Seu retorno à ribalta eleitoral atira o País num turbilhão de incertezas, em meio a uma pandemia e ao desgoverno de Bolsonaro. Editorial do Estadão:
A
defesa do ex-presidente Lula da Silva tanto fez que conseguiu: depois
de anos a invocar questões processuais para questionar as condenações de
seu cliente por corrupção, finalmente foi premiada com uma decisão
judicial que, na prática, livra o demiurgo de Garanhuns de prestar
contas à Justiça e, ademais, lhe restitui os direitos políticos.
Desse
modo, o sr. Lula da Silva pode até subir nos palanques dos grotões
miseráveis onde ainda é rei para pedir votos e, eventualmente, voltar ao
poder, mas ainda assim, para todos os efeitos – morais e políticos –,
terá seu nome indelevelmente vinculado a múltiplos escândalos de
corrupção, marca que nenhuma chicana será capaz de apagar. Lula foi até
agora incapaz de explicar não apenas os mimos generosos que recebeu de
empreiteiros delinquentes, objeto de suas condenações ora contestadas,
mas principalmente os monstruosos esquemas de roubalheira que marcaram o
mandarinato lulopetista.
A
decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin que
beneficiou o sr. Lula da Silva, adotada na segunda-feira, não entrou no
mérito das condenações e, portanto, não considerou o chefão petista
inocente de nada. O que o ministro Fachin fez foi entender que Sérgio
Moro, então juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba, não era competente
para julgar os casos envolvendo o ex-presidente, pois em tese esses
casos não tinham vínculo direto com o escândalo da Petrobrás – foco da
Operação Lava Jato.
De
fato, era preciso um grande esforço interpretativo para incluir os
casos envolvendo Lula diretamente no organograma do petrolão. Esse,
aliás, é um dos pecados capitais cometidos pela Lava Jato – a pretensão
de ser o patíbulo de todos os políticos e empresários corruptos do
Brasil, como se todos os casos fossem conexos e como se Sérgio Moro
fosse o juiz natural de qualquer processo de corrupção.
Enfatize-se,
de novo, que isso nada tem a ver com a materialidade dos crimes
monumentais cometidos sob as bênçãos de Lula da Silva. Mesmo com a
suspeita de que Sérgio Moro foi parcial ao julgar os casos de Lula, que
seria avaliada ontem pela segunda turma do Supremo, não é possível
simplesmente considerar, como num passe de mágica, que não houve assalto
lulopetista à Petrobrás, que não houve escandalosa promiscuidade no
Congresso, que não houve indecente relação de Lula com empreiteiros.
O
imbróglio, ademais, diz muito sobre o Judiciário, que sai lanhado. Não
há explicação, compreensível para leigos, para o fato de que se tenha
levado tanto tempo para processar, julgar e condenar Lula, mesmo diante
de tantas evidências; para que a defesa do ex-presidente tenha tido
tantas possibilidades de recurso mesmo com condenações em três
instâncias; para que o Supremo decidisse pela enésima vez mudar a
jurisprudência sobre prisão após condenação em segunda instância, o que
permitiu a libertação de Lula; e finalmente para que se tenha decidido
somente agora que Curitiba não era o foro correto para os casos do sr.
Lula da Silva, sendo que havia jurisprudência específica sobre o escopo
da Lava Jato desde 2015 – aliás, citada pelo próprio ministro Fachin em
sua intempestiva decisão.
É
como se o juiz resolvesse marcar, no final do segundo tempo, um pênalti
supostamente cometido no primeiro. Há muitas explicações possíveis para
esse casuísmo, e nenhuma delas é bonita.
Que,
em meio a essa barafunda, o eleitor não perca de vista: Lula, que
sempre contou com chicanas e prescrições para voltar a concorrer à
Presidência, pode ser agora formalmente ficha-limpa, mas continua
moralmente ficha-suja. Seu retorno à ribalta eleitoral, nessas
condições, atira o País num turbilhão de incertezas, em meio a uma
pandemia mortal e ao desgoverno do extremista Jair Bolsonaro.
É
o pior dos mundos, situação que interessa somente aos populistas
radicais e irresponsáveis que protagonizam a vida nacional há tantos
anos. Mais do que nunca, quem ainda acredita na democracia e nos valores
republicanos precisa se organizar, e rápido, para convencer os
brasileiros de que há alternativa civilizada ao caos.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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