O
Supremo Tribunal Federal é uma entidade coletiva: cada ministro vota de
acordo com suas convicções e a decisão é por maioria. Não há
instituição superior ao STF, que possa desempatar quando um ministro
declara extinto um caso e outro decide julgá-lo. Como julgar um caso que
foi extinto? Como extinguir um caso que está sendo julgado? Se cada um
julga por si, e vale, e muitas decisões se referem a procedimentos, em
onze processos há onze chances de que onze decisões determinem
procedimentos diferentes. Não há VAR no Judiciário. Qual decisão irá se
sobrepor às outras? A do ministro que fale mais alto? Digamos que um
decida, num processo, que todos os casos julgados em Curitiba por um
juiz cujas iniciais sejam SM estão anulados. Em outro processo, outro
ministro decide que a anulação deixa de valer se o apelido do juiz se
referir a outra cidade, talvez MdM, Marreco de Maringá. Em outro
processo, outro ministro decide que, inobstante a opinião dos nobres
colegas, data venia, o risco de confusão pede que Curitiba não mais
emitirá sentenças. E os casos que já estão em andamento? Simples: para
um ministro, haverá extinção do processo. Para outro, o juiz do caso
poderá emitir sentença desde que o faça em Brasília.
Este
colunista deve ter dito uma série de bobagens, mas com a vantagem de
não ter estudado Direito, com pós-graduações no Exterior, nem dispor de
funcionários que lhe coloquem a toga. E quem estuda, como faz essas
coisas?
É ou não é
Fachin
decidiu pela anulação das condenações de Lula e reinício dos processos
contra ele não mais na Vara Federal de Curitiba, mas na Vara Federal de
Brasília. Se as condenações foram anuladas, diz Fachin, não há como
julgar a suspeição de Moro. A Segunda Turma do STF não concordou e fez o
julgamento (Moro perdeu). Mas pode ser suspeito se sua sentença foi
anulada? Há quem diga que sim, há quem diga que não. Quem decide?
Um país previsível
Atribui-se
ao ministro da Fazenda de Fernando Henrique, Pedro Malan, a frase
segundo a qual no Brasil até o passado é imprevisível. Malan está certo:
nosso passado muda conforme as conveniências. Mas o futuro é facilmente
previsível: se a anulação das condenações de Lula for vitoriosa, o
processo terá acabado. Até começar tudo de novo, as acusações estarão
prescritas.
Duelo de tantans
Em
O Rei Lear, de Shakespeare (LP&M, tradução de Millor Fernandes), o
conde de Gloucester diz: “Desgraçado do tempo em que os loucos guiam os
cegos.¨ Pois não é que tanto petistas quanto bolsonaristas ficaram
felizes com a possibilidade de impor ao país outro segundo turno entre
um e outro?
Pois bem, caros leitores, a quem estou me referindo?
1. “sem qualquer altivez, presta vassalagem pública a governantes estrangeiros”.
2. “o filho enriqueceu de repente. Os seguidores do pai dizem que o rapaz é bom de negócios”.
3. Quem não admite que, em questões financeiras, falem da esposa?
Lá e cá
Este
é um problema sério: quando procuradores investigam, sabendo que depois
vão cuidar da acusação, a tendência a minimizar provas em favor da
defesa é muito forte. E acaba de acontecer um caso interessantíssimo,
nos EUA, revelado pelo ótimo Consultor Jurídico. O Departamento de
Justiça americano pediu o trancamento de uma ação judicial, em que o réu
já havia sido condenado, depois que se soube que os procuradores não
haviam se conduzido corretamente e tinham mentido no julgamento. Como de
hábito, havia mensagens de computador revelando o mau procedimento.
O
caso: Ali Sadr Hashemi Nejad foi acusado de violar sanções dos EUA ao
Irã, por ter enviado à sua família alguns milhões de dólares, utilizando
o sistema bancário americano. Foi condenado por fraude bancária,
lavagem de dinheiro e conspiração para violar as sanções. Mas a juíza
federal Alison Nashan, que recebeu as denúncias de má conduta,
investigou o caso. Soube que os procuradores tinham mentido; deixado de
entregar à defesa provas de importância.
Detalhe
saboroso: atribuíram a um procurador novato a ideia de “enterrar
documentos” importantes, misturando-os em pilhas de papel, para que
passassem despercebidos pela defesa, na pressa do julgamento.
A
juíza exigiu cópias de todas as provas escondidas da defesa, durante e
depois do julgamento, com explicações sobre como foram obtidas e o nome
dos integrantes da Procuradoria Geral responsáveis pelas falhas.
E agora...
O
caso foi encaminhado pela juíza pra o Escritório de Responsabilidade
Profissional, do Departamento de Justiça; e ordenou ao FBI que
investigue outras alegações de má conduta de procuradores federais, no
mesmo caso. A reportagem é de João Ozório de Melo, correspondente do
Conjur nos EUA.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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