Empresários demonstram receio em contratar jovens que possam representar um passivo trabalhista por causa de uma piada ou palavra “errada”. Paulo Polzonoff para a Gazeta do Povo:
Sejamos
generosos. Generosos ao extremo, talvez. A decisão do STF que equiparou
a homofobia ao racismo tem seu quê de boa intenção. A ideia é proteger
uma minoria historicamente oprimida. E ruidosa. E cuja causa há não
muito tempo contava com a simpatia da população. Oquei. Apesar das
discordâncias, ninguém quer ver um homossexual submetido a qualquer tipo
de violência – por ser homossexual ou por qualquer outro motivo.
Mas
o Supremo talvez tenha exagerado na dose. E, como sempre acontece
nesses casos, uma decisão bem-intencionada, mas baseada em premissas e
estatísticas duvidosas, quando não falsas, prejudica justamente aqueles
que tenta proteger. A realidade, quando confrontada com esse tipo de
situação, tende a se impor. Para além da crença positivista no poder da
lei para moldar a sociedade.
Sinal
disso foi uma conversa que tive com alguns empresários recentemente. Um
grupo bastante heterogêneo. Tem até petista no meio. E, pasmem!, tem
até homossexual. Entre canapés e taças de vinho (eu bebia água porque
estava dirigindo), entre risadas e algumas conversas que ameaçavam se
transformar em discórdia, mas sempre acabavam em abraços ou num educado
“com licença, preciso ver se estou na esquina”, falávamos da dificuldade
de se conseguir mão de obra em algumas áreas. Ou melhor, eles falavam e
eu ouvia.
Um
xará cujo sobrenome evidentemente não mencionarei estava revoltado não
só com a decisão do STF, mas também com a própria virulência dos grupos
identitários. Antes de explicar por que não contratava nenhuma pessoa
que pudesse parecer militante identitário, ele contou que, em plena
década de 1980, se recusou a demitir um funcionário “acusado” pelos
demais colegas de ser portador do HIV.
Temeroso
de ser confundido com um homofóbico de verdade, agora o xará se recusa a
contratar pessoas que ele vê como “passivos jurídicos ambulantes”. Ou
seja, pessoas cuja postura vitimista e beligerante na vida privada
possam representar alguma ameaça à segurança jurídica e financeira da
empresa. “É uma pena”, conclui o pesaroso xará que enfrenta dificuldades
para contratar jovens.
Na
mesma roda de conversa, F., também empresário, mas assumidamente
petista, diz que infelizmente não dá oportunidade a jovens gays e que vê
com receio a contratação de jovens negros. Nada a ver com a orientação
sexual ou a raça, garante ele, e não tenho por que duvidar. Afinal, F. é
gay e negro e tem umas histórias bem pesadas para contar sobre o que
passou quando mais jovem.
A
justificativa é a mesma do xará: passivos jurídicos ambulantes. Pessoas
que têm o potencial de recorrer à justiça ou, pior!, ao justiçamento
das redes sociais por causa de uma piada, de uma palavra ou uma ordem
dada num tom que o funcionário pode considerar ofensivo à sua orientação
sexual, raça ou preferências políticas. Quando alguém contra-argumentou
que bastava evitar piadas ou cuidar do tom de voz, optando pelo
silêncio eficiente ou pela objetividade profissionalíssima de um e-mail,
F. explicou que na prática a teoria é outra. “A queda na produtividade
dos outros funcionários, trabalhando num ambiente hostil e de silêncio
imposto, não compensa. A conta simplesmente não fecha”, explicou F.
Mas
não é só o identitarismo progressista que prejudica os que procuram
emprego. No atual cenário de polarização política, os empresários têm
evitado também a contratação de bolsonaristas e petistas convictos.
“Isso afeta o trabalho em equipe. Não quero pessoas que se odeiam por
política envolvidas num mesmo projeto”, me disse outro empresário cuja
inicial vou ficar devendo porque não o conheço e, quando fui perguntar,
ele já tinha ido embora.
Sem
querer ser mais chato do que sou, perguntei aos empresários qual seria a
solução para este nó górdio. A improvável reversão da trapalhada
suprema ajudaria, mas não resolveria um problema que é de ordem
individual. “Essa geração vai ter que entender que não é o centro do
Universo”, disse o xará. Que, por sinal, é mais velho e adora falar que
essa geração isso, essa geração aquilo. F. vê a solução no que chama de
“politização comedida”: a capacidade de ter uma postura ideológica sem
politizar e/ou judicializar todos os aspectos da vida. Ou seja, nada que
possa ser feito de um dia para o outro ou resolvido por meio de uma
canetada.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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