O último pleito evidenciou que a renovação na política não pode ser um fim em si mesmo. Quando tantos depositam esperança em políticos há quatro décadas na estrada, porém, e não em um Alessandro Vieira ou numa Simone Tebet, é hora de refletir. Mario Vitor Rodrigues para a Gazeta do Povo:
O
problema maior para os opositores do governo que não se identificam com
o PT já não é persuadir sobre a necessidade de Bolsonaro deixar o poder
— segundo as últimas pesquisas, o número de brasileiros convencidos de
que a reeleição de Jair seria danosa ao país só faz aumentar. O desafio
está em encontrar uma alternativa real, viável e moderada, que demonstre
força suficiente para romper o jogo casado entre petismo e
bolsonarismo.
À
esquerda do espectro político, dá-se um cenário parecido: quem nunca
votaria em Jair não terá problemas para apostar em Lula, mas nem por
isso deixa de contemplar o dia em que terá a oportunidade de votar em
outro nome que não seja o de Luiz Inácio.
Eis
a outra face nefasta que a polarização entre Lula e Bolsonaro impõe:
não se trata apenas de sufocar o bom debate sobre visões de Brasil, mas
também o surgimento de novas lideranças.
Lula
disputou o governo de São Paulo em 1982 e esteve no palanque das
Diretas Já!, contudo sua presença ainda interdita opções do lado do
balcão, como Ciro Gomes — outro longe de ser um noviço —, Fernando
Haddad e até mesmo um Guilherme Boulos.
Noutro
extremo do palco, Bolsonaro conseguiu forjar um discurso que não fica
de pé diante de seu histórico de mau militar e político irrelevante que
sempre parasitou o sistema. É na sua figura que se cristalizou um
movimento reacionário adormecido desde a reabertura democrática.
De
resto, continua sendo o presidente da República. Mesmo derretendo nas
sondagens, sabe-se que em épocas eleitorais o mandatário é capaz de
lançar mão da máquina para fortalecer sua campanha. Pode até vir a ser o
primeiro presidente a não conseguir se reeleger, entretanto é difícil
imaginar que pelo menos não alcance o segundo turno. Tudo contribui para
o não surgimento de opções na centro-direita.
E há também o vácuo entre os polos.
Ótimos
nomes como os de Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Simone Tebet
(MDB-MS), ambos acumulando atuações destacadas na CPI da Covid, ainda
precisam construir uma imagem que transcenda as diferenças regionais,
bem como os feudos que nosso establishment é capaz de engendrar para se
manter vivo, à revelia de quem seja o presidente.
Para
completar o quadro pouco alvissareiro para quem gostaria de ver o
Brasil livre das retóricas binárias, o eleitor médio está habituado a
votar em candidatos de perfil populista. É pragmático e não dá a mínima
para as ditas guerras culturais, entretanto tem uma queda histórica por
figuras que encarnam o estereótipo do salvador da pátria.
Ao
fim e ao cabo, mora aí o principal entrave para uma renovação
verdadeira, não só nos nomes, mas na forma de se fazer e enxergar a
política no nosso país. Como o sistema e seus atores podem ser outros,
ou agir diferente, se no fim das contas a demanda é por exatamente isso
que temos hoje?
Como,
se naturalizamos o fato de o sujeito avesso ao bolsonarismo e ao
petismo ser obrigado a escolher entre duas opções nefastas para o debate
público e a democracia, tanto uma quanto a outra já tendo demonstrado
inúmeras vezes que são capazes de atropelar as regras do jogo para
vencer ou se sustentar no poder?
A
um ano da eleição, muita coisa ainda pode mudar no cenário eleitoral.
Desgraçadamente, todavia, tudo indica que as hostes de Lula e Bolsonaro
terão o seu Armagedom santo.
O
último pleito evidenciou que a renovação na política não pode ser um
fim em si mesmo. Quando tantos depositam esperança em políticos há
quatro décadas na estrada, porém, e não em um Alessandro Vieira ou numa
Simone Tebet, é hora de refletir.
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