BLOG ORLANDO TAMBOSI
O Brasil voltou de onde? Seria ótimo se o Brasil viajasse para bem longe e deixasse um pouco os brasileiros em paz. Via Crusoé, a crônica de Ruy Goiaba:
Acho
difícil imaginar um slogan mais irritante para o governo Lula do que
esse “O Brasil voltou!”, escrito com exclamação no site da Secretaria de
Comunicação da Presidência. Os gênios da publicidade governamental não
conseguiram nada melhor do que requentar o lema do “golpista” Michel
Temer? Além disso, voltou de onde? Seria ótimo se o Brasil viajasse para
bem longe e deixasse um pouco os brasileiros em paz. Em vez disso, nas
últimas cinco décadas, todo santo dia eu acordo, lavo o rosto, escovo os
dentes, tomo café (não interajo com nenhum ser vivo antes de estar
devidamente cafeinado) e tristemente constato que continuo cercado de
Bananão por todos os lados.
A
intenção do slogan é óbvia, e aliás está claríssima no site da Secom: o
que voltou foi o Brasil “do cuidado”, “do desenvolvimento”, “do
respeito”, “do diálogo” etc. São os petistas se apresentando como
ursinhos carinhosos, coisa que o modus operandi do partido desmente há
mais de 40 anos: fica fácil quando o sarrafo é tão baixo quanto os
quatro anos da suposta gestão de Jair Bolsonaro. Assim: não deveria ser
necessário dizer que é de bom-tom não matar índio, não tocar fogo na
floresta, não socar cloroquina em gente com Covid, essas coisas. É o
básico do básico, e eu fico curioso para saber até quando o governo Lula
apresentará como grande qualidade “pelo menos a gente não é o
Bolsonaro” — e olhem que nem o Jair conseguiu produzir uma idiotice no
nível de dizer que a Ucrânia, o país invadido, é tão culpada pela guerra
quanto os invasores russos.
O
fato é que Bolsonaro é brasileiríssimo — e não só porque, mesmo
perdendo a eleição, recebeu 58 milhões de votos. Não é um desvio de
rota: o governo dele foi consequência, não causa, e toda a barbárie que
lhe é associada tem raízes antigas na sociedade brasileira. Lula,
evidentemente, também é brasileiro até dizer chega, e essas duas coisas
juntas são um bom retrato da nossa tragédia. Não tenho mais paciência
para gente dizendo a sério que “o verdadeiro Brasil” está, sei lá, na
prosa de Machado de Assis ou na poesia de João Cabral de Melo Neto. O
verdadeiro Brasil é uma pocilga, dentro da qual esses dois (e outros)
são exceções luminosas. Claro, é a nossa pocilga, e milhões de
brasileiros trabalham o dia inteiro para ter ao menos um chiqueiro
ajeitadinho. Raramente conseguem.
Enquanto
a gente não pode mandar o Brasil comprar cigarros e não voltar nunca
mais, vamos todos matar a saudade do que sempre foi: presidente da
Petrobras reclamando de sua “máquina de proibir coisas” — que só existe
porque o PT e seus aliados fizeram uma farra na estatal —, sindicalistas
ligados ao partido assumindo os fundos de pensão dos Correios e do BB e
Jorge Viana mudando o estatuto da Apex para poder assumir o cargo sem
falar inglês, além de empregar na agência promotora de exportações
amigos como um cantor e um mochileiro: the cabide de emprego is on the
table. Tá bom, o eleitor brasileiro escolheu isso aí mesmo, vamos nessa.
Só sugiro incluir no slogan algo que já deveria ter substituído o
“ordem e progresso” faz tempo: o Brasil voltou, cuidado com bolsas e
carteiras. Ou “crime ocorre, nada acontece, feijoada”. Ou “7 a 1 foi
pouco”.
***
A GOIABICE DA SEMANA
O
melhor do Brasil talvez seja a criatividade onomástica do brasileiro:
gosto de gente ousada que, em vez de simplesmente batizar o filho como
Enzo Gabriel ou Kauã Felipe, dá asas à sua imaginação sem medo de ser
vítima de parricídio ou matricídio (o que talvez seja justificado em
alguns casos). Imaginem minha alegria quando, alertado por um amigo,
soube que o superintendente do Incra em Minas Gerais se chama
Batmaisterson Schmidt, certamente por culpa da série americana Bat
Masterson, popularíssima no Brasil dos anos 60. O que dá aquele toque de
brasilidade é justamente o erro na grafia do nome, como no caso do
falecido delegado Hitler Mussoline ou da legião de jogadores chamados
Maicon. Aliás, prevejo para breve um surto de Riquelmes (Ryquelmes,
Rikelmys) no futebol do Bananão — nenhum deles jogando a bola que Juan
Román jogava.
O ex-jogador argentino Juan Román Riquelme, que inspira nomes errados no Brasil
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi
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