MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 22 de setembro de 2013

Professor de música forma fanfarra com alunos surdos-mudos em MT


Vibração do som permite que alunos surdos possam tocar em conjunto.
Fanfarra estimula a autoestima e a inclusão dos deficientes auditivos.

Do G1 MT

Fanfarra surdos Cuiabá (Foto: Gesseca Ronfim/G1)Fanfarra surdos foi criada por músico em unidade de Cuiabá (Foto: Gésseca Ronfim/G1)
Em 2008 o músico Fábio Albertino da Silva recebeu o convite para ser regente da fanfarra de uma escola em Cuiabá. Uma proposta normal para o saxofonista que veio de uma família de músicos já que o avô, o pai e o tio já tinham comandado fanfarras. A diferença do convite estava em um detalhe: os alunos eram surdos.
A primeira vez que foi ao Centro Estadual de Atendimento e Apoio ao Deficiente Auditivo (Ceaada) para dar aula, Fábio percebeu que o desafio seria bem maior do que ele imaginava. A fanfarra já existia há um ano, mas antes admitia integrantes ouvintes para auxiliar os deficientes auditivos, o que camuflava o pouco conhecimento dos alunos do Ceaada. “Eu acreditava que eles já sabiam alguma coisa”, disse o regente. Mas essa era uma nova fase, a fanfarra “Ritmos do Silêncio” iria começar do zero e agora somente com alunos surdos.
A audição, conta o professor, foi uma decepção. Todos tocavam em ritmos e intensidades diferentes, claramente não tinham a percepção do que estavam produzindo. “Eu pensava: como vou ensinar música para eles? Como vou mostrar o que é ritmo? Eu já tinha assinado o contrato de trabalho e não podia desistir. Fiquei desolado”, confessou Fábio. O professor sempre teve a mania de anotar o que achava interessante em suas aulas. Naquele momento só preenchia seu caderno com conclusões negativas. “Comecei a anotar. Andamento: não tem. Postura: não tem. Ausência de melodia. Ausência de socialização”, relembra, rindo da situação.
O fio de esperança só se deu dias depois quando, no pátio da escola, Fábio observou um dos alunos batucando em uma caixinha de isopor, que usava para vender suco. O professor batia em uma mesa próxima ao menino e ele imitava na mesma intensidade batendo na caixinha. O garoto fazia questão de não participar da fanfarra e não sabia explicar porque conseguia imitar o som. Na difícil comunicação entre os dois, pois Fábio ainda não sabia a língua dos sinais, ele encontrou a solução para seus problemas: a vibração.
Fanfarra surdos Cuiabá 2 (Foto: Gesseca Ronfim/G1)Alunos estudam pela manhã e participam de atividades extras durante a tarde, como a fanfarra. Foto: Gésseca Ronfim/G1)
Daquele momento em diante todos os alunos passaram a ter aulas em cima de um tablado, que vibrava com a batida dos instrumentos. O exercício deu a eles percepção do som e, principalmente, domínio sobre ele. “Eu queria que eles percebessem que poderiam produzir o som, produzir aquela vibração”, conta Fábio. O estudante Wilksson Vales de Souza, por exemplo, relata que não tinha percepção de que muitas das vibrações que sentia eram geradas pelo som. A fanfarra o ajudou a entender.
Sem silêncio
O Centro Estadual de Atendimento e Apoio ao Deficiente Auditivo atende atualmente a 110 alunos, todos surdos, e alguns apresentam ainda outros tipos de deficiência. A escola aceita crianças a partir dos três anos, mas também oferece ensino a adultos que cursem até a 8ª série. Nesse ambiente, a surdez é absolutamente normal e quem ouve é que tem que se adequar. Não é raro ver alguém falando com outra pessoa que pode ouvir, mas fazendo a língua de sinais ao mesmo tempo. Chamar não adianta. O toque e a atenção no outro são essenciais. Na hora do intervalo, assim como em qualquer outra escola, as crianças e jovens se comunicam, brincam, riem, gritam. O silêncio não faz parte de um colégio para surdos.
Pela manhã os alunos têm aulas normais e, à tarde, fazem atividades extracurriculares. A fanfarra é uma delas. Atualmente 40 alunos participam das aulas da fanfarra e a maioria toca instrumentos de percussão, que produz vibração. Somente um deles toca teclado, que é um instrumento de melodia, pois não perdeu completamente a audição.
O grupo já se apresentou em vários desfiles de rua e sempre recebe convites de empresas. Sair para as apresentações é um momento de muita diversão para os alunos. A diretora Cláucia Inês Paes de Barros só lamenta a falta de um veículo para o transporte do grupo. “Ainda temos esse problema porque, para sair da escola, além dos alunos, temos que levar os instrumentos”. Um corpo coreográfico formado pelas alunas do Ceaada os acompanha nas apresentações. O próximo passo é a criação da fanfarra mirim, pois os pequenos já demonstram interesse nos instrumentos no saguão da escola.
Integração
A atividade não se propõe somente a dar aos jovens a percepção de algo que não podem sentir, mas principalmente a promover integração. “O principal objetivo da fanfarra é levar os alunos para a sociedade. Mostrar que eles podem trabalhar, ter uma família. A sociedade ainda vê o surdo como um incapaz”, comentou o professor.
As mudanças também atingem a sala de aula. “A fanfarra trabalha a inclusão e a autoestima dos alunos. Isso tem enriquecido o aprendizado” enfatiza a diretora Cláucia Inês Paes de Barros. Há dez anos a dona de casa Alexandra Cristina de Moraes acompanha o filho Pablo, de 14 anos, ao Ceaada. Ela diz que o comportamento do filho mudou para melhor. “Ele se dedica muito à fanfarra. Quando é para tocar, ele sempre vem, gosta bastante. Ele era mais quieto e agora interage mais com os outros”.
Os benefícios do projeto para os deficientes auditivos são diversos. Atividades que parecem simples para quem escuta, podem trazer dificuldades para quem não ouve, como não esbarrar nos colegas enquanto tocam. Além da percepção de ritmo, respeito e disciplina.
E o contrato que era para durar um ano, já se estendeu para cinco. Quanto às anotações pessimistas, são páginas viradas no caderno do professor Fábio. “Não se trata apenas de aprender a tocar um instrumento, mas de integração, de mostrar ao deficiente auditivo do que ele é capaz”.

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