Roberto Nascimento
É preciso repetir sempre que o perigo de um golpe de estado, em pleno Século XXI, realmente rondou o país, e a polarização permanece, cada vez mais radicalizada. Nesse clima, o mais incrível é que ainda exista quem não acredite que haveria golpe. Muitos extremistas de direita alegam que se trata de “um golpe que não houve” e, por isso, não deve haver punidos.
Esquecem que o então candidato Jair Bolsonaro foi eleito com apoio ostensivo do então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, e sempre demonstrou pretensões golpistas.
GOVERNO PARAMILITAR – Ao assumir o poder, Bolsonaro empregou mais de 6 mil militares em cargos civis, algo inimaginável e que jamais aconteceu durante os 21 anos de regime militar. Ainda não satisfeito com a eleição, cooptou um grupo de oficiais-generais para permanecer no poder indefinidamente. Tudo isso é sabido e inquestionável.
O golpe somente deu errado, porque desde o início do governo surgiu entre os próprios militares uma desconfiança sobre o caráter de Bolsonaro, que foi deixando grandes amigos pelo caminho, e sempre os humilhando, como o general Santos Cruz e o advogado Gustavo Bebiano, que ousaram contrariar as decisões do presidente e seu clã.
Nesse percurso, Bolsonaro cometeu muitos erros e jamais admitiu que fosse contrariado. Detonou todos os ministros e assessores que ousaram alertá-lo sobre decisões que poderiam prejudicar o país e o próprio presidente.
LISTA GRANDE – Essa resistência a críticas foi reduzindo a credibilidade de Bolsonaro junto aos militares, especialmente depois que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, pediu demissão e Bolsonaro afastou o então ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, desagradando os comandantes do Exército, general Edson Pujol, da Marinha, almirante Ilques Barbosa, e da Aeronáutica, Moretti Bermudes, que colocaram os cargos à disposição.
Bolsonaro nomeou comandantes mais ligados a seu grupo. Mesmo assim, continuou a haver desentendimentos com a cúpula dos militares, que foram minando a confiança dos oficiais superiores.
Por isso, na reta de chegada, o presidente tentou, mas não conseguiu apoio para a minuta do golpe, na última reunião com o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, e os comandantes militares.
POSTURA COVARDE – Bolsonaro jamais teve a postura de um líder militar. Pelo contrário, teve uma atitude covarde de golpista, ao viajar para os EUA e deixar seus apoiadores depredarem o Planalto, o Congresso e o Supremo, para criar o caos e abrir caminho para uma decisão de convocar as Forças Armadas para GLO (Garantia da Lei e da Ordem), o que ele pensava redundar na intervenção militar com Bolsonaro no Poder.
Mas foi um sonho shakespeariano de uma noite de verão, porque uma intervenção armada pressupõe um general no comando, jamais um capitão, especialmente se ele foi considerado um mau militar por generais respeitados como Ernesto Geisel e Leônidas Pires Gonçalves.
O tenente-coronel Mauro Cid percebeu que também seria abandonado em plena arena, quando Bolsonaro inadvertidamente declarou: ”Cid tinha autonomia plena, às vezes agia sem o meu comando”. Foi a senha para o ex-ajudante de ordens cuidar da própria vida e de sua família. Agora Bolsonaro, na mira da Justiça, está cada vez mais desprestigiado pelos militares da ativa. E são eles que contam.
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