É dupla tragédia: na hora de apagar o incêndio, nos obrigam a
explicá-lo, a combater a imagem de poluidores, de réus. Coluna dominical
de Carlos Brickmann:
Bolsonaro conseguiu o impossível: transformar os incêndios que
ocorrem todos os anos na Amazônia numa crise internacional, em que o
Brasil, vítima do fogo, é punido com represálias de importadores, como
se fosse culpado. É dupla tragédia: na hora de apagar o incêndio, nos
obrigam a explicá-lo, a combater a imagem de poluidores, de réus.
Bolsonaro, falando sem parar, se colocou como inimigo do meio-ambiente,
das minorias, até da democracia.
Há incêndios criminosos - há também os naturais, os causados por
descuido, as queimadas para remover resíduos da colheita e preparar a
terra para novo plantio. Criminosos têm de ser capturados e presos (o
Governo demorou a agir); descuidados devem pagar multas altas e
trabalhar na restauração da mata (isso ainda não ocorre). Mas deixar que
tradicionais poluidores nos acusem é consequência de más declarações do
presidente.
O fogo deve acabar logo, com as chuvas. Mas provar aos importadores
que couro não sai da mata, que não há soja sem transporte, que boiada só
existe onde há frigoríficos, sal, vacinas, isso atinge as exportações.
Bolsonaro teria coisas boas a dizer: inflação e juros oficiais baixos,
as reformas que os investidores tanto reclamam estão sendo votadas. Mas
prefere o atrito, o conflito, o desrespeito (como atacar a esposa do
presidente francês por sua aparência física).
Queima a imagem do país. Prejudica o futuro não só de seu Governo, mas também o da população brasileira.
Exemplo vizinho
Há incêndios gigantescos na Amazônia boliviana. Mas deles ninguém
fala: o presidente Evo Morales, que além de não mobilizar o país para
enfrentar os incêndios muda a lei a toda hora para se eternizar no
poder, que preside um grande produtor de drogas, sabe que é hora de
ficar em silêncio.
Um pouco de ação
A má imagem trazida pelo fogo começa a ser combatida. Nove ministros
vão à Amazônia. Bolsonaro marcou reunião com líderes de outros países
amazônicos e conversou com a primeira-ministra alemã Ângela Merkel.
Imagem dos procuradores
O Ministério Público Federal pediu pesquisa à FSB sobre sua imagem.
Há questões sobre MPs estaduais, o STF, a Procuradoria Geral da
República, mulheres, minorias, LGBTS, meio-ambiente, Assessoria de
Imprensa, Informações. Querem saber, sempre, como são vistos pelos
jornalistas.
Lula livre?
A decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, de anular o
julgamento de Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil e da
Petrobras na era PT, provocou um terremoto jurídico. Bendine alegou que
os delatores premiados funcionam, de fato, como auxiliares da acusação;
assim, quem não delatou deve depor por último, podendo responder a todas
as acusações. Por essa tese, o julgamento de Lula deverá também ser
anulado, e ele posto em liberdade.
Mas o ministro Edson Fachin, voto vencido, pediu que as decisões
futuras sejam tomadas por todo o plenário do STF, não só pelos cinco
ministros que formam cada turma. Depende do plenário, pois, aceitar ou
não a tese. Bendine já está solto. Os meios jurídicos se dividiram: de
um lado, a lei não prevê a divisão entre réus delatores e não-delatores;
de outro, como se defender de acusações que só serão feitas mais tarde?
Atenção
O governador de São Paulo, João Doria, busca transferir para seu PSDB
gente importante do esquema Bolsonaro. Conquistou o apoio de Paulo
Marinho, do Rio, em cuja casa operou o QG bolsonarista; e transformou em
tucano o deputado federal Alexandre Frota. Agora, disse a Sergio Moro
que, se sair do Governo Federal, terá espaço no Governo paulista.
Eis o Queiroz!
Há meses desaparecido, Fabrício Queiroz, que foi assessor de gabinete
do deputado estadual (hoje senador) Flávio Bolsonaro, foi achado pela
revista Veja. Estava no café do Hospital Albert Einstein, onde se trata
de câncer. Foi o protagonista de um caso ainda não esclarecido, em que
movimentou quantias que dificilmente poderia ter obtido só com seus
salários. Depositou R$ 24 mil na conta de Michelle, esposa de Bolsonaro.
O Ministério Público supõe que o dinheiro venha de um “rachid”, que
consiste em receber de cada funcionário do gabinete uma parte de seu
salário. Queiroz nada falou a Veja.
O SUS e os remédios
O SUS está passando um recado esquisito à população: é melhor
recorrer à Justiça para receber remédios caros. Medicamentos para a
epilepsia, que atinge uns 2% da população, já deveriam há meses estar na
lista do SUS, e não estão ainda. Mas 90 pacientes que entraram na
Justiça e obrigam o SUS a gastar com eles R$ 100 milhões por ano já
aguardam que o remédio entre na lista, mesmo sem ter ainda cumprido
todas as etapas normais. Tradução: é melhor ir à Justiça do que aguardar
o processo normal do SUS.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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