O
número de casos da covid-19 voltou a crescer e a estimativa de
especialistas é que o São João colabore para um novo surto da doença.
Segundo as informações do mais recente boletim epidemiológico da
Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), divulgado nesta
segunda-feira (13), houve um aumento de 198% no número de contaminações
em território baiano na primeira quinzena de junho. Barreiras, Itabuna e
Lauro de Freitas são os municípios do interior com o maior número de
casos ativos. O quadro acontece dias antes do início das festas juninas,
que têm potencial para aglomerar milhares de pessoas nas cidades com
tradição na festa. Frederico Pasche,
doutor em Saúde Coletiva, alerta que a aglomeração e contato entre
indivíduos de regiões diferentes devem resultar em um surto ainda maior
de 21 a 28 dias após as festas juninas. Além da contaminação, a previsão
é o pressionamento do sistema de saúde. Essa é a maior preocupação do
representante comercial Nivaldo Machado, morador de Barreiras. Ele
afirma que ainda não é o momento ideal para a montagem de megaestruturas
do São João promovido pela cidade.“Quando tem aglomeração, corre o
risco de voltar o aumento de casos e superlotar as vagas nos hospitais.
Prefiro ir para a roça e ficar só com a minha família do que fazer
aglomeração. Muita gente ainda não está vacinada”, diz preocupado com a
possibilidade de seus filhos precisarem de algum atendimento e o sistema
de saúde estar sobrecarregado. A infectologista e consultora da
Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Raquel Stucchi classifica o
cenário como “preocupante” devido às duas novas subvariantes da cepa
ômicron do coronavírus - a BA.4 e BA.5 -, cuja “transmissão é 50% maior
que a ômicron inicial”. Ela também cita a baixa procura pelas doses de
reforço como indicativo de um novo surto. “Podemos considerar uma quarta
onda. Não deve ter impacto tão grande quanto tivemos nas outras ondas
em relação à hospitalização e mortalidade. Todos os eventos que levam à
aglomeração em ambientes fechados, com muitas pessoas sem máscara e sem
vacinação em dia levam ao aumento do risco de adoecimento”, alerta. Para
o governador Rui Costa (PT), as festas não correm risco de cancelamento
(leia ao lado), apesar do aumento dos casos neste mês. Em coletiva,
ontem, o gestor afirmou que o governo tem monitorado o panorama de alta,
no entanto, mais três critérios são considerados: número de
internamentos, vagas nas UTIs e mortes. Frederico Pasche discorda, pois
as consequências da covid-19 a longo prazo ainda são desconhecidas mesmo
para quem desenvolveu sintomas leves ou foi assintomático. “Estamos
numa quarta onda [...] o vírus vai procurar corpos suscetíveis; crianças
não vacinadas, jovens sem ciclo vacinal completo, idosos sem quarta
dose. O vírus vai encontrar corpos para se instalar. Estamos colocando
essas pessoas em risco”, alerta. Sabendo da potência junina no estado,
especialistas orientam os governos que tenham responsabilidade sanitária
e que lembrem a população sobre a possibilidade de contrair o vírus em
aglomerações, orientando o uso de máscaras em espaços abertos e
aglomerados. Outra recomendação é realizar a testagem durante o evento.
“A gente tem tido uma gestão, do ponto de vista das autoridades
sanitárias, muito irresponsável. Não é à toa que o Brasil é um dos
grandes responsáveis pelo grande número de óbitos. Os gestores não
quiseram compreender efetivamente [a covid]”, aponta Pasche. Em
Salvador, o prefeito Bruno Reis afirma que o aumento de casos não está
impactando o sistema de saúde e recomenda para quem vai festejar o São
João no interior: "Tomem a vacina. Ampliamos a oferta e pedimos que
todos que puderem se vacinar, principalmente, aquelas pessoas que vão
para o interior, que vá com o ciclo vacinal completo", afirma.
No interior
Segundo a prefeitura de Barreiras, ontem ocorreu reunião do Comitê de
Operações de Emergência em Saúde Pública (COE) para avaliar a
necessidade de medidas preventivas. As providências, no entanto, ainda
não foram divulgadas. Por enquanto, a atividade é a monitoração do
quadro epidemiológico. "Na última semana tivemos 56 casos de covid e
seguimos com 47 pessoas em isolamento. Até então, continuamos sem
pacientes internados no município”, pontua o secretário de saúde
Melchisedec Neves. “Deveria pedir passaporte da vacinação para quem está
vacinado entrar, assim como pode ter medição da temperatura”, sugere o
morador Nivaldo Machado. A prefeitura de Itabuna tem seguido a mesma
linha de monitorar os casos graves. De acordo com a administração do
município, não há internamento por covid-19 na cidade e, apesar dos
números de pacientes ativos, as infecções estão brandas. No período
junino, é tradição em Itabuna a festa de São Pedro, que ocorre de 30 de
junho a 3 de julho. Algumas das atrações confirmadas são João Gomes,
Tarcísio do Acordeon e Bel Marques. A prefeitura, porém, não respondeu
quais medidas pretende tomar contra a disseminação da covid no evento.
Já a prefeitura de Lauro de Freitas, cidade que tem 95 casos, afirmou
que a população deve apresentar certificado de vacinação no ‘Arraiá de
Ipitanga’, mesmo com o esquema vacinal completo. A medida tem
concordância com as sugestões de moradores do município, a exemplo de
Carolina Lima, 19 anos, estagiária de docência. “Me preocupo mais com
meu desempenho no trabalho, atuo com crianças que têm a imunidade baixa
normalmente e trazem esses vírus. Com isso, já fiquei doente mais de 3
vezes, com amigdalite, e precisei interromper as aulas. Além do risco de
contaminar minha família, já que moro com meus pais e irmãos”, conta
ela, que sugere à prefeitura que cobre a terceira dose como obrigatória
para entrada nos eventos. “Não acho que se o uso da máscara for
obrigatório haverá fiscalização. Então, pelo menos a terceira dose
obrigatória. Além de ter pontos de álcool em gel”, diz. Morador de
Vitória da Conquista, quarta cidade do interior com mais casos ativos, o
controller de 42 anos Fábio de Jesus acredita que a festa deveria ser
adiada até haver controle da proliferação. “Baseado nessa questão do
aumento de [cerca de] 200%, [a prefeitura] deveria rever a comemoração.
Talvez diminuir a quantidade de gente em certos locais, manter uma festa
com todos os cuidados possíveis. Acho muito perigosa aglomeração nesse
momento. Pior que não vai ser só aqui, também vai ser em outros
lugares”, lamenta. A prefeitura de Vitória da Conquista não retornou o
contato da reportagem para responder sobre as medidas de proteção no
‘Arraiá da Conquista’. Na linha contrária dos moradores, a costureira
Maria da Silva, 65, vai viajar para comemorar o São João em Senhor do
Bonfim. Embora a cidade não apareça na lista de 10 municípios com mais
casos ativos, é esperado grande fluxo por ter uma das principais festas
juninas da Bahia. “Sempre frequento o forró do jegue, tradição na
cidade. No entanto, é em um clube com ambiente fechado. Esse ano não vou
participar. Devo ficar na varanda da casa em que vou ficar, ela fica de
frente para uma praça que sempre têm atrações”
Vacinação
Um total de 3,6 milhões de baianos estão com a dose de reforço anticovid
em atraso, informa a Sesab. No estado, apenas 48% da população já
tomou a terceira injeção, seja em dia ou com algum atraso. Enquanto
isso, 2,4 milhões ainda não foram tomar a segunda dose de reforço, a
quarta dose, oferecida para pessoas a partir de 50 anos, profissionais
de saúde, idosos e imunossuprimidos. A infectologista Raquel Stucchi
explica que as modificações comuns e frequentes [mutações] que acontecem
com os vírus podem causar sintomas dos mais leves aos mais graves ou,
ainda, tentar escapar da defesa das vacinas. “É preciso, portanto,
manter uma quantidade maior de anticorpos para impedir que o vírus cause
a forma mais grave da doença. Essa função é exercida pelas doses de
reforço”. A orientação do epidemiologista Paulo Petry é completar o
ciclo vacinal e manter o uso de máscaras com maior poder de filtração
como a cirúrgica e PFF2. "Se as pessoas estiverem aglomeradas, ainda em
locais abertos nessas festas, a transmissibilidade do vírus vai ser
alta. Essas novas variantes e subvariantes da ômicron são altamente
transmissíveis”, ressalta. Já Stucchi dá instruções para quem estiver
com sintomas. “As pessoas que tiverem qualquer sintoma como dor de
garganta e nariz escorrendo devem fazer o teste. Se for positivo, fique
em casa, se negativo e os sintomas persistirem, devem repetir o teste em
48h. Neste período [é preciso] ficar em casa ou usar máscara N95 se
tiver de sair”. Quem seguiu o exemplo foi o estudante de comunicação,
Pedro Beno, de 22 anos. O jovem testou positivo na semana passada e
cancelou os planos de viajar a Lençóis, na Chapada Diamantina, para
curtir o São João. “Eu estava na dúvida de viajaria para lençóis com meu
pai ou ficaria em casa com minha mãe, parece que agora só vou ter uma
opção”, brinca. Vacinado, o jovem desenvolveu sintomas leves, como dor
de cabeça, coriza e enxaqueca.
Municípios com mais casos ativos na Bahia (13/06):
Salvador - 956 casos
Barreiras - 168 casos
Itabuna - 132 casos
Lauro de Freitas - 95
Vitória da Conquista - 91
Santo Antônio de Jesus -74
Feira de Santana - 73
Porto Seguro - 53
Brumado - 51
Canápolis - 47
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