas estabelecem com os organismos parasitados. A
constituição que o instala e as leis que o regem nunca foram
referendadas pela única fonte de legitimação do poder, são impostas
“debaixo de vara”. Os “partidos políticos” que as escrevem e reescrevem a
gosto, mantidos por impostos, dispensam correligionários que os apoiem e
sustentem. As “eleições” que os reafirmam não consagram candidatos do
povo, chancelam as escolhas dos próprios “escolhidos”. Os mandatos não
pertencem a quem os concede, tornam-se propriedade intransferível de
quem os recebe. Os “fiscais” do poder são nomeados (e desnomeados) pelos
próprios “fiscalizados”…
Esquerda? Direita? Acorda, otário! Voto distrital puro para que fique
absolutamente claro quem, no País Oficial, representa quem no País
Real. Recall para que não haja dúvida sobre qual deles manda. Referendo e
iniciativa para que nós façamos a lei que queremos seguir.
O resto é tapeação. O resto é essa “democracia” à Alexandre, “Il Duce”, à qual só falta o óleo de rícino.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário