Somando os já infectados aos já vacinados, é possível estimar quando São Paulo atingirá a imunidade, escreve Fernando Reinach no Estadão:
Em janeiro de 2021 quase 30% da população da cidade de São Paulo já havia sido infectada pelo vírus Sars-CoV-2 (www.monitoramentocovid19.org).
Na coleta que se inicia semana que vem teremos este número atualizado.
Não é difícil de imaginar que ele pode estar se aproximando dos 45%.
Isto é importante pois, agora, um estudo feito na Inglaterra demonstrou
que pessoas já infectadas pelo vírus estão protegidas de uma nova
infecção.
Essas
pessoas têm um risco 84% menor de serem infectadas novamente quando
comparadas com pessoas que não foram infectadas. Esse nível de proteção é
equivalente ao obtido com o uso das vacinas.
Em
março de 2020, quando planejamos o estudo, ainda não existiam vacinas e
acreditávamos que monitorando o número de infectados ao longo do tempo
teríamos uma ideia do número de pessoas já resistentes ao vírus. Isto
porque na maioria das infecções virais as pessoas desenvolvem algum
nível de resistência a uma nova infecção.
O
problema é que essa hipótese ainda não havia sido demonstrada para o
Sars-CoV-2. Durante este último ano muitas dúvidas foram levantadas a
respeito dessa hipótese: testes de baixa qualidade indicavam que a
quantidade de anticorpos baixava rapidamente, começaram a surgir casos
esporádicos de reinfecção e, mais recentemente, surgiu a possibilidade
de as novas variedades do vírus serem capazes de escapar totalmente
dessa proteção. Grande parte desses argumentos foi por água abaixo com
as conclusões do estudo agora publicado.
Foram
recrutados 26.661 voluntários entre trabalhadores da saúde na
Inglaterra, sendo que 86% deles lidavam diretamente com pacientes de
covid-19. Desse grupo, 17.383 ainda não haviam sido infectados pelo
Sars-CoV-2 com base em testes que detectavam anticorpos contra o vírus; e
8.278 haviam contraído o vírus e se curado.
O
recrutamento acabou no início da segunda onda na Inglaterra, em 31 de
dezembro de 2020, provocada pela nova variante. Os voluntários foram
monitorados até o início de fevereiro deste ano. Os cientistas mediram
quão mais frequente era a infecção por Sars-CoV-2 nas pessoas que ainda
não haviam sido infectadas, quando comparadas com as pessoas que já
haviam sido infectadas.
Foram
observadas 7,6 reinfecções para cada 100 mil pessoas entre os que
possuíam anticorpos (os já infectados e curados) e 57,3 infecções por
100 mil pessoas entre os que ainda não haviam sido infectados; um número
7,6 vezes maior. A partir desses dados foi possível determinar que uma
infecção prévia diminui o risco de contrair a doença em 84%. Essa
proteção dura seguramente mais de sete meses.
Esses
resultados demonstram que ser infectado pelo Sars-CoV-2 protege as
pessoas de nova infecção, da mesma forma que as melhores vacinas. É
claro que as pessoas que foram infectadas correram o risco de morrer ou
ter sequelas, o que não existe com as pessoas que foram vacinadas.
Também ainda é possível que essa proteção pode vir a ser menor frente a
outras variedades, mas tudo indica que parte dessa proteção é duradoura.
Esse
resultado demonstra que provavelmente 30% da população de São Paulo já
está protegida, ao menos parcialmente, de uma nova infecção. Como a
fração da população infectada na cidade está crescendo rapidamente, é
muito provável que nos próximos meses mais pessoas estarão protegidas
por uma infecção anterior do que pelas vacinas.
A
comprovação de que pessoas infectadas se tornam resistentes comprova
nossa hipótese inicial, de que medindo o número de infectados, e somando
esse número aos vacinados, talvez seja possível estimar quando
atingiremos o nível de imunidade coletiva necessária para controlar a
pandemia em São Paulo.
MAIS
INFORMAÇÕES: SARS-COV-2 INFECTION RATES OF ANTIBODY-POSITIVE COMPARED
WITH ANTIBODY-NEGATIVE HEALTH-CARE WORKERS IN ENGLAND: A LARGE,
MULTICENTRE, PROSPECTIVE COHORT STUDY (SIREN). LANCET
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(21)00675-9 (2021)
*
É BIÓLOGO, PHD EM BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR PELA CORNELL UNIVERSITY E
AUTOR DE A CHEGADA DO NOVO CORONAVÍRUS NO BRASIL; FOLHA DE LÓTUS,
ESCORREGADOR DE MOSQUITO; E A LONGA MARCHA DOS GRILOS CANIBAIS
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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