MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sábado, 27 de outubro de 2018

Suásticas, bombas caseiras e até antraz: fantasia e realidade.


Mandar correspondência explosiva para notórios inimigos de Trump é coisa de idiota; mas não faltam idiotas no mundo. E falsificadores também. Texto de Vilma Gryzinski, via Veja:


Quanto tempo a polícia americana vai levar para rastrear quem mandou cartas-bomba para conhecidos desafetos de Donald Trump?

Normalmente, seria muito pouco tempo. Bem menos do que toda a imprensa antitrumpista demorou para dizer que a culpa é dele.

Trump, sabidamente, não tem travas na língua, mas existem políticos democratas que conseguem superar o presidente em agressividade e até incitação à violência.

O filho de George Soros, o bilionário que foi o primeiro alvo de uma bomba doméstica encontrada na caixa de correio de sua mansão, condenou no New York Times “políticos que juram proteger todos os cidadãos e, em vez disso, semeiam a divisão e o ódio”.
Alexander Soros deu como exemplo de dignidade e caráter o recentemente falecido senador John McCain, que não permitiu baixarias e teorias conspiratórias quando disputou e perdeu a presidência com Barack Obama.
O exemplo é interessante. Na época da campanha, em 2008, McCain foi pintado como um belicista brutal, já entrando na esfera da extrema direita, por todos os que o transformaram a posteriori num herói.

Uma estudante de 20 anos, Ashley Todd, disse que tinha sido atacada por um partidário de McCain que desenhou a faca em seu rosto a letra “B” (de Barack). Câmeras de segurança e policiais experientes, sem contar a letra invertida, derrubaram a história rapidamente.

Vários episódios de violência denunciados depois da vitória de Donald Trump também acabaram desmentidos.

A jovem muçulmana que teve o lenço na cabeça arrancado por trumpistas? Acabou em processo por falsa comunicação de crime (e o pai dela, cruelmente, raspou as sobrancelhas da filha, como castigo).

Uma igrejinha episcopal profanada com grafite “Heil Trump”? A polícia descobriu o culpado: o próprio organista da igreja, empenhado em “criar um movimento depois de sofrer desilusão e medo com o resultado da eleição”.

A bandeira com a suástica hasteada numa casa em San Francisco? Não era um nazista assumido, mas sim o dono da casa que teve a brilhante ideia de protestar assim contra a eleição de Trump, numa outra prova de que o Idiotas Sem Fronteiras corre a pleno vapor.

Uma jovem negra verbalmente agredida e ameaça num posto de gasolina em Delaware? Não houve registro de queixa. A confusão entre medos e realidade, as fantasias de perseguição e o desejo secreto de ocupar uma posição de vítima, por mais estranhos que pareçam, são conhecidos e explicados pela psicologia.

Juan Thompson foi preso depois que a polícia chegou até ele como autor de ameaças de bomba em centros comunitários judaicos e outras organizações correlatas. Jornalista de esquerda, negro e na época desempregado, ele queria se vingar da ex-namorada, que por acaso era branca, e atribuir a ela os atos de antissemitismo.

Mais inacreditável ainda foi a história de Marcus Ron David Kadar, um hacker de 19 com dupla nacionalidade, israelense e americana.

Ele fez mais de 2 000 ameaças contra centros judaicos, muitas vezes retratadas como sinal de que a eleição de Trump estava aumentando os atos de antissemitismo. Trump enviou uma equipe especial do FBI a Israel. Kadar disse que fazia as ameaças para matar o tempo e o tédio. Foi condenado.

A investigação de alcance internacional foi exemplar em chegar ao culpado pelas falsas ameaças. Mas, num sinal de que nem a expertise policial nem a onipresença das câmeras de segurança, podem tudo, continua sem esclarecimento a série de casos de profanação de cemitérios judaicos nos Estados Unidos.

O mais famoso caso de envio de meios letais por correio também continua sem solução definitiva. Logo depois dos ataques terroristas com aviões sequestrados no Onze de Setembro de 2001, as redações dos principais canais de televisão em Nova York, além de dois senadores democratas, receberam cartas contendo bacilos de antraz.

A doença, também conhecida como carbúnculo, é tão letal que pode ser transformada em arma biológica. As cartas com antraz, que tumultuaram o país já traumatizado pelos ataques da Al Qaeda, também faziam referências do tipo “morte aos Estados Unidos” e “morte a Israel”.

Não foram brincadeira: mataram cinco pessoas. O FBI concluiu em 2008 que o culpado era microbiologista Bruce Ivens, que fazia pesquisas sobre uma vacina de antraz num laboratório militar. Ivens cometeu suicídio dias antes de ser indiciado. Para um cientista que trabalhava com substâncias de altíssimo risco, usou um método contraditório: overdose de Tylenol.

O caso teve desdobramentos. Um ex-agente do FBI, Richard Lambert, entrou com processo contra a polícia federal americana alegando que as provas contra Ivens eram insuficientes. E, depois de seu suicídio, houve manipulação da opinião pública para dar o caso por encerrado. Lambert diz que foi demitido por discordar dos rumos da investigação.

O caso atual das bombas, rudimentares porém “funcionais”, será esclarecido ou entrará na categoria preferência política?

A segunda hipótese obviamente já está rolando. E não existe nenhuma coincidência nas semelhanças interpretativas com o atentado a faca contra o candidato Jair Bolsonaro.

Antitrumpistas atribuem tudo a um plano violento de supremacistas brancos, incentivados pelo tom usado pelo presidente contra seus adversários políticos.

A imitação da bandeira do Estado Islâmico no envelope de pelo menos uma das bombas – a silhueta de três mulheres nuas no lugar das curvilíneas letras da escrita árabe – é usada como paródia em sites de extrema direita.

O grupos mais mencionado até agora é o Proud Boys, que pretende ser uma espécie de Black Bloc com sinal invertido.

O próprio fundador do grupo, Gavin McInnes, parece uma paródia: é canadense, tem a barba de lenhador hipster e tirou o nome do grupo de uma música do desenho animado Aladim, da Disney.

Os trumpistas mais convictos acham exatamente o contrário: é tudo um plano maligno para influenciar em favor dos democratas as eleições de novembro. Uma operação de “bandeira falsa” ou “bandeira negra”, como dizem os conspiracionistas.

Bernard Kerik, ex-chefe de polícia de Nova York, acredita que o caso será esclarecido em questão de dias. Motivo? “Existe uma tonelada de provas.”

Entre elas, o fato de que “no mundo de hoje, ninguém pode ir a lugar nenhum sem ser capturado em vídeo”. Os locais de postagem das cartas-bomba também oferecem uma avenida de oportunidades. Garimpando todos os dados de celulares nessas regiões, acabará aparecendo o traço em comum entre um ou mais aparelhos.

“Deixem os investigadores atuar, eles sabem o que estão fazendo. Vamos aguardar e lidar com fatos na medida em que apareçam, em vez de ficar especulando e pondo a culpa no discurso político”, apelou Kerik.

Obviamente, em vão. Analisar fatos com neutralidade é uma das últimas coisas que se pode esperar no mundo político atual.

E, obviamente, não apenas nos Estados Unidos.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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