Cães dormem ao som de Mozart em creche para pets em Brasília

Soneca tem horário marcado e acontece logo depois da 'hora do carinho'.
Fotos dos animais são postadas na internet; mensalidade custa R$ 606.

Isabella Formiga Do G1 DF

Um casal de empresários de Brasília lançou há cinco meses uma creche para atender cães cujos donos não têm tempo para ficar com os animais durante o dia. Os cachorros matriculados tiram sonecas em pequenos colchões em um ambiente escuro e ao som de Mozart. A música clássica é adaptada para cães, com inserções de latidos, miados e assovios humanos.

A dona da creche, Paola Guimarães, brinca com os animais na área de recreação (Foto: Isabella Formiga/G1)

A dona da creche, Paola Guimarães, afirma que além da música deixar os animais relaxados, eles se sentem "menos sozinhos" com os ruídos de natureza ao fundo. Os cachorros têm horários para realizar atividades e ficam em ambientes climatizados. Em uma agenda, os treinadores anotam como foi o dia do animal na creche, que funciona no Sudoeste.

Em cinco meses de negócio, a creche Pookie Pet já tem 11 "alunos" matriculados. O serviço custa R$ 606 por mês para cada cão, mas a empresa oferece outros pacotes. Um dia avulso, por exemplo, custa R$ 70; frequentar a creche duas vezes por semana, R$ 230 mensais. O estabelecimento tem capacidade para atender até 20 cães ao mesmo tempo.

Paola mostra o aparelho que toca música clássica para os
cães durante o banho e tosa (Foto: Isabella Formiga/G1)

A empresa oferece ainda outros serviços para facilitar a vida dos donos dos animais. Por R$ 50, a creche disponibiliza o "dog walker", para aqueles que não têm tempo para passear com os cães durante o dia. Veterinário, banho, e tosa também são oferecidos no local.

Outro serviço é voltado para os casos em que os donos estão em viagem. Um treinador vai duas vezes por dia até o local onde o cão está, durante 20 minutos, para recolher os dejetos do animal, higienizar o ambiente e levar o bicho para passear. O serviço custa R$ 100.

Na creche, os animais seguem uma rotina diária pré-estabelecida. A soneca tem horário marcado e acontece logo depois da "hora do carinho", momento em que treinadores fazem carícias nos animais para ajudá-los a relaxar. A refeição é feita em uma sala exclusiva, e é o único momento em que os cães ficam separados.

A maior parte do tempo é passada na área de recreação. Na pequena sala com tapete colorido, ar-condicionado e muitos brinquedos, dois adestradores se revezam para brincar e divertir os animais com atividades. Os cães também são treinados a obedecer, fazer xixi no lugar certo e a não se agredirem.

Juliana Borges deixa a filhote Audrey duas vezes por semana na creche para cachorros em Brasília (Foto: Isabella Formiga/G1)

Ao fim do dia, o comportamento dos cães é anotado em agendas individuais, que são entregues aos donos dentro de suas respectivas lancheiras. Nelas, os treinadores anotam se o bicho comeu, dormiu, brincou ou se teve algum comportamento atípico.
Para frequentar a creche, os animais passam por uma inspeção. Eles têm de ser castrados, pesar menos de 15 kg, estar com as vacinas em dia e não ter pulgas ou carrapatos. Se tiverem problemas de convívio com outros cães, a creche recomenda sessões de adestramento.
Menos tempo só
A servidora pública Juliana Borges deixa a shitsu Audrey, de seis meses, duas vezes por semana na creche. Ela afirma que quando comprou a cachorra não trabalhava fora o dia inteiro, mas passou a se sentir culpada quando a rotina mudou e Audrey começou a ficar muito tempo só.
"Moro sozinha, não quero deixar ela o dia inteiro em casa. Li sobre a creche e achei a ideia superlegal e interessante. Deixei um dia para tomar banho e vi que eles são supercuidadosos e que realmente compensa."

Juliana disse que notou diferença no comportamento da cachorra. "Antes, ela ficava superagitada, eu tinha que brincar muito quando chegava do trabalho e ela ficava muito carente, querendo muito carinho", disse. "Agora, ela chega em casa, nem me dá atenção e dorme a noite toda."
Para acompanhar o comportamento de Audrey na creche, Juliana checa a agenda da cachorra todos os dias. "É importante saber se ela fez cocô normal, se comeu, não comeu, brincou muito, não brincou, ou se descansou pouco, se chegou muito animada. Chego em casa e olho a agenda", disse. "Quando ela estava trocando os dentes, a creche me avisou. É normal, eles engolem [os dentes] e muitas vezes a gente nem fica sabendo."

A creche também publica fotos dos cães em uma página de uma rede social. "Muitas vezes durante o trabalho entro na internet e vejo a foto dela aqui", disse Juliana. "Me sinto muito confortada."

Adestradores, veterinária e sócios da Pookie Pet trabalham
para deixar os cachorros ativos e saudáveis
(Foto: Isabella Formiga/G1)

Juliana contesta os amigos que dizem que é "frescura" deixar a cachorra em creche. "Se fiz a opção de ter um cachorro, quero dar a melhor condição de vida para ele. Se tenho condição de pagar pelo serviço e de zelar pelo bem estar do animal, por que não?"
Negócio
Os donos do estabelecimento atuam há anos no mercado para cães. Shand Lenim trabalhou durante três anos como veterinário autônomo. A sócia, Paola Guimarães, é formada em design de moda para cães.

A ideia de abrir uma creche exclusiva para cachorros, segundo eles, se deu a partir de uma necessidade pessoal. Paola conta que, quando precisava que alguém levasse o cachorro dela para passear, pagava ao porteiro.

Os sócios pesquisaram durante vários meses o mercado de pet shops no país até montarem um plano de negócio. Segundo eles, as creches para cachorros têm muitos paralelos com creches humanas.

O caráter do cachorro é de natureza não apenas social, mas nômade. Ele precisa de locomoção, de exercício, precisa sentir cheiros e sensações dinâmicas, que façam o cérebro dele funcionar"

Shand Lenim, sócio da creche

Lenim diz que, como veterinário, percebia muitos cães com problemas de ansiedade e apatia por ficarem muito tempo sozinhos. "Muitos passam por um período de solidão de até 15 horas e fazem um ou dois passeios por dia de 15 minutos. Ameniza, mas dificilmente resolve", disse. "É o que geralmente recebemos por aqui."

"O caráter do cachorro é de natureza não apenas social, mas nômade. Ele precisa de locomoção, de exercício, precisa sentir cheiros e sensações dinâmicas, que façam o cérebro dele funcionar", disse.

"Muitos sofrem de apatia, comportamento de ansiedade estereotipado, ficam com ansiedade de separação. Alguns são tão apegados aos donos que ficam com comportamento destrutivo, depressivo ou autodestrutivo, como a lambedura e a automutilação."
Segundo Lenim, muitos cães "aprontam" em casa devido à falta de atividades. "O cachorro, por mais querido, acaba aprontando. Ele fica entediado e vai roer, cavar, desfiar coisas, brincar com o papel higiênico, porque não tem brinquedo, não tem estímulo. O dono repreende e o cachorro entende que brincar é feio, e fica enclausurado, não consegue socializar. Daí fica apático, ocioso, depressivo, não vai querer fazer grandes coisas", diz. "Muitos ficam rabugentos e não querem contato com outros cães."