As iranianas estão clamando apenas por liberdade de escolha. Uma escolha simples: fazer o que bem entendem com seus cabelos. Lygia Maria para a FSP:
A
jovem Mahsa Amini foi espancada e morta pela polícia em Teerã porque
não estava usando o hijab —véu que cobre os cabelos— de forma adequada. A
atrocidade desencadeou uma série de protestos no Irã, com mulheres cortando os cabelos e queimando véus em praça pública.
Há
quem veja a obrigatoriedade do véu a partir de um relativismo
pós-moderno ("É a cultura deles") e o repúdio à obrigatoriedade como
imposição imperialista do Ocidente. Mas de qual cultura estamos falando
exatamente? A anterior ou a posterior à invasão muçulmana da Pérsia
(atual Irã) no século 7°? Aquela do final do século 19, quando iranianas
passaram a exigir reformas como acesso à educação, mudanças nas leis de
casamento e abolição do uso do véu? Pouca gente sabe, mas o Irã proibiu
o hijab entre 1936 e 1941. Pelo visto, relativistas se referem à
cultura imposta pela Revolução Iraniana de 1979, que instaurou uma
ditadura teocrática que perseguiu, torturou e matou dissidentes
políticos.
Já
conservadores lembram que toda sociedade tem suas regras de conduta:
não é porque indígenas andam nuas que mulheres em centros urbanos devem
andar nuas também. Bom, não há nenhum grupo expressivo de mulheres
querendo andar sem roupa por aí, mas mulheres já tiveram que protestar
para usar minissaia ou votar. Hoje, nenhuma mulher é obrigada a usar
minissaia ou a votar, mas podem optar.
Esse é o ponto com o hijab. As iranianas estão clamando apenas por liberdade de escolha.
Uma escolha simples: fazer o que bem entendem com seus cabelos. Um
direito humano básico: ser soberano sobre seu próprio corpo. Tratar a
imposição do véu por um regime ditatorial como mero traço cultural é um
desrespeito às iranianas, como se fossem incapazes de reconhecer a
própria opressão. Do mesmo modo, ver a luta dessas mulheres só como
interferência imperialista é tratá-las como ingênuas, ignorantes e
manipuláveis. Afinal, por que tratar as mulheres iranianas como nós, no
Ocidente, não aceitamos mais ser tratadas?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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