“Ser pela paz” é uma falácia quando há um agressor e um agredido. “Ser pela paz” é ser neutro e dar força ao agressor para instalar uma ditadura qualquer. Hugo Azevedo para o Observador:
O
papel de Gorbatchev na democratização do sistema soviético e imposição
de liberdade num país que nunca a teve foi inglório, mas decisivo para o
fim da Guerra Fria porque percebeu que a União Soviética não aguentaria
mais nenhum banho de sangue. E, com isso, cooperou para a paz mundial. A
Perestroika e o Glasnost precipitaram o colapso da União Soviética e a
consequente queda do Muro de Berlim.
Não
foi uma queda acidental, foi uma destruição a martelo, pelas mãos de
cidadãos oprimidos que fugiam da repressão comunista, da falta de
liberdade, da perseguição política, da censura e das mortes a tiro a
quem o tentasse saltar. O muro que escondia uma ditadura caiu para o
lado da democracia, do pluralismo e da globalização. Se não fosse
destruído, o muro iria certamente cair de podre.
Nada
disto foi reconhecido pelo Partido Comunista Português que, uma vez
mais entrincheirado no lado errado, acusa Gorbatchev de ser “um dos
principais responsáveis pela destruição da União Soviética e a
restauração do capitalismo na Rússia, quando o que se impunha era o
aperfeiçoamento do socialismo”. Esta ideia reflete o pensamento típico
de autoritários – o fim seria glorioso mesmo que pelo caminho houvesse
muito sangue.
Não
é, pois, surpreendente que, após a invasão da Ucrânia em 24 de
fevereiro, o PCP e uma certa esquerda se tenham apressado a “Ser pela
paz”. “Ser pela paz” é uma falácia quando há um agressor e um agredido.
“Ser pela paz” é ser neutro e dar força ao agressor para instalar uma
ditadura qualquer. Eu também sou a favor da paz, mas não da paz a
qualquer custo. Não sou a favor de distorcer os valores da paz e
submeter um país soberano e livre a uma rendição.
Na
mesma retórica em defesa do agressor estão Salvini, Le Pen e Orbán,
tendo esse agressor invadido um país livre e independente. São estes
herdeiros do totalitarismo comunista e fascista a maior ameaça à
democracia liberal em que vivemos.
A
Ucrânia aspira a ser uma democracia e pertencer ao mundo democrático da
União Europeia e da NATO, usualmente designado pela direita e esquerda
radicais como “capitalista e globalista”. A Rússia, tal como a China,
considera a UE e a NATO, alegadamente “capitalistas e globalistas”, como
grandes inimigos, porque são um entrave a Putin restabelecer, pela
força, a hegemonia russa no espaço da ex-União Soviética.
Numa
altura em que os autoritarismos e populismos voltam a cativar
multidões, em que o valor da liberdade é relativizado em nome de outros
valores supostamente maiores, é essencial celebrar a democracia e a
queda do Muro de Berlim enquanto vitória da liberdade sobre um sistema
que perseguiu e escravizou, condenou à fome e levou à morte milhões de
pessoas, e por isso mesmo não merece qualquer defesa ou justificação.
Estou
a favor da defesa da liberdade, das sanções aplicadas ao violador, do
estilo de vida ocidental, do mundo civilizado, da democracia liberal.
Estou contra Putin, contra o imperialismo, contra a opressão e contra
posições extremadas do PCP, Putin, Le Pen, Orbán e afins.
A
inflação tem crescido e atingido níveis históricos e os tempos que se
aproximam serão difíceis. Todos os dias seremos lembrados dos malefícios
de estar na guerra, e o filme russo da Gasprom que mostra a Europa
gelada está aí para nos assustar. Neste inverno, e com o escalar das
dificuldades, vai ser fácil à extrema-esquerda e extrema-direita culpar o
Ocidente de estar envolvido na guerra. A Democracia e a Liberdade não
podem ceder, mesmo que em algumas circunstâncias se possa ter que perder
a paz e o conforto por algum tempo.
A
batalha que a Ucrânia trava é decisiva na defesa do mundo que
escolhemos viver, um mundo livre, democrático, um mundo aberto a todos e
onde acreditamos que o dia de amanhã pode ser melhor do que o dia de
hoje. É este o lado certo do muro. É primordial que, tal com a
presidente da Comissão Europeia afirmou, “Putin falhe e a Ucrânia e a
Europa prevaleçam”. A batalha decisiva para a defesa das democracias
liberais está a acontecer agora.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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