Coluna de Carlos Brickmann, com os costumeiros resmungos, publicada nos jornais deste domingo:
A propaganda do Governo Federal diz que o Brasil não pode parar. Mas,
onde deveria estar andando, já que não depende de quarentena, não anda.
O Estado de S. Paulo levantou os dados e mostra que 64% dos recursos
que o Governo Federal anunciou para combater a pandemia são apenas
anúncios. Em muitos casos, o Governo nem enviou as medidas ao Congresso.
Em outros, sem articulação, não conseguiu encaminhar a votação.
Dos R$ 308,9 bilhões prometidos, R$ 197,5 bilhões são só da boca para
fora. Não estão em nenhuma proposta. O que foi feito é o que ajuda
empresas: flexibilização de normas trabalhistas, crédito, adiamento de
tributos. Medidas de proteção às famílias de baixa renda não existem de
fato. São pura fantasia. Houve também auxílio a Estados e municípios. A
única medida de auxílio à baixa renda foi iniciativa do Congresso: um
vale mensal temporário de R$ 600,00 a trabalhadores informais. O Governo
tinha falado em R$ 200,00 - só falado. O Congresso aprovou R$ 500,00 e,
com base numa frase de Bolsonaro, de que R$ 600,00 seriam aceitáveis,
ampliou o vale.
E o superministro Paulo Guedes, do superministério da Economia, saiu
de Brasília (o serviço do hotel estava ruim, explicou) e foi para sua
casa no Rio, onde, segundo disse, trabalha o tempo inteiro, em ligação
total com sua equipe (a que deveria redigir os projetos).
Mas ninguém é de ferro: na quinta, às 17h30, Sua Excelência foi fotografado passeando na orla marítima.
Projetos em quarentena
Lembra do repasse do PIS/Pasep para o FGTS, para permitir novos
saques no Fundo? São R$ 21,5 bilhões. Como o Governo não conseguiu
decidir quem será contemplado, não enviou a medida.
A redução à metade, por três meses, da alíquota dos impostos do
Sistema S, algo como R$ 2,2 bilhões, foi anunciada há uns 15 dias e não
foi proposta.
A antecipação do calendário do abono, R$ 12,8 bilhões, não saiu.
Os R$ 36 bilhões, parcela do seguro-desemprego de quem sofrer redução
de jornada e salário ou suspensão de contrato; o envio de R$ 4,5
bilhões do DPVAT (o seguro que se paga com os impostos do carro) para o
SUS; o repasse de R$ 8 bilhões e o envio de R$ 2,3 bilhões do Censo para
fundos estaduais e municipais de Saúde; os R$ 16 bilhões em quatro
meses para Estados e municípios, compensando perdas de receita; os R$ 2
bilhões para assistência social.
Nada disso se transformou até agora em projeto.
Ação parlamentar
Surpresa das surpresas, quem compensa parte da inatividade do
Executivo é o Congresso. Os R$ 600,00 para trabalhadores sem carteira, a
antecipação de R$ 300,00 para quem espera o Benefício de Prestação
Continuada (BPC), suspensão de dívida de Estados e municípios com bancos
públicos e a União, novas operações de crédito, renegociação de
dívidas, todas as medidas foram incorporadas pelos parlamentares a
projetos já em tramitação e por isso conseguem andar.
Se dependessem do superministro, quando andariam?
Voltando alguns dias
A história do teste para coronavírus do presidente Bolsonaro continua
sem explicação. Seu filho, Eduardo, aquele que fritava hambúrgueres
numa lanchonete que não servia hambúrgueres, foi citado pela Fox News
como fonte da informação de que o presidente tinha testado positivo. Se o
repórter tivesse inventado a notícia, por que citaria Eduardo como
fonte? Só para ser desmentido? E numa rede totalmente favorável a Trump,
logo simpática a Bolsonaro? Não, não deve ter inventado nada, não.
E por que o desmentido? Talvez porque o presidente cultive a imagem
de Superman, o mito que sobreviveu a uma facada, que tem passado de
atleta, que não é vulnerável a doenças e para quem o coronavírus
provocaria só “uma gripinha”. A propósito, por que o Hospital das Forças
Armadas revelou o nome de todos os contaminados na viagem de Bolsonaro
aos Estados Unidos, menos dois? Seria essa revelação a kriptonita do
Superman?
Se Bolsonaro tivesse testado positivo e mentido, não seria problema –
aqui, espera-se que político minta mesmo. Mas juntar-se a seus fãs,
tocando-os, fazendo selfies, isso seria grave. Claro que, se o teste foi
mesmo negativo, esse raciocínio é vão. Mas quem seriam as pessoas
contaminadas que, para o Hospital das Forças Armadas, merecem o sigilo
que os outros não tiveram?
Apoio total
O engenheiro Lucio Ravizza, assíduo leitor desta coluna, pede apoio
ao projeto 646/2020, que transfere para o SUS o bilionário fundo de
campanha eleitoral deste ano – são R$ 2 bilhões, ou mais. “O projeto
deve ser aprovado em regime de urgência. E sugiro que se adiem para 2021
as eleições municipais. Que todos o dinheiro para realizá-las seja
destinado a combater o coronavírus. Podemos suportar mais um ano dos
atuais prefeitos e vereadores, mesmo porque não creio que, trocando
algum dos atuais, teremos melhoras”. Em vez de pagar campanhas, dinheiro
para a Saúde!
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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