Duas receitas portuguesas: um ato de resistência contra a censura do Ifood.

 BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

A ideologia politicamente correta continua devastando a cultura em todos os níveis, com a censura se tornando cada vez mais forte nas empresas privadas. Luciano Trigo via Gazeta:

Realmente, vivemos tempos muito estranhos. Parece que, de uma hora para outra, a humanidade entendeu que todos os seus problemas reais estavam resolvidos e resolveu inventar outros, imaginários, só para passar o tempo e encher o saco.

Não é só no Brasil, a epidemia de cretinismo politicamente correto é planetária. Mas, no nosso país, ela ganha contornos particularmente ridículos – mas, infelizmente, contornos não apenas cômicos, porque prejudicam concretamente a vida de muitas pessoas. Cabe aqui o chavão: seria cômico, se não fosse trágico.

A última manifestação dessa epidemia partiu do aplicativo de entregas IFood. Na semana que passou, o @iFoodbrasil “cancelou”, vejam só, alguns pratos da gastronomia portuguesa. Ao que parece, comida também pode ser opressora e politicamente incorreta.

Os pratos em questão, que não podem mais ser vendidos no IFood, são “Punheta de Bacalhau” e “Batatas ao Murro” – que integravam o cardápio do restaurante desde 1977. Ambos foram sumariamente excluídos da plataforma de entregas, sem qualquer aviso aos donos de restaurantes. A justificativa: os nomes desses pratos não são compatíveis com o novo “código de conduta” da empresa.

A decisão grotesca foi exposta no Instagram pelo chef Alexandre Henriques, do restaurante especializado em gastronomia portuguesa Gruta de Santo Antônio, em Niterói, RJ, no último domingo: "Não poderemos usar mais a descrição ‘batata ao murro’ no aplicativo iFood, pois, pelo código de conduta, esse nome tradicional, é ofensivo", postou o chef.

Já é suficientemente ridículo imaginar que o prato “Punheta de Bacalhau” possa ofender a sensibilidade de alguém, mas censurar “Batatas ao Murro” constitui um desafio ao bom senso. Em conversa com o chef, um porta-voz do IFood explicou: “Murro é um termo que se refere a agressão e, portanto, vai contra os termos de uso do IFood, que foram atualizados neste mês”.

Aliás, a palavra “acepipes” também foi censurada, mas neste caso nem o departamento de comunicação do IFood soube explicar o porquê. E vinhos portugueses também foram bloqueados. Terá sido o Pinto? Ou o Periquita?

Sobrou para pratos como o Polvo Lagareiro e o Bacalhau Lagareiro, que têm como acompanhamento a batata fascista. Obviamente, o dono do restaurante teve prejuízo, porque deixou de vender os pratos, que os clientes acharam que tivessem sido excluídos do cardápio.

“Pediram para mudar o nome do prato Punheta de Bacalhau. É um prato típico português! Um bacalhau cru desfiado à mão com temperos não é punheta?”, ainda tentou explicar o chef. “Só rindo para não chorar. Fala sério, eu sou português e vou continuar a usar a palavra! Não tem cabimento tanta idiotice!"

E concluiu: “Imagina se tivesse puttanesca no prato!”

Por concordar inteiramente, posto aqui receitas da Punheta de Bacalhau e das Batatas ao Murro, extraídas e adaptadas de sites de culinária portuguesa. É um verdadeiro ato de resistência.

Punheta de Bacalhau:

Ingredientes:

Bacalhau; cebola; alho; azeite; e temperos (sal, pimenta, salsa e vinagre) a gosto.

Preparação:

Basta desfiar umas postas do lombo do bacalhau previamente demolhado, retirar peles e espinhas. Se for para servir como entrada, deve-se desfiar bem fininho.

Juntar alho bem picadinho e cebola a gosto, cortada em tirinhas ou picada, e temperar ao gosto de cada um: um bocadinho de pimenta moída, salsa picada, vinagre e azeite do bom, para no final molhar uns pedacinhos de pão ou broa.

O acompanhamento pode ser uma salada de agrião ou alface, ou mesmo tomate e pepino. Há quem adicione ovo cozido, pimentões e azeitonas.

Batatas ao Murro:

Ingredientes:

8 batatas; 8 dentes de alho sem casca; 2 xícaras de óleo; duas cenouras médias cortadas finas; 300 gramas de vagem picada; temperos a gosto.

Preparação:

Ligue o forno à temperatura média. Lave as batatas, seque-as e disponha-as numa assadeira. Leve ao forno por 1 hora e 10 minutos, ou até ficarem macias – mas não muito moles. Retire do forno, rompa as batatas com um murro e frite-as no óleo bem quente com os dentes de alho.

Assim que dourar, retire as batatas do fogo e polvilhe o sal. Escorra o óleo da panela, elimine o alho e adicione a cenoura e a vagem. Refogue, acrescentando pitadas de sal, até ficar al dente. Retire do fogo e distribua os legumes e as batatas nos pratos. Sirva a seguir.