MEDIÇÃO DE TERRA

MEDIÇÃO DE TERRA
MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 29 de agosto de 2021

O "cancelamento" da iniciativa privada

 



Pedido de indenização de R$ 10 milhões feito por ONGs à XP Investimentos indica ofensiva cada vez mais crescente contra empresas. Cristyan Costa para a Oeste:


Justiça do Trabalho notifica Globo por falta de negros em novela e recomenda mudanças depois de pressão de ONGs.” “Movimentos processam empresa que preferia ‘hétero e magro’ para vaga de garçom.” “Coletivo LGBT+ vai à Justiça contra a CBF por explicações para a falta da camisa 24 e sinaliza pedido de indenização.” Essas manchetes circularam recentemente pelo noticiário brasileiro. Em alguns casos, chamam atenção os pedidos de reparação financeira em detrimento de programas corporativos que possam minimizar o problema que os militantes enxergam nas empresas.

Nesta semana, foi a vez de um gigante do mercado financeiro se tornar alvo de ataques. A juíza Julieta Pinheiro Neta, titular da 25ª Vara do Trabalho de Porto Alegre (RS), acatou uma ação civil pública movida pelas ONGs Educafro, Frente Nacional Antirracista, Visibilidade Feminina e Centro Santos Dias de Direitos Humanos contra a XP Investimentos e o Ávila Associados, escritório credenciado da corretora na capital gaúcha. O motivo: “falta de diversidade” no quadro de funcionários do grupo econômico.

Tudo começou após o Ávila publicar no LinkedIn uma imagem mostrando cerca de 100 de seus colaboradores. A publicação foi prontamente “cancelada” com críticas de racismo, misoginia, homofobia e preconceito contra idosos e deficientes, porque a maioria dos funcionários é de homens, brancos e “héteros” — fora os ataques pelo “não uso de máscaras e aglomeração”. Os movimentos pediram indenização de R$ 10 milhões por danos social e moral.

Caso vença, o advogado das ONGs, Marlon Reis, disse que o montante milionário será destinado ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública e à Secretaria Nacional do Consumidor. A gestão desse fundo é feita por um conselho composto de “representantes da sociedade”, responsáveis por selecionar projetos que serão financiados com os recursos. “Mas existe a possibilidade de se discutir também na Justiça a destinação para finalidades específicas”, informou Reis, em nota, sem dar detalhes.

Em segundo plano, as ONGs pediram “medidas energéticas” para o enfrentamento do que classificaram de “preconceito estrutural”.

Os coletivos de esquerda exigiram, entre outras reivindicações: 1) que a composição do quadro de contratados, permanentes ou temporários, tenha a mesma proporção de negros, mulheres e indígenas presentes na sociedade brasileira; 2) cotas para idosos e pessoas com deficiência; 3) prazo de 90 dias para apresentação de um plano de diversificação do quadro de colaboradores; 4) as empresas terão de incorporar ao conselho de administração quatro novos membros, integrantes das “comunidades sub-representadas”; 5) a disponibilização de cursos gratuitos e estágios remunerados para promover a formação e a experiência profissional desses colaboradores.

Por fim, as ONGs vão além e pedem que o Poder Judiciário estipule medidas para evitar que a política de contratação das empresas seja “excludente e discriminatória”, com um “plano de não discriminação” para evitar ocorrências similares no futuro. Em nota, a XP informou que tem ações de inclusão de pessoas negras na empresa. Ressaltou ainda que, no passado, estipulou metas internas para aumentar a contratação, em todos os cargos, de “pessoas negras, mulheres, LGBTQIA+ e deficientes”. Desde 2020, a corretora lidera um programa de inclusão de gays e mulheres na empresa.

Argumentação fraca e excesso de reparação

No processo, as ONGs sustentam que a postagem do Ávila viola tratados internacionais e vira as costas para um passado escravagista, além de remeter ao livro Admirável Mundo Novo. Escrito por Aldous Huxley, a obra antevê a formação de uma sociedade baseada em “clones, todos físico e psiquicamente idênticos, preparados para seguir um pensamento monolítico e para reproduzir mecanicamente atribuições definidas por superiores desconhecidos”.

Adiante, as ONGs citam a “eugenia” que ocorreu na Alemanha e argumentam que “a equipe de colaboradores da referida empresa reproduz um padrão nada natural”.

Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito público administrativo pela FGV, afirma que é direito das ONGs apresentarem motivos para insatisfações de seus representados, mas vê fragilidade nos elementos expostos. “São argumentos precários”, disse a jurista, ao mencionar que apenas um processo de investigação maior pode constatar se a empresa realmente tem políticas deliberadas de preconceito, o que daria mais força para o processo.

“É preciso atestar se houve vontade de excluir negros, mulheres, gays ou deficientes”, explicou. “A Justiça do Trabalho pode enviar pessoas que tomarão depoimentos de funcionários e diretores da empresa. Dessa forma, será capaz de dar um diagnóstico mais completo.” A especialista salientou que, antes de o processo ser movido, as ONGs poderiam ter procurado a XP e tentado um acordo.

O advogado Felipe Camargo de Araújo, do escritório Montgomery & Associados, vai na mesma linha e avalia que a ação carece de substância. “As ONGs se basearam em apenas uma foto”, disse. “Não sabemos se todos os profissionais estavam ali para dizer se há discriminação.” Para ele, as empresas têm o direito de contratar quem quiserem. “Se a companhia adota uma prática discriminatória evidentemente comprovada, aí é outro problema. Não podemos dizer quem a empresa deve ou não admitir, salvo as exceções legais para pessoas com deficiência e mulheres em cargos políticos.”

O valor pedido pelas ONGs é questionado por Eli Alves da Silva, advogado especialista em Direito empresarial. “Considero algo exagerado”, afirmou. “A rigor, não existe um tabelamento que fixe um dano moral coletivo. Por que não R$ 10 mil, por exemplo? Ou, quem sabe, R$ 500 milhões? Me parece uma tentativa de dar mais repercussão para o assunto.”

Citado na ação, Aldous Huxley afirma em O Admirável Mundo Novo que não basta que palavras sejam boas, é preciso que o que delas se faz também seja bom. Qualquer semelhança com o processo movido contra a XP não é mera coincidência.
 
BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

Nenhum comentário:

Postar um comentário