O fato é que a dublagem brasileira do fascismo tem sido ainda mais ridícula que a clássica pose de Benito Mussolini com as mãos na cintura — e mais que a tradução original, os integralistas de Plínio Salgado, também conhecidos como galinhas-verdes. Ruy Goiaba para a Crusoé:
Tenho
uma teoria nova: toda ideia que vem do exterior só circula pelo Brasil
depois de ser dublada em português (“versão brasileira, Herbert
Richers”, “estúdios Álamo” ou “Dublasom Guanabara”). Como na dublagem de
verdade, existem versões melhores e piores — nas piores, a tradução é
tosca, o som parece gravado dentro de um barril e não há sincronização
entre a pessoa que fala e aquilo que está sendo dito: o resultado é mais
ou menos aquilo que o Roberto Schwarz chamou de “ideias fora do lugar”.
As melhores, por sua vez, podem até incluir coisas que não estão no
texto original e saírem melhores que ele. Ou, pelo menos, mais com
aquele gostinho de Brasil (água com geosmina).
Millôr
Fernandes, por exemplo, dublou brilhantemente Samuel Johnson quando
acrescentou à frase “o patriotismo é o último refúgio do canalha” o seu
P.S. de Irritante Guru do Méier (“no Brasil, é o primeiro”). Acrescento,
modestamente, que já passou da hora de fazer uma “transcriação” da
passagem mais famosa de Marx em O 18 Brumário de Luís Bonaparte para
torná-la mais adequada ao Bananão destes tempos: “Todos os fatos e
personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por
assim dizer, duas vezes. (…) A primeira vez como tragédia, a segunda vez
como Escolinha do Professor Raimundo”.
Todos
os analistas políticos que condenam as ameaças de Jair Bolsonaro e seu
rebanho ao STF e ao Congresso têm se esquecido de um ponto fundamental.
Não é apenas o risco de ruptura institucional: é o supremo vexame de um
eventual golpe de Estado liderado por Sérgio Reis, Paulo Cintura e
Batoré d’A Praça É Nossa. Consegue ser ainda pior que o general aloprado
Olympio Mourão Filho, em 1964, colocando os tanques na rua antes da
hora combinada. Parece que a intenção desses luminares do pensamento
brasileiro é, no 7 de Setembro, promover uma espécie de A Praça dos Três
Poderes é Nossa, com Bolsonaro fazendo arminha no banco habitualmente
ocupado por Cazalbé de Nóbrega.
O
fato é que a dublagem brasileira do fascismo tem sido ainda mais
ridícula que a clássica pose de Benito Mussolini com as mãos na cintura —
e mais que a tradução original, os integralistas de Plínio Salgado,
também conhecidos como galinhas-verdes. É um fascismo com bordões de
programa humorístico ruim de bônus (“issa!”, “ah, para, ô!”,
“talquei?”). Não dá nem pra dizer algo do tipo “ah, puxa vida, eles
prendem e matam, mas pelo menos os trens chegam no horário”; se isso não
era verdade nem na Itália, que dirá neste Brasil brasileiro, terra
natal da esculhambação. Quando a tal ala ideológica desse governo
bradava contra o “globalismo”, eu não imaginava a que ponto eles
promoveriam o SBTismo como estética oficial e transformariam cada fala,
cada gesto em performance para os malucos das redes sociais e os idiotas
do WhatsApp. Governar para o país que existe para além da claque do
cercadinho? Dá trabalho demais, Deus me livre.
(Aí,
do outro lado, a “opção” é aquele pessoal que passou os últimos dias
babando pela foto da coxa do Lula. Entre o fascismo A Praça É Nossa e o
pornô gay petista, quem leva ferro — em bom português, sem dublagem — é
você.)
***
A GOIABICE DA SEMANA
Paulo
Guedes parece mais decidido do que nunca a encarnar o estereótipo do
economista que só conhece pobre de assistir às novelas do Manoel Carlos.
As últimas do ministro da Economia, que as redes estão chamando de
Chicago Antibes, foram dizer que a inflação — que neste ano deve ficar
bem acima do teto da meta e ser a pior desde o governo Dilma Rousseff —
está “dentro do jogo” e perguntar “qual o problema de a energia ficar um
pouco mais cara?”.
Guedes
se mudou de mala e cuia para o universo das vozes na cabeça dele. Quem
dera nós outros pudéssemos morar na Guedeslândia, essa terra da qual
jorram leite e mel, onde a economia está “bombando” (ou “furando as
ondas”) e as empregadas domésticas conhecem o seu lugar e não ficam se
metendo a querer ir para a Disney. (Dizem que essa terra já existe e se
chama Leblon.)
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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