BLOG ORLANDO TAMBOSI
Testemunhas e policiais contam uma versão bem menos dramática, indicando que o príncipe e a mulher querem faturar na posição de vítimas. Vilma Gryzinski:
Quem conhece Manhattan nem que seja de passagem, logo detectou os pontos fracos da história contada por Harry e Meghan
a respeito de “uma perseguição quase catastrófica” de duas horas de
duração pelas ruas da ilha mais movimentada do mundo, feita por “um
bando de paparazzi altamente agressivos” que quase resultou em
“múltiplas colisões”.
O que é indubitável: os fotógrafos de celebridades nos Estados Unidos são “altamente agressivos”.
Mas
rodar em situações de perigo durante duas horas numa ilha de 60
quilômetros quadrados, com um sinal a cada esquina e um trânsito de
matar, mesmo já mais tarde da noite, só se fosse em Velozes e Furiosos.
Mesmo
que o roteiro tenha incluído uma parada numa delegacia para tentar
despistar os paparazzi. Diz o motorista do táxi que o casal, mais a mãe
dela, Doria Ragland, tomaram a certa altura: “Acho que foi tudo
exagerado, não tentem ver muita coisa nisso”.
Detalhe
importante da vida real: o táxi dirigido por Sukhcharn Singh logo
parou, bloqueado por um caminhão de lixo. Os paparazzi cercaram o carro e
os passageiros voltaram para a SUV alugada, acompanhada por outros
carros com seguranças e policiais locais. Tudo terminou sem maiores
problemas, depois que a polícia parou o trânsito para deixar o casal
seguir caminho. “Não houve colisões, intimações, danos corporais ou
detenções”, informou um representante da polícia nova-iorquina.
“Acho
difícil acreditar que tenha havido uma perseguição a alta velocidade de
duas horas, mas uma de dez minutos já é extremamente perigosa”, aliviou
o prefeito Eric Adams.
E por que a perseguição aconteceu?
Harry
e Meghan não queriam que a imprensa descobrisse onde estavam
hospedados. O motivo parece muito desproporcional ao resultado. E
lembra, tragicamente, o que aconteceu com a princesa Diana. O namorado,
Dodi Fayed, queria despistar os paparazzi como uma forma provável de
mostra que podia proteger Diana. Não havia mistério no destino: só
poderiam estar indo para duas lugares em Paris, o apartamento de Dodi ou
o palacete onde o duque de Windsor, o ex-rei Edward VIII, havia morado
com a mulher, Wallis Simpson (comprado e restaurado pelo pai de Dodi,
Mohammed Fayed).
Foi
Dodi quem inventou um ardil esperto: fingir que o casal sairia pela
frente do Ritz, enquanto combinava com Henri Paul, o segurança convocado
como motorista, escapar pelos fundos. Os paparazzi provavelmente
recebiam informações de alguém do hotel e foram atrás do Mercedes que,
rodando muito acima da velocidade permitida, se estraçalhou ao bater
numa coluna do túnel da passagem chamada Pont D’Alma.
As
cenas imediatamente subsequentes foram chocantes. Stéphane Darmon, que
conduzia a moto usada pelo fotógrafo Romuald Rat, contou que desceu e
abriu a porta do Mercedes. Diana estava no chão do banco de trás, viva,
com um ferimento na cabeça. Em vez de ajudar a princesa e o outro
sobrevivente, o segurança Trevor Rees-Jones, salvo pelo cinto de
segurança, os paparazzi começaram a tirar fotos das vítimas.
Duas
testemunhas, Antonio Lopes Borges e Ana Simão, viram fotógrafos subindo
no teto do carro. Diana só recebeu atendimento quando o médico Frédéric
Maillez, que passava por acaso no local, parou para ajudar. Todos sabem
o tráfico fim.
À
luz dessa história horrível, mais chocante ainda pela futilidade do
motivo, Harry e o irmão William têm todos os motivos para odiar os
paparazzi, fotógrafos que não seguem nenhum padrão ético, mas com os
quais as celebridades fazem acordos: posam para fotos na entrada de
eventos, aceitam os flagrantes “roubados” na rua (isso quando seus
empresários não avisam antes) e ganham um espaço de manobra.
Harry
fez o contrário. Fugiu dos paparazzi na chegada a uma cerimônia de
premiação de Meghan e depois quis evitá-los na volta para o lugar onde
estão hospedados. O que haveria de tão secreto nisso? Provavelmente
nada. Os movimentos obedeceram talvez ao desejo de “não dar o gosto”
para os paparazzi. Mesmo sem o drama que a assessoria de imprensa do
príncipe descreveu, o episódio serviu para colocá-lo na posição de
vítima e alimentar a guerra com os tabloides. Num momento chave: o
processo por invasão de privacidade movido na Inglaterra por Harry e
outras celebridades contra a empresa de Rupert Murdoch que edita
conhecidos tabloides está chegando à fase final.
Murdoch
também é dono do New York Post, que não teve muito trabalho para
desmanchar a versão da perseguição “quase catastrófica”. E divulgar o
comunicado da empresa para quem os fotógrafos estavam a serviço, a
Backgrid USA. “Recebemos fotos e vídeos dos eventos de quatro fotógrafos
freelance, três dos quais estavam em carros e um de bicicleta”.
“É
importante notar que esses fotógrafos têm o dever profissional de
cobrir eventos e personalidades dignos de nota, incluindo figuras
públicas como o príncipe Harry e Meghan Markle”.
“Um
dos quatro SUVs da escolta do príncipe Harry estava sendo dirigido de
maneira que poderia ser considerada imprudente. O veículo foi visto
bloqueando ruas e, em um vídeo, sendo interceptado pela polícia”.
“Algumas fotos mostram até Meghan sorrindo dentro de um táxi”.
Um fotógrafo do grupo disse, anonimamente, que era “o motorista deles quem estava criando uma situação catastrófica”.
“Foi
muito caótico”, contrapôs um dos seguranças, Chris Sanchez. “Os
transeuntes estiveram em perigo várias vezes”. O chefe da escolta, Tom
Buda, admitiu que não houve uma perseguição a alta velocidade, mas
acusou os paparazzi de agir com imprudência.
Está,
assim, montado o ringue para mais um processo? As câmeras da cidade
devem ter os registros de cada movimento e podem decidir qual a versão é
mais parecida com a verdade. Se Harry e Meghan estiverem corretos, suas
acusações estarão legitimadas e ainda podem levar uma indenização.
Representantes
legais do casal exigiram que a Backgrid entregasse todos os vídeos e
fotos envolvendo Harry e Meghan. A empresa respondeu que “na América, a
propriedade pertence aos donos e terceiros não podem exigir que lhes
seja entregue, como talvez os reis possam fazer”.
Está
boa a briga. E traz mais uma prova de que a aposta do casal ao largar a
família real e ir morar, e ganhar dinheiro, nos Estados Unidos não tem
sido tão simples quanto parece quando Meghan surge, deslumbrante,
envolta num tomara que caia dourado, trocando olhares apaixonados com o
marido, como na premiação que terminou em encrenca.
Uma
pesquisa feita em abril mostra que ela tem 33% de opiniões favoráveis e
39% contra em seu próprio país, onde supostamente deveria ser acolhida
como a duquesa rebelde que defendeu valores americanos no confronto com
uma instituição arcaica como a monarquia da antiga matriz colonial. A
visão favorável a Harry é de 39%. Uma das piores coisas que aconteceu
com o casal foi o episódio de South Park onde eles são satirizados como
privilegiados sem noção que fingem querer privacidade e fazem de tudo
para aparecer.
O
incidente dessa semana, com a suspeita de que eles procuraram tirar
vantagem de uma situação sem a propalada gravidade, não melhora isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário