Janet Yellen reconheceu que estava errada sobre inflação - é um gesto político exigido pelo chefe, Joe Biden, apavorado com o tamanho do desastre
Dificilmente.
Ela foi escolhida por Joe Biden como secretária do Tesouro justamente
por ser da turma que admite um “pouquinho” de inflação em nome do
crescimento econômico.
Isso
no distante ano de 2020. Depois, ainda sustentou que a inflação
representava um “risco pequeno”. Desde então, “houve grandes e
imprevisíveis choques na economia que insuflaram os preços da economia e
dos alimentos e gargalos no abastecimento que afetaram pessimamente
nossa economia que eu – na época – não compreendi completamente, mas que
agora reconhecemos”.
Yellen
foi muito criticada por suas previsões erradas e pela “política do
silêncio”, a aparente falta de engajamento e de empatia face aos
estragos da inflação.
O
mea-culpa não é espontâneo. Faz parte da tentativa de Biden de se
mostrar ativo em relação à maior preocupação dos americanos – e não só
deles -, o custo de vida. A inflação está em 8,5%, mas os preços que
mais pesam no bolso subiram muito mais. Só um exemplo que os brasileiros
compreendem muito bem: a carne de frango subiu 49,7% em relação há um
ao.
A
gasolina a 1,41 dólar o litro e as prateleiras dos supermercados
incendiadas pelas altas de preços como não acontecia há quarenta anos
corroem os índices de aprovação ao presidente, mesmo entre o eleitorado
democrata. Nos onze principais institutos de pesquisas, a desaprovação a
Biden vai de 51% a 59%.
Em
relação especificamente à condução da economia, a desaprovação vai de
52% a 65%. É tão flagrante que a grande imprensa, que continuou a culpar
Donald Trump por todos os males imagináveis mesmo com Biden já no meio
do mandato, começou a espetar o presidente.
Desse
jeito, vai ficando cada vez mais impiedosa a surra nas urnas prevista
para os democratas nas eleições legislativas de novembro.
Biden
exigiu o mea-culpa de Yellen porque “acredita que seus assessores não
estão correspondendo e é culpa deles que se tornou tão popular quanto
erva venenosa”, espetou Michael Goodwin no New York Post.
Imaginem só um presidente que põe a culpa nos ministros…
“Relançar”
a imagem do governo é o tipo de iniciativa que assessores aconselham
nos momentos em que a coisa vai mal. O primeiro passo foi a reunião de
Biden com Yellen e Jeremy Powell, o presidente do Fed – depois de passar
um tempão “evitando escrupulosamente” se encontrar com ele, para não
passar a imagem de interferência.
“Biden está ficando sem opções”, anotou a agência AP – onde o antitrumpismo militante também está dando lugar à nova realidade.
“As
tentativas anteriores – liberar petróleo da reserva estratégica,
melhorar as operações portuárias e clamar por investigação de aumentos
abusivos de preços – ficaram aquém de resultados satisfatórios”.
Declarar-se
vítima de circunstâncias imprevisíveis, como argumentou Janet Yellen,
também não ajuda muito quando a máquina de fazer dinheiro injetou 1,9
trilhão de dólares na economia, já numa situação em que os efeitos
inflacionários eram perfeitamente prognosticáveis.
Isso
não significa ignorar que estas circunstâncias realmente pesaram, como
testemunham países com aversão a risco, como a Alemanha (inflação de
8,7%, empatada com os Estados Unidos).
No
Reino Unido, onde se combinam a inflação de 9% e o desgaste político de
Boris Johnson no caso das festinhas proibidas durante a pandemia, o
governo conservador – repetindo, conservador – apelou ao aumento de
impostos para as empresas energéticas e a distribuição de dinheiro. Cada
família vai receber, no mínimo, um checão de 400 libras. As
aposentadorias terão o maior aumento real em 32 anos.
“Nenhum
governo pode resolver todos os problemas, especialmente um problema tão
complexo como a inflação”, disse o ministro da Fazenda, Rishi Sunak, ao
anunciar que estava tentando exatamente isso.
Parlamentares
conservadores de raiz revoltaram-se com medidas que contradizem os
princípios mais elementares dos tories, como são chamados.
Boris, obviamente, está pensando naquilo: o ano eleitoral de 2024.
“A
economia é o campo de batalha onde a maioria das eleições são
disputadas e 2024 não será diferente, dando ao governo apenas dois anos
para convencer a população de que está melhor com os tories”, anotou o
Telegraph.
Conservadores
que aumentam impostos, como fez Rishi Sunak, e liberais que reconhecem o
caráter intrinsecamente deletério da inflação, como Janet Yellen, são
resultado da situação emergencial que tantos países vivem agora, sob o
duplo impacto da covid e da guerra na Ucrânia – sem contar as decisões
erradas.
“Biden
está abalado pela queda em parafuso de seus índices de aprovação e
procurando recuperar a confiança dos eleitores em sua capacidade de
prover a liderança firme que prometeu durante a campanha, dizem pessoas
próximas do presidente”, anotou uma reportagem da NBC.
Um
indicador de que vai ter mais gente fazendo mea-culpa, um fato raro em
qualquer universo político e mais inesperado ainda por envolver alguém
com a tonelagem intelectual de Janet Yellen.
“Apertem
os cintos”, alertou um dos gurus mais respeitados pelo mercado, Jamie
Dimon, do JPMorgan, avisando que ainda vem aí um “furacão”.
A
dupla tempestade virá, segundo ele, porque o Fed vai começar a enxugar
liquidez do mercado e o petróleo pode chegar a 150, até 175 dólares o
barril.
Nada menos que uma catástrofe.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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