Em
entrevista ao Estadão, o ministro Gilmar Mendes, do TSE, criticou a
"infantil" decisão do procurador Rodrigo Janot de arquivar a
investigação sobre as contas de Dilma. Esse tipo de atitude, disse
Mendes, pode levar a PGR ao ridículo. Não é à toa que muita gente, no
país, vê Janot como outro advogado do PT:
Em entrevista concedida em seu gabinete no Supremo Tribunal Federal (STF) ao Estado,
Gilmar Mendes disse que a conduta da Procuradoria neste caso específico
foi distinta da adotada em outras questões eleitorais. "E aí vem com
argumentos de pacificação social, até usando um voto meu. Ora, o
Ministério Público a toda hora está pedindo cassação de mandato de
vereadores, de prefeitos, de governadores, de senadores. Então isto
(arquivamento) vale apenas para a campanha da presidente Dilma?",
criticou.
Estado:
Como avalia o despacho do procurador-geral da República pelo
arquivamento de uma das verificações para apurar trechos das contas de
campanha da presidente?
Gilmar: Vem o despacho do procurador determinando o arquivamento,
sintomaticamente no dia 13 de agosto, deve ser mera coincidência. E diz
que não há o que investigar porque a campanha já se encerrou, quando nós
não estamos falando de ilícitos eleitorais. Não tem nada a ver com este
tema. O que nós estamos cogitando é de eventuais ilícitos criminais de
ordem societária, falsidade e até estelionato contra a própria campanha.
E vem com argumentos de pacificação social, até usando um voto meu.
Ora, o Ministério Público a toda hora está pedindo cassação de mandato
de vereadores, de prefeitos, de governadores, de senadores. Então isto
vale apenas para a campanha da presidente Dilma?
Estado:
Na sua avaliação, o critério adotado pelo procurador-geral para a
investigação da presidente é diferente do usado em outros casos?
Gilmar: Por fatos muito menos graves, que nós conhecemos aqui no
Supremo, muito menos evidentes, o procurador-geral tem aberto
inquéritos. (…) O que surpreende é essa posição da procuradoria nesse
caso específico. Porque se ela adotasse essa posição em todos os casos
ela não poderia pedir a cassação de ninguém. Ela não poderia pedir a
cassação de vereador, de prefeito, de senador, governador. Toda atuação
da Procuradoria, no geral, não é no sentido de tirar a Justiça eleitoral
do jogo político. Pelo contrário, é de provocá-la. Veja só estamos
falando de investigação, ninguém está fazendo pré-julgamento. Pode ser
até que em alguns casos desses a campanha tenha sido vítima. Desde logo
não se pode oferecer uma blindagem, sobretudo em nome do prazo de 15
dias para impugnação.
Estado: Qual a avaliação da atuação da Procuradoria no processo de análise das contas da presidente?
Gilmar: A Procuradoria da República já atuou nesse processo de uma
maneira bastante viciada. Quando o processo foi a mim distribuído, o
procurador Eugênio Aragão (vice-procurador-geral eleitoral) entrou com
agravo contra a distribuição juntamente com o PT. Tanto é que vocês vão
ver na minha manifestação um claro repúdio, dizendo que isso seria em
prol da candidata e que ele o fizesse publicamente, mas que fosse sentar
na bancada de advogados e não na condição de procurador. Ele deu parece
pela aprovação integral das contas, quando ele tinha outros critérios,
já propôs a rejeição das contas de outros candidatos.
Estado: O fato de ter sido Janot e não Aragão que assinou o despacho sobre as contas da presidente faz alguma diferença?
Gilmar: Não tem o menor significado para nós. A Procuradoria que atue bem sob a pena de não ficar desmoralizada.
Estado: A PGR corre risco de ficar desmoralizada?
Gilmar: Ela tem que ter cuidados. Agora mesmo, o parecer é ridículo.
Ele não tem sustentação jurídica. Recomendar ao eleitoral que aja de
forma pacificada? Sabe o que isso representa? É como se a gente dissesse
o seguinte: para resolver um conflito entre o sequestrador e a vítima a
polícia não deveria intervir porque assim o sequestrador leva a vítima e
com isso o assunto está resolvido.
Estado: O procurador-geral da República negou, em sabatina no Senado, qualquer tipo de"acordo político" nas investigações.
Gilmar: Não vou fazer psicografia de despacho. Não me cabe. Agora, que a fundamentação vai de infantil a pueril é evidente.
Estado: As investigações sobre a campanha da presidente continuam?
Gilmar: Em relação ao Tribunal isso vai continuar de uma maneira
geral. Não haverá esse bloqueio de ações. Isso vai continuar sendo
investigado pelos outros setores também. Veja, o Fisco de São Paulo está
olhando, isso vai continuar sendo verificado.
Estado: O senhor cogita enviar mais informações sobre as contas para outros órgãos, após a decisão da PGR?
Gilmar: Não estou cogitando isso. Estamos em contato com a Polícia
Federal e tudo mais. Agora, se a Procuradoria se tornar um órgão de
advocacia partidária certamente nós temos que ser reflexivos.
Estado: A análise do TSE sobre as contas de campanha eleitoral se tornou mais rigorosa?
Gilmar:Até
pouco tempo o exame das contas pela Justiça eleitoral era muito formal.
Este exame formal muito provavelmente estimulava esse tipo de atitude
(prática de irregularidades). "Ah, o TSE se contenta com um maço de
papel" era a visão de todo mundo. Agora não. O propósito é de tão
somente proceder o exame. Por isso acho temerário dar uma blindagem
dessa. Dizer "ah, não houve ilícito. E se houvesse já estaria
prescrito". Vocês imaginam que se alguém tirasse dinheiro da campanha e
mandasse matar alguém, a gente poderia dizer que o homicídio estava
prescrito? E nem estou me lembrando de Celso Daniel (ex-prefeito de
Santo André assassinado em 2002).
Estado: Qual a intenção de promover as investigações?
Gilmar:
O que estamos querendo é construir um modelo sério da justiça
eleitoral. Tanto é que foi essa a minha preocupação. Estamos conversando
com os parlamentares, discutindo o sistema. Estamos olhando o Brasil do
futuro. (…) Qual foi meu argumento no caso da ação de impugnação de
mandato? Os fatos são suficientemente graves e devem ser investigados.
Só isso. Vai resultar em alguma coisa? Não é disso que se cuida. Veja,
tem coisas graves sendo imputadas e seria bom até que se pudesse dizer
que isso não houve na campanha. Exemplo: lavagem de dinheiro na
campanha, doação de propinas que vieram da Petrobrás transformadas em
doações legais. Seria bom que se pudesse dizer: "não, isso não houve",
depois de uma investigação rigorosa.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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