Vender que a CoronaVac é uma vacina capaz de barrar os vírus é uma estratégia arriscada e possivelmente responsável pelo engano que pode estar na origem dos picos de casos e mortes no Chile. Leonardo Coutinho para a Gazeta do Povo:
Os
chilenos têm indicadores sociais de fazer inveja e fizeram reformas
econômicas que o Brasil jamais foi capaz de realizar. Entre os latinos,
são aqueles que mais se aproximam do primeiro mundo. Na condução da
pandemia de Covid-19, eles foram considerados um exemplo global. Em meio
à tragédia latino-americana, quem não ouviu nenhuma comparação com o
Chile? Nenhum país das Américas vacinou mais do que eles. Os chilenos
ostentam a marca de 40% da população imunizada. Para fins de comparação,
os Estados Unidos têm 37% de sua população vacinada e o Brasil apenas
11%. O resultado disso deveria ser uma queda abrupta nas curvas de casos
e mortes. Deveria. Justamente agora, quando o Chile deveria estar
colhendo os frutos de ter feito tudo certo, algo de muito errado
aconteceu. Ao contrário de seus companheiros líderes globais de
vacinação, os casos e mortes diários não estão baixando.
Israel,
Reino Unido e Estados Unidos, que juntos com o Chile lideram o ranking
com os melhores índices de imunização, viram as curvas de casos e óbitos
caírem drasticamente. Algo esperado, já que as vacinas são um reforço
fundamental para barrar as novas infecções, a propagação e as mortes.
Mas no Chile está acontecendo o inverso. A ocorrência e as mortes
começaram a subir depois do início da vacinação. Nesta semana, o país
teve a pior média móvel de casos desde o início da pandemia. Qual seria a
razão?
Parece
que o problema está, justamente, na vacina. Ou mais precisamente na
desinformação em torno da principal vacina aplicada nos chilenos. Nada
menos que 88% das doses aplicadas por lá são de CoronaVac, a mesma que
também lidera no Brasil.
Não
se trata de dizer que a vacina chinesa não funciona, mas o imunizante
tem a menor taxa de eficácia entre todos os que já estão em uso. Mas
muita gente tenta convencer as pessoas do contrário. Há uma urgência em
reconhecer e informar quem está sendo imunizado que nenhuma vacina é
capaz de protegê-los plenamente. Muito menos a CoronaVac que, para o
azar dos chilenos e brasileiros, de longe é aquela que menos oferece
proteção.
Chilenos,
brasileiros e um monte de gente ao redor do mundo não tem outra saída.
Diante da falta de imunizantes mais eficientes, populações inteiras têm
que se virar com vacinas ainda não totalmente testadas e aprovadas. Já
que a CoronaVac é o que lhes resta, as autoridades deveriam então parar
de tentar esticar os números, seja para tentar melhorar a confiança,
seja para melhorar a propaganda.
O
resultado está nas estatísticas do Chile. Por lá, as pessoas passaram
um ano inteiro levando muito a sério as restrições. Além do cansaço
natural com uma vida paralisada pela pandemia, os chilenos se viram
imunizados. Finalmente recompensados depois de tanto sacrifício. O
resultado meio natural desta combinação foi um relaxamento com os
cuidados. Comportamento exatamente igual ao que se vê aqui nos Estados
Unidos e não será diferente no Brasil.
A
diferença é que o “escudo” que foi oferecido aos chilenos tem quase a
metade da capacidade de proteção das principais vacinas que estão sendo
disponibilizadas para os americanos. Portanto, em conta de padeiro,
pode-se afirmar que o chileno vacinado tem quase o dobro de chances de
contrair Covid-19 que os moradores dos Estados Unidos.
Se
a CoronaVac é o que temos, que tal João Dória e companhia pararem de
tentar anabolizar os seus números desde a origem? No sábado (10/4) o
diretor do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China, George
Gao Fu, reconheceu a baixa eficácia da vacina. Chegou a sugerir a
combinação com a de outros fabricantes para melhorar o desempenho. A
afirmação repercutiu pelo mundo.
No
Brasil foi tratada com condescendência, na linha que a “China busca
melhorar suas vacinas”. No dia seguinte, quando Pequim tentava reverter o
impacto negativo da declaração do dirigente, o Instituto Butantan deu
uma força. Em pleno domingo, publicou um estudo em uma plataforma
aberta, sem revisão de pares, com resultados atualizados de seus estudos
sobre a vacina. E vejam só a eficácia primária teria atingido 50,7% e
não 50,38% como informado em janeiro. Um incremento de 0,32%. Uau! O
índice, segundo o estudo, “pode chegar” a 62,3%. Pode chegar. E mesmo
que chegue ainda será a vacina menos eficaz entre todas as disponíveis.
Mesmo
com a evidência de que pessoas que receberam as duas doses contraíram a
doença, foram parar na UTI e outro morreram, os políticos do Instituto
Butantan ainda insistem na versão de 100% de eficácia para os casos
extremos. Vacina alguma tem esse desempenho, mas ainda vendem esta
versão que muita gente ainda acredita e, por causa disso, reduz os
cuidados. Cobrado pelos chilenos, o Ministério da Saúde deles se escora
nos números dos brasileiros. “A vacina é 100% efetiva”. Pobrecitos.
Qual
a solução, então? Dizer a verdade. O que precisa ser combinado com a
CoronaVac não é outra vacina de outra marca ou tecnologia. Antes de
tudo, a CoronaVac precisa de transparência e honestidade. Estes dois
ingredientes aumentarão significativamente a capacidade do imunizante
salvar vidas. Quem é vacinado precisa saber que a vacina ajuda, mas não
resolve. É uma enorme camada extra de proteção, mas que de nada
adiantará se eles não seguirem se cuidando. Máscaras, dois metros de
distância quando possível e mãos limpas.
Vender
que a CoronaVac é uma vacina capaz de barrar os vírus é uma estratégia
arriscada e possivelmente responsável pelo engano que pode estar na
origem dos picos de casos e mortes no Chile. Os sinais que vêm do
Uruguai apontam para o mesmíssimo problema. Com boa taxa de imunização,
22%, tem maior índice de mortes per capita que o Brasil. A CoronaVac,
que é a vacina mais usada no Uruguai, não impediu que o país seja hoje
(levando em conta o tamanho da população), o pior lugar da região,
superando de longe os momentos mais críticos já registrados no Brasil.
Pode
custar prestígio político redimensionar os “poderes” da CoronaVac, mas
não o fazer pode estar custando muitas vidas. O Chile, mais uma vez, é o
nosso grande exemplo.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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