Não vou especular sobre hipóteses piores, mas cabe a pergunta: será apenas uma coincidência que os erros favoreçam sempre os candidatos de esquerda? Luciano Trigo para a Gazeta do Povo:
Eleição
após eleição, os principais institutos de pesquisa vêm passando
vergonha no Brasil, e em 2020 não foi diferente. Na melhor das
hipóteses, a metodologia que estão usando é frágil – e já deveria ter
sido corrigida.
Não
vou especular sobre hipóteses piores, mas cabe a pergunta: será apenas
uma coincidência que os erros favoreçam sempre os candidatos de
esquerda? Torço para que seja coincidência, mas, convenhamos, para muita
gente será difícil acreditar nisso. E como pesquisas eleitorais são
coisas séries, que podem determinar os resultados por influenciarem
(ainda) os votos de muitos indecisos, caberia aos institutos dar uma
satisfação aos eleitores, explicando por que, mais uma vez, erraram
tanto – e sempre na mesma direção.
Até
porque o principal capital desses institutos (como aliás ocorre com os
jornais) é a sua credibilidade. E esse capital vem sendo dilapidado a
passos largos – pelos institutos de pesquisa e por muitos jornais, com
pesquisas e matérias que leitores e eleitores julgam cada vez menos
confiáveis. Um cidadão tem o direito de torcer e fazer campanha para o
candidato que quiser; empresas comprometidas com a isenção e a
neutralidade, não.
E
há uma questão ética envolvida aqui. É aceitável que institutos de
pesquisa cometam erros absurdos em série, sem sofrer qualquer tipo de
advertência ou sanção por parte da Justiça Eleitoral? Porque parece
evidente que falhas dessa proporção podem prejudicar (ou beneficiar)
candidatos de forma decisiva. Uma pesquisa que na véspera da eleição
aponta um candidato com 10 pontos de desvantagem pode encerrar as
chances desse candidato; depois que a votação acontece e mostra uma
diferença real de 1%, é tarde para reparar o dano.
Vou
me limitar aqui a apontar o contraste entre as últimas pesquisas do
Ibope nas capitais em que houve segundo turno (e nas quais havia
candidatos claramente de esquerda), e a votação real – lembrando que
essas pesquisas foram divulgadas às vésperas das eleições, realizadas
ontem. A margem de erro, que já era alta (três ou quatro pontos para
cima ou para baixo, dependendo da capital), foi estourada em
praticamente todos casos.
Em ordem alfabética:
Aracaju:
Candidato da esquerda: Edvaldo (PDT)
Ibope (votos válidos): 62%
Votação real: 57,86% (diferença acima da margem de erro, de quatro pontos)
Belém:
Candidato da esquerda: Edmilson Rodrigues (PSOL)
Ibope (votos válidos): 58%
Votação real: 51,76% (diferença bem acima da margem de erro, de quatro pontos)
Fortaleza:
Candidato da esquerda: Sarto (PDT)
Ibope (votos válidos): 61%
Votação real: 51,69% (diferença escandalosamente acima da margem de erro, de quatro pontos)
Porto Alegre:
Candidato da esquerda: Manuela D’Ávila (PCdoB)
Ibope (votos válidos): 51%
Votação real: 45,37% (diferença bem acima da margem de erro, de três pontos)
Recife:
Candidato da esquerda: Marília Arraes (PT)
Ibope (votos válidos): 50%
Votação real: 43,73% (diferença escandalosamente acima da margem de erro, de três pontos)
São Paulo:
Candidato da esquerda: Guilherme Boulos (PSOL)
Ibope (votos válidos): 43%
Votação real: 40,62% (próxima do limite da margem de erro, de três pontos)
Vitória:
Candidato da esquerda: João Coser (PT)
Ibope (votos válidos): 50%
Votação real: 41,5% (diferença escandalosamente acima da margem de erro, de quatro pontos)
Cabe
observar que, em algumas dessas capitais, o resultado final foi muito
apertado. Talvez o resultado tivesse sido outro, se as pesquisas
tivessem mostrado números mais próximos das reais intenções de voto,
nessas cidades.
Em
Fortaleza, por exemplo, muitos eleitores do candidato Capitão Wagner,
do PROS, podem ter desistido de votar por estarem desanimados com a
pesquisa do Ibope que, na véspera da eleição, dava uma vantagem de quase
10 pontos ao candidato Sarto, do PDT. Há também aqueles eleitores que
gostam de votar no candidato que as pesquisas apontam como vencedor,
cujos votos poderiam se dispersar se a pesquisa apontasse empate
técnico.
Algo
similar pode ter acontecido em Belém, onde a diferença entre a pesquisa
da véspera e a eleição foi bizarra. Com quem os candidatos derrotados
em Fortaleza e Belém, para só citar os casos mais graves, irão se
queixar?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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