Enquanto
os líderes mundiais lançavam um comunicado considerando a pandemia o
maior problema da humanidade desde a 2.ª Guerra, aqui, no Brasil,
Bolsonaro quis dar um golpe para evitar o combate eficaz contra o
coronavírus. Esta é a leitura que faço dos episódios da semana.
Bolsonaro
pressionou o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, não apenas para
demitir o comandante do Exército, mas para ter condições de neutralizar
pela força as medidas restritivas que os governadores impuseram em seus
Estados para salvar vidas.
Com
a demissão do ministro, os comandantes das três Armas renunciaram em
protesto contra Bolsonaro. E ficou evidente ali que o Exército não se
lançaria na aventura de Bolsonaro, que, em nome da economia, tinha o
potencial de matar mais ainda uma população já devastada pelo
coronavírus.
A
divergência entre a visão do Exército e a de Bolsonaro sobre a pandemia
ficou evidente na véspera da demissão do ministro Fernando Azevedo, que
ao sair se limitou a dizer que manteve a instituição militar como força
do Estado, e não de um governo.
Em
entrevista ao Correio Brasiliense, o general Paulo Sérgio, diretor do
Departamento de Pessoal do Exército, mostrou como a instituição
atravessou a pandemia, obedecendo os mais estritos protocolos de
segurança. Previdente, como, aliás, o são todos os governos do mundo, o
Exército já se preparava para uma terceira onda. O saldo do combate, na
proteção de 700 mil pessoas sob sua influência, foi muito positivo.
Basta comparar o índice de mortalidade na Força, que foi de 0,13%, com o
do Brasil, 2,5%.
Apesar
de ter processado milhares de comprimidos de hidroxicloroquina em seus
laboratórios, por influência de Bolsonaro, o Exército internamente
comportou-se como grande parte da humanidade, tentando seguir protocolos
de segurança. Houve também a passagem desastrosa do general Pazuello
pelo Ministério da Saúde. Mas no seu pronunciamento o comandante Edson
Pujol ressaltou que a ida de militares para o governo era uma escolha
pessoal.
A
posição de Pujol a respeito da pandemia pareceu inequívoca no seu
documentado encontro com Bolsonaro em Porto Alegre. Bolsonaro estendeu a
mão, Pujol ofereceu o cotovelo, que é o tipo de saudação recomendado
pela OMS.
Lembro-me,
naquele momento, de que escrevi sobre as ligações originárias das
Forças Armadas com o positivismo, o que deve ter despertado nos
militares não só um respeito, mas também uma disposição de associar seu
trabalho à ciência.
Felizmente,
a tentativa de envolver os militares na aventura macabra de sabotar
pela força as medidas contra a pandemia fracassou. Mas Bolsonaro tinha
um plano B.
Ele
sabe que a instituição é mais sólida do que as PMs e logo em seguida
pôs o plano em prática. Por intermédio de um deputado, tentou aprovar
com urgência um projeto de mobilização nacional, que lhe daria controle
de todas as PMs do Brasil. Tudo indica que ele busca desesperadamente
uma força militar para impor suas ideias acerca da pandemia, uma força
de intimidação dos adversários ancorados no bom senso.
Fora
essa tentativa desastrada de dar um golpe para aplicar sua política de
morte, Bolsonaro fez uma minirreforma ministerial, que apenas colocou o
Centrão dentro do palácio, com a chave do cofre, e renovou algumas
indicações familiares para cargos decisivos, como, por exemplo, o
Ministério das Relações Exteriores. Poucos se lembram de que o início da
crise era a pressão do Senado para derrubar o pior chanceler da nossa
História, Ernesto Araújo.
Araújo
apenas teorizava as ideias toscas de Bolsonaro com tintas de Steve
Bannon, Olavo de Carvalho e da própria Alt Right americana. O foco do
nosso isolamento internacional, diria mesmo de nossa vergonha, é o
comportamento do presidente Bolsonaro, que fez do Brasil uma ameaça
internacional, pela destruição ambiental e pela tragédia sanitária.
Ao
escolher um modesto diplomata, que jamais ocupou uma embaixada,
Bolsonaro quer mantê-lo agradecido pelo cargo e aberto à sua influência –
mais precisamente, à influência do filho Eduardo, um dos grandes
artífices da nossa destruidora política externa.
Bolsonaro
enfrenta essa crise profunda num momento em que as próprias condições
de governabilidade se diluem. Uma clara demonstração disso foi o
Orçamento aprovado no Congresso. Sempre se diz que o Orçamento no Brasil
é uma peça de ficção. Mas este, que foi aprovado com uma hipertrofia
dos gastos militares, talvez esteja mais para um filme de horror.
Não
se trata apenas de governabilidade num momento qualquer, mas durante
uma pandemia de que o Brasil é o epicentro mundial, campeão indiscutível
em número de mortos.
Um
presidente incapaz, entregue no campo político à voracidade dos seus
aliados do Centrão, buscando de todas as maneiras sabotar a luta contra a
pandemia – tudo isso compõe um cenário desolador, sobretudo porque a
sociedade está reduzida, no momento, a protestos virtuais.
Cedo ou tarde, julgaremos Bolsonaro.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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