A inconsistência é a norma no caso do conhecimento de fato acumulado até agora sobre o coronavírus. Luiz Felipe Pondé, via FSP:
Ninguém sabe nada sobre esse vírus. Essa frase vem à cabeça de qualquer um que preste atenção a muito do que trafega pelas mídias desde o início dessa pandemia.
O ceticismo é uma tradição grega. Sextus Empiricus (séculos 2 e 3
d.C.) era médico e filósofo, e representa um tipo de ceticismo baseado
na percepção de que as contradições teóricas tendem a expor as
inconsistências das mesmas. O ceticismo é a ruína da crença no
conhecimento e por isso, muitas vezes, associa-se o ceticismo ao
niilismo.
Sua prática era conhecida como empírica e se caracterizava pela
dúvida em relação às disputas entre as teorias médicas de então (que
hoje seriam objeto de escárnio) e pela aplicação estrita do que hoje
seria chamado de protocolos bem-sucedidos no cotidiano.
À época, um médico empírico aplicaria o que sempre funcionou para um
caso específico, tipo vômitos e diarreias, sem se perguntar a razão do
sintoma. A anamnese iria na direção de saber coisas como o que o
paciente fez antes, o que comeu e bebeu, se isso já aconteceu
várias vezes, a que horas do dia costumavam ocorrer esses eventos. E
aplicaria tratamentos que funcionaram em casos semelhantes.
Dessa medicina brotou um tipo de ceticismo que observa as diversas
teorias, analisa suas contradições, e opta por procedimentos que sempre
deram bons resultados no caso em questão.
Voltemos aos dias atuais. Não fosse pela quase memória nula da
maioria das pessoas, a ciência sairia chamuscada dessa pandemia, e
teríamos um surto de ceticismo.
É claro que entender o que está¡ acontecendo hoje é como aprender o
mecanismo de uma nova turbina de um avião em velocidade de cruzeiro.
Mas, as pessoas que ouvem o que os especialistas em pandemias falam,
tomam cada palavra como um prêmio Nobel, quando, na verdade, a
inconsistência é a norma no caso do conhecimento de fato acumulado
até agora.
Há um outro aspecto envolvido na comunicação de qualquer coisa
relacionada à pandemia: o aspecto pedagógico. Se alguém disser que furar
um olho diminui o risco de contágio, as pessoas farão fila pedindo ao
farmacêutico para furar seus olhos. Por isso, todo cuidado é pouco.
Exemplos de vaivém. Pisar no chão já foi um risco monstruoso.
Informações cientificas de ocasião afirmavam que o vírus sobrevivia em
toda superfície entre uma hora e 72 dias. Comer frutas lavadas não
bastavam, lavá-las com Pinho Sol seria o mais seguro. Pisar na rua seria
quase mortal: o apocalipse zumbi finalmente aconteceu. A OMS faz parte
do circo: hoje medicamento X não vale, amanhã vale. E atenção: respirar
pode fazer mal à saúde! Quanto à sobrevivência do vírus no ar, a
possibilidade é de algo entre duas horas e 30 dias.
A ciência sempre foi controversa, mas a sensibilidade social tem
vocação a buscar certezas, logo, a paciência é zero pra esse vaivém. O
que eu quero saber é se posso andar de elevador e pronto! Se tiver que
sair, devo comprar pela Amazon a roupa com que os astronautas foram à
Lua?
Não há nenhuma certeza sobre os dados em jogo. Os modelos, portanto,
são vagos. Fala-se em aumento de casos aqui, queda ali. O Brasil é
segundo lugar aqui e sexto ali. Há subnotificação de casos aqui e ali.
Um dia milhões morreriam, inclusive no Brasil, agora milhares já morreram. Mas, calma! Muitos ainda podem morrer.
Paéses modelos não estão usando máscaras ou apenas usam em locais
fechados. Terá isso a ver com a imunidade de rebanho? Impossível:
confinamento atrasa a imunidade
de rebanho. Ou terá a ver com a eliminação do vírus via testagem e
isolamento vertical? Tem países isolando bairros periféricos pra impedir
que pobres contaminem ricos? Alguém sabe dizer algo de definitivo sobre
a fisiopatologia do vírus?
E afinal, como anda a pandemia na África? Será¡ que a onda de
antirracismo vai tirar a África da invisibilidade epidemiológica de
sempre? Duvido. Derrubar estátuas é hobby de riquinho. O mundo é um
circo.
E alguém pergunta: afinal, por que confinar? Resposta caótica: porque
sempre se fez isso na história da humanidade e, aparentemente, ajuda a
diminuir o contágio.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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