Após período difícil, analistas apontam suas avaliações para o próximo ano.
Momento será de ‘arrumar a casa’, sem grande expectativa de crescimento.
Como se não bastasse, o Brasil corre o risco de fechar o ano com o pior resultado nas contas públicas da história. Até novembro, a inflação estourou o teto da meta em 12 meses (6,5%) pela quarta vez seguida. Os juros, após um longo ciclo de baixa, voltaram a subir e estão em 11,75%.
O dólar renova máximas em quase 10 anos, fechando perto de R$ 2,70 no início da segunda quinzena de dezembro. Após sucessivos recordes de baixa, a taxa de desemprego parou de cair. A indústria decepcionou, apesar da importante recuperação no terceiro trimestre. Outro pilar do crescimento, o consumo das famílias desacelerou após anos de crescimento.
No cenário internacional, a queda nos preços das matérias-primas (commodities), com a menor demanda da China por estes insumos, não tem favorecido as exportações brasileiras. E o fim dos estímulos monetários nos Estados Unidos, pelo Federal Reserve, devolveu a volatilidade e incerteza a mercados emergentes como o Brasil.
Novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy: ajuste rigoroso para 2015. (Foto: Reprodução Rede Globo)
Por outro lado, a escolha da nova equipe econômica, com Joaquim Levy à
frente do Ministério da Fazenda, foi vista como acertada pelo mercado.
Ainda mais depois que o novo ocupante anunciou um severo ajuste fiscal para o próximo ano,
com cortes de gastos e aumento na arrecadação de impostos, além de uma
meta de superávit primário de 1,2% do PIB, para colocar a "casa em
ordem".Diante deste cenário, pairam dúvidas sobre o rumo da economia em 2015. A condução da nova política econômica será crucial para determinar o reequilíbrio do país, concordam economistas ouvidos pelo G1.
Só não há consenso quanto à eficácia dessa medida para recuperar a saúde da economia. E seu sucesso dependerá de pequenas partes dessa engrenagem, entre elas, as decisões de investimento das empresas, a concessão de crédito pelos bancos e a confiança do consumidor para voltar a injetar dinheiro na economia.
Confira abaixo o que esperam os analistas sobre os principais componentes que definirão o destino da economia brasileira para o próximo ano.
Produto Interno Bruto (PIB)
Com risco de fechar 2014 com uma fraca expansão de 0,2%, o PIB brasileiro, no melhor dos cenários, não deve crescer mais que 1% em 2015, de acordo com os analistas ouvidos pelo G1. Na previsão do mercado sondada pelo BC, a estimativa de expansão da economia para o próximo ano recuou de 0,77% para 0,73%, na segunda redução consecutiva.
O esperado ajuste fiscal e o aumento de impostos, além de um novo ciclo de alta dos juros vão dificultar o crescimento”"
Alessandra Ribeiro
O sócio da Go Associados, Gesner Oliveira, vê uma alta de 1% para o próximo ano, puxada pela recuperação da indústria. “Mas ela vai crescer sobre uma base de comparação reprimida”, pondera.
A economista da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro, espera um PIB ligeiramente melhor em 2015, com alta de 0,9%. “Ainda assim, é muito ruim”, diz. Um cenário moderadamente bom ela só enxerga a partir de 2016, com avanço de 1,6%. “O esperado ajuste fiscal e o aumento de impostos, além de um novo ciclo de alta dos juros, vão dificultar o crescimento”.
Na outra direção, a economista-chefe da Rosenberg Consultores Associados, Thaís Zara, avalia que o PIB ficará estagnado. “Os investimentos serão prejudicados pelas incertezas sobre o abastecimento de água e energia, além dos já conhecidos problemas de competitividade e o menor consumo das famílias”.
Para a analista, o primeiro semestre de 2015 ainda será marcado pelas repercussões de escândalos de corrupção na Petrobras – envolvida na operação Lava Jato da Polícia Federal – o que pode prejudicar o custo de captação das empreiteiras.
Os investimentos devem encolher 5,5% no ano que vem, em função da política fiscal mais rígida e do impacto das denúncias na Petrobras, podendo criar dificuldades para novas concessões, na visão do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. “Isso deve paralisar os investimentos e a própria estatal, que tem peso de 30% na produtividade do país”, analisa.
Na visão do economista, está difícil encontrar algum grande estímulo para o crescimento entre os três principais componentes da demanda, que puxam 80% do PIB. “O consumo das famílias, as exportações e os investimentos não devem ajudar”, conclui Vale.
Inflação
A evolução dos preços ficará ligeiramente acima ou abaixo do teto da meta em 2015, que é de 6,5%. O principal motivo da pressão, concluem os analistas, será o aumento dos preços que foram represados em 2014, como a gasolina, a energia elétrica e o transporte público.
Bandeira, da Órama, acredita que será uma “batalha” manter a inflação abaixo do limite em 2015. “Já iniciaremos o ano com forte pressão inflacionária por causa do aumento na conta de luz e do possível reajuste dos combustíveis”, diz.
Inflação deve ficar próxima do teto da meta em
2015 (Foto: Reprodução/EPTV)
Gesner, da Go Associados, projeta uma inflação de 6,3% em 2015, com o
realinhamento “especialmente em tarifas de transporte urbano e energia,
além de efeitos ainda incertos da desvalorização do real”.2015 (Foto: Reprodução/EPTV)
Alessandra, da Tendências, espera que a alta da energia atinja 18,1% em 2015, enquanto a gasolina pode subir 12% e o transporte público, 9%. “Isso vai reduzir a renda disponível das famílias”.
Para Thaís, da Rosenberg, a desaceleração econômica pode trazer alívio sobre alguns preços, especialmente na área de serviços. “No primeiro semestre, a inflação acumulada em 12 meses pode chegar a bater em 7%, encerrando o ano na casa dos 6,5%”, acredita.
Na avaliação de Vale, da MB Associados, devem ocorrer aumentos graduais ao longo do ano, com uma elevação do IPCA de 6,8% no fim de 2015.
Juros
Em sintonia com o ciclo deste ano, a taxa Selic deve continuar subindo em 2015, mas pode estancar até o fim do ano. A possibilidade de queda é remota, dizem os economistas. Para Alessandra, a taxa subirá para dos atuais 11,75% para 12% no início do ano e ficará neste patamar até dezembro.
A alta da taxa será um fator preponderante para segurar a inflação perto do teto da meta, acredita o sócio da Órama. “Os bancos estarão mais seletivos com o crédito, portanto os juros do mercado também vão se manter altos. Não acho que a Selic terá espaço para cair ao longo do ano”, diz.
Bandeira espera mais duas elevações ao longo do próximo ano, de 0,5 ponto percentual e de 0,25 ponto percentual. Para Gesner, os juros encerrarão 2015 em 12,5% ao ano, “em virtude das pressões inflacionárias”.
Thais, da Rosenberg, concorda com este patamar para o próximo ano. “Após chegar a 12,5%, a taxa ficará estável por algum tempo, à espera de uma política fiscal mais austera, que poderá ajudar a conter a inflação”.
Câmbio
Desde janeiro, o dólar acumula valorização em torno de 17% até o dia 16 de dezembro, quando fechou a R$ 2,7614. E a alta deve persistir em 2015, com a moeda norte-americana batendo até R$ 2,80 no fim do próximo ano, concordam os economistas ouvidos pelo G1.
Dólar (Foto: Peter Fussy/G1)
“As moedas dos países emergentes passam por um movimento de depreciação
com a perspectiva de realinhamento dos preços internacionais de ativos e
com o início da elevação nos juros da economia americana em 2015”,
avalia Gesner.Para Bandeira, da Órama, o dólar pode alcançar o patamar de R$ 2,80 bem antes do que se imagina no próximo ano. “Se algumas medidas do governo mostrarem eficácia, o ponto positivo é que os investidores estrangeiros podem voltar a pensar em investir no Brasil, por estar barato em relação ao dólar”, diz.
Não é difícil imaginar um cenário em que o dólar chegue a R$ 3,20, acredita Vale, da MB Associados, devido à tendência de volatilidade dos mercados. “A situação doméstica complicada e a política monetária nos Estados Unidos em reequilíbrio significa que o câmbio que vai sofrer esses impactos”, diz.
Emprego
Após taxas recordes de ocupação nos últimos anos, o mercado de trabalho deu sinais de desaceleração e deve apresentar piora no próximo ano. Alessandra, da Tendências, projeta um desemprego na faixa de 5,4% para 2015, com expectativa de que “continue piorando um pouco” nos anos seguintes.
Para Vale, os setores de comércio e serviços serão os mais afetados pelos cortes de vagas, afetados pela tendência de encolhimento do consumo no próximo ano. Não só haverá menos vagas, como também a renda do trabalhador deve ficar menor.
Reajustes salariais acima da produtividade deverão ser cada vez menos frequentes"
Gesner Oliveira
Na visão de Bandeira, devem aumentar as tensões sobre os dissídios coletivos, com maior pressão pela recuperação do poder de compra. “Por outro lado, com o baixo desempenho das empresas, não haverá capacidade para assumir esse adicional, criando um possível cabo de guerra entre os grandes setores nas negociações das correções salariais”.
Os primeiros sinais de desaquecimento do mercado de trabalho devem se intensificar ainda mais no próximo ano, considera Thaís. “O rendimento deve crescer menos – mas ainda deve crescer, influenciado pela alta de 2,5% real do salário mínimo –, ao mesmo tempo em que a taxa de desemprego sobe”.
Indústria
Haverá uma recuperação no setor produtivo, mas ela será insuficiente para ser considerada positiva, veem os economistas. “O mercado doméstico tende a continuar com crescimento moderado em virtude do enfraquecimento do mercado de trabalho e da persistência da inflação em níveis relativamente elevados”, diz Gesner.
Analistas esperam recuperação moderada para a indústria em 2015. (Foto: Divulgação/Fiems)
Para o analista da Go Associados, a Argentina, principal destino de nossos produtos manufaturados, dificilmente sairá da atual crise econômica, avalia. “Não se espera uma recuperação substancial da atividade industrial dada a perspectiva para as principais economias do mundo”, completa.
Estimando uma queda de 2,78% na indústria em 2014, Alessandra, da Tendências, vê um ano “um pouco melhor” para a atividade, com alta de 1,5%. “Mas não é suficiente para compensar a perda desse ano”, pondera.
Thais concorda com a tímida expansão em 2015, mas crê que a depreciação do real possa dar alento a alguns setores menos intensivos na importação de insumos, “ainda que seja na competição pelo mercado doméstico, que estará encolhendo”.
Na visão de Vale, da MB, contudo, a indústria deve cair em torno de 2% no próximo ano, com grande peso no setor de petróleo. “Por mais que a produção cresça um pouco mais, vai afetar a capacidade de manutenção das plataformas, o que já impacta na produção industrial como um todo”.
Para o economista, o fato de o setor automotivo continuar em trajetória de queda, sem os estímulos como a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), ajudará esta queda, ao passo que a mineração continuará sofrendo com os baixos preços no mercado internacional.
Contas públicas
Depois de 2014 correr o risco de fechar com déficit primário, o pior resultado da série histórica do BC, o anúncio do ajuste fiscal feito pelo novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, trouxe alívio para o mercado, apesar de ter sido encarado como um “mal necessário”.
Talvez não se consiga alcançar a meta de superávit de 1,2%, mas o patamar de 0,8% para o próximo ano é muito plausíve"
Sérgio Vale
O economista não vê espaço para mais aumento de impostos, embora ele seja necessário para o equilíbrio das contas públicas e maior arrecadação.
Em virtude dos novos ajustes, 2015 será um ano difícil, com dois desafios minando os planos de crescimento, de acordo com Bandeira. Um deles é a redução de custos e, o outro, o aumento da produtividade. Este ajuste trará uma complicação fiscal ruim para as empresas, na opinião de Vale, da MB Associados.
“Talvez não se consiga alcançar a meta de superávit de 1,2%, mas o patamar de 0,8% para o próximo ano é muito plausível”, acredita o analista. Para Vale, sob qualquer ótica, 2015 será um ano complicado, uma vez que ajuste também implica em desaceleração.
“De qualquer maneira que viesse [o ajuste] seria difícil. A questão é saber se ele será suficiente para mudar todo o clima de confiança na economia”, conclui.
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