MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

sábado, 29 de maio de 2021

Com menos nascimentos, China deve se tornar um país com muitos velhos e poucos jovens

 



Tendência atual é a população começar a diminuir

Igor Patrick
Folha

Enquanto a China colocava em órbita as partes de uma nova estação espacial e pousava um robô em Marte, apenas uma notícia disputava atenção equivalente entre jornalistas e sinólogos: os dados do censo demográfico decenal, divulgados com mais de um mês de atraso pelo Escritório Nacional de Estatísticas.

Rumores divulgados pela imprensa internacional indicavam uma redução populacional pela primeira vez em mais de 50 anos e previam o início de uma catástrofe demográfica, capaz de frear o grande crescimento econômico observado no país por mais de quatro décadas.

MAIS HABITANTES – Os resultados trouxeram alívio momentâneo para Pequim, mas o prospecto passou longe das projeções otimistas. A população de fato cresceu: passou de 1,34 bilhão em 2010 para 1,41 bilhão de pessoas em 2020, consolidando a China como a nação mais populosa do mundo. Mas as notícias boas pararam aí.

No ano passado, apenas 12 milhões de bebês nasceram na China, marcando uma queda de 18% em relação a 2019 (14,65 milhões) e atingindo a marca do quarto ano de consecutivos declínios na estatística.

São números astronômicos, mas insuficientes para conter um problema maior: a população envelhece rapidamente (passou de 13% para mais de 18% a proporção de idosos em 10 anos) e, em breve, haverá menos jovens em idade ativa para trabalhar e fazer a economia continuar crescendo.

TENDÊNCIA DE QUEDA – Doutorado em demografia pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e ex-professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas vinculada ao IBGE, o pesquisador José Eustáquio Diniz Alves estuda a tendência de queda no país asiático e explica as razões históricas para o problema.

Autor de vários artigos sobre o tema, Alves afirma que as taxas de natalidade eram altas mundialmente no início dos anos 1950, mas depois foram naturalmente caindo com democratização do acesso à contracepção, educação e ampliação do mercado de trabalho.

Na China, porém, as famílias continuaram crescendo. Houve um aumento recorde na chamada população demograficamente dependente, ou seja, que a maioria dos chineses ainda estava em idade escolar e, mesmo trabalhando no campo, seria incapaz de atingir índices de produtividade que gerassem crescimento econômico.

MAO E DENG – Já nos últimos anos do governo Mao, a China adotou uma campanha de propaganda para incentivar a redução no número de filhos: de 5,7, a taxa de fecundidade caiu para 2,7. Mas a morte de Mao e a chegada de Deng Xiaoping à liderança nacional fez o país dobrar a aposta.

Ao argumentar que o contínuo crescimento populacional colocava em xeque sua política de quatro modernizações (indústria, agricultura, defesa e ciência e tecnologia), Deng radicalizou e em 1979 lançou a Política do Filho Único, uma das causas centrais para os problemas demográficos enfrentados pela China hoje.

Sob as novas regras, casais poderiam ter um único filho, com raras exceções concedidas a minorias étnicas e a algumas regiões rurais. Quem descumprisse a lei era submetido a abortos e esterilização forçada, além de pesadas multas e até prisão. Por um tempo pareceu funcionar: os nascimentos caíram consistentemente nos anos seguintes.

MERCADO DE TRABALHO – A estratégia inundou o mercado de trabalho com jovens sem filhos, prontos para trabalhar longas jornadas e sustentar a economia chinesa. A Política do Filho Único foi abolida oficialmente em 2015 (agora é possível ter dois), mas ainda assim há sinais de esgotamento: se, antes do censo, estatísticos da ONU previam o início da redução no número de chineses entre 2027 e 2029, os dados revelados neste mês mostram que a queda pode chegar muito antes do previsto.

“É bastante provável que comecemos a ver uma redução a partir do ano que vem ou de 2023. Até o fim do século, a China deve perder 400 milhões de pessoas, quase duas vezes a população do Brasil. Esta é uma tendência quase irreversível, considerando a taxa de fecundidade atual em 1,3 filho, bem abaixo dos 2,1 necessários para o que chamamos de reposição demográfica, ou seja, o índice considerado mínimo para manter a população estável”, explica José Eustáquio.

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