(Veja) Dilma Rousseff e Michel Temer nunca foram muito próximos. Durante boa
parte do primeiro mandato, o grau de consideração da presidente por seu
vice podia ser medido pela importância das tarefas que lhe eram
delegadas no dia a dia do governo. O vice sempre pairou em Brasília como
figura decorativa, encarregado basicamente das agendas internacionais
que a presidente não se dispunha a cumprir.
Com a popularidade alta, a
economia cambaleante mas ainda de pé e sem as revelações demolidoras da
Operação Lava-Jato, manter Temer à margem das decisões importantes,
mesmo ele carregando a faixa de representante do maior partido do
Congresso, o PMDB, nunca chegou a gerar maiores abalos para Dilma. As
dificuldades econômicas, as revelações da roubalheira no petrolão e a
meteórica queda de popularidade construíram um cenário ideal para uma
crise sem precedentes. Em momentos assim, dizem os especialistas, se não
houver o mínimo de tranquilidade no Parlamento, o risco de um tsunami
atingir o Palácio do Planalto não pode ser minimizado.
Há quatro meses,
Temer recebeu da presidente autorização para atuar e evitar que isso
acontecesse. Obteve sinal verde para negociar cargos, emendas e até
projetos em nome da estabilidade. Na semana passada, ele renunciou à
tarefa. O motivo: Dilma, de novo, tirou-lhe os poderes.
Diferentemente do primeiro mandato, as relações da presidente e seu
vice não podem mais ser definidas nem como apenas protocolares. Dilma
acredita que Temer conspira contra ela. Temer acredita que Dilma
conspira contra ele. Os dois mal se falavam desde que o vice-presidente
concedeu uma surpreendente entrevista em que reconheceu a gravidade da
crise instalada no governo e, ao que parecia, desincumbia a presidente
da tarefa de conciliadora. "É preciso que alguém tenha a capacidade de
reunificar a todos", disse Temer.
Dilma não gostou. Os assessores mais
próximos da presidente interpretaram o movimento do vice como um aceno
pessoal aos setores mais insatisfeitos da sociedade. Ele seria a solução
da crise, não ela. A teoria da conspiração ganhou mais um ingrediente
quando Dilma tomou conhecimento pela imprensa de encontros de Temer com
empresários para discutir a agenda política do país. Na versão de um
auxiliar do vice, até uma reunião com o ex-presidente Lula com a bancada
do PMDB foi classificada como ação conspiratória. "Era como se
existisse um governo Temer e outro governo Dilma", diz um auxiliar
palaciano. Aconselhada pelos ministros mais próximos, a presidente mudou
de estratégia.
Enquanto Temer se desgastava para reconstruir pontes com a base
aliada do Congresso, Dilma tentou cooptar aliados do vice dentro de seu
próprio partido, o PMDB. Sem que ele soubesse, ela chamou ao Palácio o
líder da bancada do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani, e o
presidente do diretório do partido no Rio de Janeiro, Jorge Picciani,
pai do líder do PMDB, ambos ligados ao presidente da Câmara, Eduardo
Cunha.
Em troca de cargos, Dilma queria que os dois peemedebistas
atuassem para tentar frear as hostilidades de Cunha. O problema é que
essa era uma das missões de Michel Temer. Também sem avisar, Dilma
autorizou Giles Azevedo, seu antigo chefe de gabinete, a negociar
diretamente com parlamentares da base a defesa do governo diante de CPIs
criadas no Congresso. Para agradar aos parlamentares, Temer prometera
liberar 500 milhões de reais em emendas e se comprometera a viabilizar
centenas de nomeações para cargos do segundo e terceiro escalão da
máquina federal. Dilma não só ignorou solenemente as tratativas que o
vice já havia chancelado como passou a refazer pessoalmente os acordos.
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